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Ator contestado, Ben Affleck se reinventou como cineasta de fina estirpe e já ganhou até Oscar; enquanto que George Clooney protagonizou a reinvenção mais radical e bem sucedida da história de Hollywood ao praticamente apagar da memória coletiva seu passado de ator errante nos anos 80 |
Hollywood adora uma reinvenção. Essa é daquelas verdades
perenes que fazem e derrubam estrelas. O limiar entre uma carreira de novo
fôlego e uma carreira enterrada de vez é, por vezes, imperceptível. Da
tolerância do público à aceitação da imprensa especializada, muitos são os
fatores que podem determinar se uma carreira por ser realocada ou não. Jennifer
Aniston, por exemplo, tentou durante um breve período na década passada – após
o fim do seriado "Friends" – redimensionar seu status no cinema, mas seu público
não parecia disposto a alforriá-la das comédias românticas. Dramas como Amigas
com dinheiro (2006), Fora de rumo (2005) e Por um sentido na vida (2002) não
foram bem digeridos pela audiência e a ex-mulher de Brad Pitt se viu confinada
ao gênero das comédias. Ainda assim, ela passou a ousar mais como em filmes
como Quero matar meu chefe (2011) e Família do bagulho (2013).
Recentemente todos se assombraram com a transformação que
Matthew McConaughey impôs a sua carreira. Denominada McConnainsance, a reviravolta
culminou em Oscar, mas está longe de acabar. Com papéis difíceis como os de
Killer Joe e "True Deetctive", McConaughey parece ter redesenhado seu papel na
indústria do cinema. O mesmo tenta fazer Bradley Cooper. Depois de estourar
como um dos protagonistas de Se berber, não case (2009), o ator se aliou ao
cineasta Davi O. Russell, outro que enveredou pelo caminho da reinvenção (como já abordado aqui em Claquete), para
mudar de status em
Hollywood. Depois de duas indicações ao Oscar em anos
seguidos, Cooper está nos novos filmes de Clint Eastwood e Cameron Crowe.
Antes de McConaughey e Cooper, porém, o britânico Colin
Firth apartou-se das comédias românticas para abraçar os filmes mais sérios.
Protagonista do novo filme de Woody Allen, Firth ganhou o Oscar por O discurso
do rei (2010) há três anos depois de ter feito uma ruptura definitiva com sua
carreira de então com o denso e doloroso Direito de amar (2009).
Nenhuma reinvenção, no entanto, é mais uníssona do que a de
George Clooney. Poucos se atentam para o fato de que Clooney era um ator
errático nos anos 80 e um astro emergente da tv nos anos 90 que soube se
reiventar de maneira tal que se firmou como o maior astro da Hollywood atual, à
frente de ícones de outrora como Harrison Ford, Tom Cruise ou Brad Pitt.
Reese Whiterspoon e Colin Firth divulgam Devil´s knot no festival de Toronto em setembro do ano passado: atores que buscaram reinventar suas carreiras e obtiveram aprovação do Oscar
Matthew McConaughey, maior símbolo atual do significado de reinvenção em Hollywood, com um dos muitos troféus que conquistou no início de 2014
Mudar é preciso!
Há, ainda, aqueles atores que enxergam a necessidade de
mudança para que não fiquem presos ao estigma de um personagem. Ben Stiller
tentou fugir do paspalho de bom coração com A vida secreta de Walter Mitty, que
também dirigiu, acabou fugindo da comédia rasgada, mas não conseguiu mudar o
tom do personagem. Jesse Eisenberg parece um sub Woody Allen e se isso lhe
serviu bem em A rede social parece miná-lo em filmes como Truque de mestre
(2013) e Para Roma, como amor (2012), em que foi dirigido pelo próprio Allen.
Por isso seus próximos projetos são pontos fora da curva, como uma adaptação de
Dostoievski e o vilão do próximo filme do Superman.
Se Anne Hathaway conseguiu se desfazer da imagem de
princesinha da Disney, Reese Witherspoon – por mais que tenha tentado – não se
desfez da alcunha de atriz de comédias românticas, a despeito do Oscar e de
suas incursões cada vez mais frequentes pelo drama. Coincidências à parte, o
próximo drama de Witherspoon (Devil´s knot) também é estrelado por Colin Firth.
Channing Tatum é outro a perseguir o reconhecimento como
ator sério, mesma escalada de Sandra Bullock que de uns tempos para cá passou a
conciliar as comédias blockbusters que fizeram sua carreira com dramas menores.
A ideia é transparecer uma carreira mais equilibrada e completa do que de fato
ela tem a apresentar.
Liam Neeson vai na contramão. Ator de vasta credencial no
drama, o irlandês passou a prestigiar o cinema de ação, roubando holofotes de
pretensos protagonistas do gênero como Vin Diesel. Filmes como Desconhecido (2011),
A perseguição (2012), Busca implacável (2008) e Sem escalas (2013) provaram o
fôlego há pouco inimaginável do agora sessentão no gênero que é a menina dos
olhos do sistema de estúdios hollywoodiano.
As mudanças podem se dar por contingência de mercado, como
prova o caso de Neeson. A carência por atores capazes de sustentar um gênero
que ainda não se renovou desde os anos 90 empurrou o ator para o metiê de
outros vovozinhos como Bruce Willis e Sylvester Stallone.
As mudanças podem se dar ainda como estratégia de carreira,
gosto pessoal ou mero acidente. Reinventar uma carreira não é tão fácil como
parece. Requisito básico e que parece sublinhar muito bem a divergência
entre Anne Hathaway e Reese Witherspoon, é ter talento.