Light e embriagado
Pedro Almodóvar jamais foi exatamente uma unanimidade, mas é
um vértice do cinema europeu que conciliou razoável sucesso de público com
admiração crítica. Mesmo aqueles que não se declaram admiradores de seu cinema
– no âmbito da crítica cinematográfica – não conseguem ficar indiferentes a
ele. Algo relativamente usual tratando-se de outros cineastas europeus. Depois
de mais de uma década sem rodar comédias, que a bem da verdade foi o gênero que
lhe apresentou ao mundo, Almodóvar retorna à comédia rasgada e histérica com
menos felicidade do que se poderia imaginar.
Cercado de astros e estrelas que estiveram com ele em seus
maiores sucessos como Javier Cámara, Raul Arévalo, Lola Dueñas e Cecilia Roth,
além de pontas de Antonio Banderas, Paz Vega e Penelope Cruz, Almodóvar roda um
filme pretensamente light, mas embriagado de uma veia sexual que flerta com o
mau gosto. O sexo sempre fez parte do universo almodorvariano, mas sempre com o
inusitado como bússola. O grafismo já foi mais bem justificado em filmes como
Ata-me! (1990) ou a Má educação (2004) do que em Os amantes passageiros (Los
amantes pasajeros, ESP 2013) – em que não há nem mesmo uma cena de nudez.
A coreografia da discórdia: os três comissários que reforçam o estereótipo de "bicha louca" se esforçam para entreter passageiros e audiência
Não obstante estar fora do tom, Almodóvar parece não ter
muito a dizer com seu filme. Com esforço e boa vontade pode-se depreender uma
sátira às circunstâncias econômicas vivenciadas pela Espanha (na crise, todos
que não estão na primeira classe são entorpecidos), mas é preciso muita
simpatia pela figura de Almodóvar para ignorar o fato de que a ideia é
afastar-se de elaborações mais sofisticadas.
Em um voo da Espanha para o México, o avião apresenta
problemas com o trem de pouso e fica voando em círculos até obter autorização,
e pista livre, para fazer aterrisagem em um aeroporto espanhol. Enquanto isso,
três comissários de bordo tentam entreter os passageiros da primeira
classe.
A ciranda descamba para o sexo. Há uma vidente virgem que
assevera que perderá a virgindade naquele avião. Um piloto bissexual que mantém
um caso com o comissário chefe da tripulação, o co-piloto que se ressente de
assumir-se homossexual, o ator galã que precisa controlar os ânimos da amante
enquanto a ex-mulher tenta o suicídio - sendo que elas estão em terra
- e por aí vai.
Os amantes passageiros cansa e esse é o sinal indevassável
de que Almodóvar errou a mão. Já que isso não acontece mesmo com seus filmes
“menores”, em valor artístico, e maiores, em metragem.
Há boas piadas, mas a grande maioria não arranha o canto da
boca. Almodóvar disse em entrevista que queria fazer o povo espanhol rir para
esquecer seus problemas. Pode até ter conseguido, mas no processo problematizou
a própria filmografia.
Aqui discordamos meu caro (como em 'A Pele Que Habito', que aliás, comprei recentemente e revi esses dias). Era de uma comédia do Almodóvar nesses novos tempos que sinceramente estava carente. Pode ser um filme light e menor de toda a sua filmografia, mesmo assim, instigante e cômico, na verborragia, nos exageros cênicos, enfim, em tudo, não acho que o comprometa.
ResponderExcluirSubtramas malucas (gostei do trabalho da Blanca Suárez aqui) e tudo que se tem direito e que só este espanhol tem a cara e a coragem para realizar. Reunindo um elenco presente em seu universo, todos acertam e até acho que a Lola Dueñas faz o melhor trabalho dela com o cineasta neste papel . Um Almodóvar nostálgico. Adorei.
★ ★ ★ ★
Abs.
Rodrigo Mendes: Faz parte, né? Eu já acho que há muito pouco, talvez os exaeros cênicos e os atores em tom over, que remeta às comédias clássicas de Almodóvar. Acho que o filme se consome em seu vazio e é quase um zorra total em termos de mau gosto. Enfim, foi minha primeira - e espero única - decepção com Almodóvar.
ResponderExcluirAbs