sexta-feira, 5 de julho de 2013

Crítica - Os amantes passageiros


Light e embriagado

Pedro Almodóvar jamais foi exatamente uma unanimidade, mas é um vértice do cinema europeu que conciliou razoável sucesso de público com admiração crítica. Mesmo aqueles que não se declaram admiradores de seu cinema – no âmbito da crítica cinematográfica – não conseguem ficar indiferentes a ele. Algo relativamente usual tratando-se de outros cineastas europeus. Depois de mais de uma década sem rodar comédias, que a bem da verdade foi o gênero que lhe apresentou ao mundo, Almodóvar retorna à comédia rasgada e histérica com menos felicidade do que se poderia imaginar.
Cercado de astros e estrelas que estiveram com ele em seus maiores sucessos como Javier Cámara, Raul Arévalo, Lola Dueñas e Cecilia Roth, além de pontas de Antonio Banderas, Paz Vega e Penelope Cruz, Almodóvar roda um filme pretensamente light, mas embriagado de uma veia sexual que flerta com o mau gosto. O sexo sempre fez parte do universo almodorvariano, mas sempre com o inusitado como bússola. O grafismo já foi mais bem justificado em filmes como Ata-me! (1990) ou a Má educação (2004) do que em Os amantes passageiros (Los amantes pasajeros, ESP 2013) – em que não há nem mesmo uma cena de nudez.

A coreografia da discórdia: os três comissários que reforçam o estereótipo de "bicha louca" se esforçam para entreter passageiros e audiência

Não obstante estar fora do tom, Almodóvar parece não ter muito a dizer com seu filme. Com esforço e boa vontade pode-se depreender uma sátira às circunstâncias econômicas vivenciadas pela Espanha (na crise, todos que não estão na primeira classe são entorpecidos), mas é preciso muita simpatia pela figura de Almodóvar para ignorar o fato de que a ideia é afastar-se de elaborações mais sofisticadas.
Em um voo da Espanha para o México, o avião apresenta problemas com o trem de pouso e fica voando em círculos até obter autorização, e pista livre, para fazer aterrisagem em um aeroporto espanhol. Enquanto isso, três comissários de bordo tentam entreter os passageiros da primeira classe. 
A ciranda descamba para o sexo. Há uma vidente virgem que assevera que perderá a virgindade naquele avião. Um piloto bissexual que mantém um caso com o comissário chefe da tripulação, o co-piloto que se ressente de assumir-se homossexual, o ator galã que precisa controlar os ânimos da amante enquanto a ex-mulher tenta o suicídio - sendo que elas estão em terra -  e por aí vai.
Os amantes passageiros cansa e esse é o sinal indevassável de que Almodóvar errou a mão. Já que isso não acontece mesmo com seus filmes “menores”, em valor artístico, e maiores, em metragem.
Há boas piadas, mas a grande maioria não arranha o canto da boca. Almodóvar disse em entrevista que queria fazer o povo espanhol rir para esquecer seus problemas. Pode até ter conseguido, mas no processo problematizou a própria filmografia.

2 comentários:

  1. Aqui discordamos meu caro (como em 'A Pele Que Habito', que aliás, comprei recentemente e revi esses dias). Era de uma comédia do Almodóvar nesses novos tempos que sinceramente estava carente. Pode ser um filme light e menor de toda a sua filmografia, mesmo assim, instigante e cômico, na verborragia, nos exageros cênicos, enfim, em tudo, não acho que o comprometa.

    Subtramas malucas (gostei do trabalho da Blanca Suárez aqui) e tudo que se tem direito e que só este espanhol tem a cara e a coragem para realizar. Reunindo um elenco presente em seu universo, todos acertam e até acho que a Lola Dueñas faz o melhor trabalho dela com o cineasta neste papel . Um Almodóvar nostálgico. Adorei.
    ★ ★ ★ ★

    Abs.

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  2. Rodrigo Mendes: Faz parte, né? Eu já acho que há muito pouco, talvez os exaeros cênicos e os atores em tom over, que remeta às comédias clássicas de Almodóvar. Acho que o filme se consome em seu vazio e é quase um zorra total em termos de mau gosto. Enfim, foi minha primeira - e espero única - decepção com Almodóvar.
    Abs

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