segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Filmografia comentada - Steven Soderbergh




Sexo no divã
Sexo, mentiras e videotape (Sex, lies and videotapes, EUA 1989)
Há quem acredite que vivemos hoje em uma sociedade extremamente sexualizada. Não era bem assim no final dos anos 80 quando essa pequena joia do cinema independente americano surgiu e arrebatou plateias – em parte pelo ineditismo de abordar o sexo e suas bifurcações sem meio termos.
Não se trata de dar vez a perversões sexuais, mas de enquadrar fetiches e distopias relacionais em uma ótica totalmente vanguardista. Hoje banalizada pelo acúmulo de reality shows.
Soderbergh se apresenta como um cineasta econômico, de mão firme e com ótimo tino para a direção de atores.


Errando e aprendendo
Obsessão (Underneath, EUA1995)
Novamente trabalhando com Peter Gallagher (trabalhar com os mesmos atores é uma das muitas medidas pragmáticas do cineasta), Soderbergh realiza um filme que começa como um drama e termina como suspense. É um dos pontos baixos do diretor, mas um importante laboratório. Talvez seja aqui que Soderbergh tenha adquirido o know how para atuar com qualidade e distinção em diferentes gêneros cinematográficos.


Aquele alô para o mainstream
Irresistível paixão (Out of sight, EUA 1998)
O começo da parceria com o amigo George Clooney foi essa charmosa fita policial. Foi Irresistível paixão que provou que Soderbergh podia, também, ser pop. Uma mistura de romance com humor, abalizada por uma ação sofisticada em que George Clooney vive um irresistível meliante e Jennifer Lopez uma policial que dá sentido ao termo irresistível.   


Viabilidade
Erin Brockovich – uma mulher de talento (Erin Brockovich, EUA 2000)
Um drama sobre uma legítima “mulher coragem” com cores jurídicas que valeu a Julia Roberts o Oscar de melhor atriz. Soderbergh extrai força de um elenco que conta, ainda, com o grande Albert Finney e com um promissor Aaron Eckhart para entregar um filme tão edificante quanto eficiente. Soderbergh se mostra um diretor hábil em tornar um filme simples em material de Oscar, ainda que tenha sido ajudado por um ano dos mais fracos da história hollywoodiana.


Para a posteridade
Traffic: ninguém sai limpo (Traffic,EUA 2000)
Esse talvez seja o filme testamento do diretor. Um tema polêmico, uma narrativa entrecortada, perícia técnica na decupagem da trama, linguagem visual empolgante e atores em ótima forma. Tudo isso de maneira econômica e dinâmica. Não a toa lhe valeu o Oscar de direção.  

Entretenimento sofisticado: George Clooney é o leading man de um dos maiores acertos de Soderbergh, Onze homens e um segredo



Sem segredos
Onze homens e um segredo (Ocean´s eleven, EUA 2001)
Soderbergh provou ser um cineasta com sofisticado senso de humor ao reimaginar, ao lado de George Clooney, um dos melhores filmes do rat pack (grupo de artistas capitaneado por Frank Sinatra) nos idos dos anos 60. O novo Onze homens e um segredo não só se mostrou muito superior ao original como deu início a uma lucrativa franquia cinematográfica que funcionava tanto como filme de assalto, tanto como sátira. Um achado cinematográfico e um dos melhores trabalhos de Soderbergh.


Passo maior que as pernas
Solaris (Solaris, EUA 2002)
Adaptação da homônima obra do cinema russo, foi o primeiro grande revés de Soderbergh no cinema. Refilmagem desnecessária que não honrou o legado do original com uma trama confusa e um George Clooney pouco convincente como protagonista. A ficção científica, portanto, se tornou um gênero obtuso para o diretor que retornaria a ele com mais “liberdade criativa”  e “condescendência narrativa” em Contágio (2011).


Revolução interrompida
Bubble (Bubble, EUA 2005)
Uma trama de mistério que tem como pano de fundo uma fábrica de bonecos. Um filme simples, monótono até, cujo grande burburinho foi sua estratégia de distribuição. Steven Soderbergh decidiu lançar o filme nos cinemas no mesmo fim de semana em que o disponibilizava em DVD, na TV por assinatura e em streamings online. A ideia era promover um debate para distribuição do cinema independente. Por mais interessante que fosse a ideia – e o debate – o filme não os vitaminou o suficiente. 


Homenagem rarefeita
O segredo de Berlim (The good german, EUA 2006)
Querendo se provar um cineasta clássico e com o interesse de fazer o “seu Casablanca”, Soderbergh chamou o chapa George Clooney para essa história que conjuga romance e mistério em preto e branco. A crítica reagiu com indiferença à pompa de Soderbergh e o público não descobriu a fita que é boa, mas sucumbe à própria arrogância.

George Clooney e Steven Soderbergh batem um papo no set de Solaris: um revés doloroso para o cineasta que vinha da conquista do Oscar...


Tour de force!
Che: partes 1 e 2 (Che ESP, EUA, ARG 2008)
A ideia de filmar a vida de Che era algo que Soderbergh alimentava há muito tempo. O projeto era gigante, assim como a metragem do filme; o que obrigou o cineasta a dividir a obra em duas partes para lançá-las comercialmente. O resultado dividiu opiniões. Irregular e faltoso, o Che de Soderbergh só produziu de unanimidade a performance de Benicio Del Toro. De qualquer jeito, pelo tamanho do projeto e pela escassez de recursos, o diretor alcançou algum prestígio crítico. 


Cineasta de patentes!
Confissões de uma garota de programa (The girlfriend experience, EUA 2009)
Esse curioso filme protagonizado pela atriz pornô Sasha Grey como uma garota de programa de luxo ratificou de uma vez por todas que, por mais interessante que fosse sua veia independente e experimental, Soderbergh estava destinado a só colher elogios por suas aparições no cinemão. Soderbergh exercita aqui alguns cânones do cinema independente, mas não consegue nem mesmo cativar o espectador familiarizado com esse nicho.


Questão de estilo
O desinformente (The informant, EUA 2009)
Steven Soderbergh já vinha flertando com a comédia há algum tempo, mas ainda não havia feito um filme que se encaixasse na descrição. O desinformante, uma fita puxada para o humor negro e o non sense, é a que chega mais próximo. Com a mesma acuidade visual que marcou seus melhores trabalhos, Soderbergh dedica especial atenção a detalhes como trilha sonora, direção de arte e confia a Matt Damon o melhor do resto.

domingo, 30 de outubro de 2011

Insight

Afinal, Indiana Jones e o reino da caveira de cristal é tão ruim quanto fazem crer seus realizadores?

Quando a nostalgia reinava...: foto tirada durante a produção do quarto filme de Indiana Jones


O mundo esperava ansioso. Harrison Ford voltaria a empunhar o chapéu e o chicote do arqueólogo mais famoso, e o único pop, do mundo. Indiana Jones, esse herói que pode ser definido como a resposta de Steven Spielberg a esnobada dos produtores de James Bond a seu desejo de dirigir um filme da série ou como o nome do cachorro de George Lucas imortalizado, inegavelmente é um dos patrimônios do cinema e da cultura do século XX.
A reação a Indiana Jones e o reino da caveira de cristal (Indiana Jones and the kingdon of the crystal skull, EUA 2008 ) foi escorregadia. A crítica saudava a nostalgia do filme e, ademais, o sucesso de bilheteria era garantido. Os cerca de U$ 800 milhões arrecadados na bilheteria inibiam uma crítica mais perversa e desautorizavam os arautos do apocalipse que insinuavam que o Indiana Jones do século XXI se tratava de um embuste. 
Não que essa percepção alarmante se verifique de fato; mas é curioso constatar que, de tempos em tempos, os responsáveis por levar Indiana aos cinemas quase duas décadas depois de sua última incursão na tela grande (A última cruzada data de 1989) demonstram algum embaraço em relação ao filme.
O primeiro a ascender o pavio foi Shia LaBeouf, que muita gente cria ser um “substituto natural” para o Indiana Jones de Harrison Ford. Em uma cena do quarto filme, Spielberg chega a fazer uma piada com essa impressão.
LaBeouf, no início de 2010, disse que sentia ter falhado com os fãs e que se sentia responsável por O reino da caveira de cristal ser um filme inferior as expectativas. Para o ator da trilogia Transformers, o quarto Indiana Jones não foi bom. Você pode culpar o roteirista ou culpar Steven (Spielberg, diretor do filme). Mas o trabalho do ator é fazer algo vivaz, fazer funcionar, e eu não consegui isso. Então é minha culpa", disse o ator em entrevista ao jornal L.A Times.  Quase um ano depois, Harrison Ford, em uma das entrevistas promocionais de Uma manhã gloriosa, chamou LaBeouf de “idiota”. “Ele ainda tem muito que aprender em termos de Hollywood”, disse o ator. Ford se referia ao fato de que LaBeouf deveria saber quando guardar opiniões para si. Como Ford não defendeu o filme com veemência, a fala de LaBeouf reverberou ainda mais.
Fato é que, na iminência de boatos sobre o quinto filme do arqueólogo, ninguém menos do que Steven Spielberg colocou mais lenha na fogueira. Em entrevista a britânica Empire, o diretor disse que reclamações devem ser endereçadas a George Lucas. “Todo o desenvolvimento da história partiu de George”, argumentou Spielberg. Na verdade, assim como ocorre com todos os filmes evento, O reino da caveira de cristal teve várias versões. Frank Darabont escreveu o primeiro esboço, que foi realinhado por Lucas e Jeff Nathanson e finalmente finalizado por David Koepp. Spielberg atuou como supervisor durante todo o processo.

Ford, Spielberg e Lucas na premiere mundial do filme no festival de Cannes de 2008: "o melhor dos quatro", chegou a declarar George Lucas


O diretor não negou a existência de um quinto filme. Disse que Lucas está trabalhando no argumento, mas que só voltaria por uma história muito boa. A condição de retorno é um chavão hollywoodiano que todo mundo usa, mas como o quarto Indiana Jones está sob suspeita, ganha novos contornos. Estaria Spielberg decepcionado com o filme? Diferentemente de Shia LaBeouf, ele já sabe muito em termos de Hollywood, diria Harrison Ford.
Fato é que O reino da caveira de cristal é um filme menor da série. Como também o é O templo da perdição. Acontece que o saudosismo impede que se denigra um filme da trilogia original. O primeiro filme, que é base em escolas de cinema, está acima do bem e do mal. O terceiro é um fecho impecável para uma década em que o cinema se especializou em entretenimento. O quarto filme pode soar um pouco datado, mas seria implicância diminuí-lo perante um referencial tão magnânimo. 

sábado, 29 de outubro de 2011

Cantinho do DVD

Com um cinema fortemente marcado pela produção independente, o inglês Michael Winterbottom andou deslizando em seus últimos trabalhos. O mais recente, O assassino em mim, destaque da seção Cantinho do DVD desta semana, nem sequer chegou a ser lançado nos cinemas americanos e brasileiros. Tudo porque, embora com um elenco afinado e com cenas de nudez de Jessica Alba e Kate Hudson, o filme não diz a que veio. A crítica, o leitor confere abaixo:  


Crítica

Adaptado do romance homônimo de Jim Thompson, O assassino em mim (The killer inside me, EUA 2010) não consegue aspirar no cinema o mesmo oxigênio que a literatura oferece aos romances imaginativos. Dirigido pelo competente Michael Winterbottom e com um elenco talentoso capitaneado pelo ótimo Casey Affleck, o filme não consegue atingir seus objetivos.
Com atmosfera de filme noir, O assassino em mim propõe um estudo minucioso de personagem. No caso, Lou Ford (Casey Affleck), o assistente do xerife de Central City, cidadezinha do interior de Oklahoma.
Lou tem o corpo franzino de seu intérprete e o olhar perdido de alguém sem muita ambição.
Nos primeiros cinco minutos de O assassino em mim percebemos que Lou, no entanto, detém um impulso violento adormecido dentro dele. Um pouco mais adiante veremos Lou dar vazão a esse instinto e maquiar mal e porcamente a cena do crime que comete. O que se vê daí em diante é um homem sucumbindo tanto a seus desejos e medos, como a deformidade de seus atos. O assassino em mim, então, assume a perspectiva de Lou e torna-se uma narrativa um tanto capenga no desenho que faz desse personagem. Os flashbacks que sugerem uma infância de abusos e inversões nos conceitos de amor e carinho não são suficientemente satisfatórios para agregar àquele personagem algum relevo trágico. Tão pouco imbuem o espectador da certeza de que aquele é, afinal, um psicopata descontrolado.
O que leva a audiência a intuir isso são os personagens de Elias Koteas, um representante sindical que tenta o juízo de Lou, e Simon Baker, como um investigador com a mira sempre em cima do protagonista.
Winterbottom falha ao ritmar sua história e prestar-lhe um objetivo mais encorpado do que a mera observação do desfalecer de uma criança abusada.
Ainda que conte com um elenco afinado, e Casey Affleck assusta e espanta com sua caracterização de um demônio em convulsão silenciosa, O assassino em mim acaba por se resolver um filme um tanto opaco, em que a violência exprime, mais do que o tédio do protagonista, o tédio de quem o observa. 

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Em off

Nesta edição de Em off, as próximas biografias polêmicas a ganharem os cinemas, alguns takes de Ryan Gosling, uma seleção especial para o final de semana do Halloween, a constatação de que os heróis já não são mais os mesmos e o começo dos festejos em Hollywood.


Ryan Gosling em cinco takes

Na última semana, Claquete publicou um perfil de Ryan Gosling, no qual estipulou que o ator, que já demonstra grande talento, caminha para se tornar um dos principais expoentes de Hollywood. Uma rápida olhada em sua filmografia sugere que o otimismo é justificado. Claquete selecionou alguns destaques:

Perturbado

Em Cálculo mortal (2002), Gosling vive um jovem assassino de forte inclinação homossexual. Com uma atuação clean, o ator demonstra consciência exata do que deve mostrar, sugerir e ocultar. Um personagem charmoso que apresentaria o talento de Gosling para tipos soturnos.


O homem ideal

Em Diário de uma paixão (2004), o ator dá vida a Noah, um arquétipo romântico muito bem idealizado nas páginas de Nicolas Sparks e materializado em uma performance viril e sensível do ator que se mostrava capaz de assumir um papel romântico e pincelá-lo com nuances dramáticas adornadas por carisma e energia.


Perturbado novamente   

Mais um personagem cheio de nuanças e cujos limites dependem muito da intuição do ator. Na pele de um paciente de uma instituição psiquiátrica com fortes impulsos suicidas, Gosling atrai os olhares da audiência em A passagem (2005) com uma caracterização ritmada, fluída e imprevisível.


Perturbado redimido
A indicação ao Oscar veio por essa demolidora composição de um professor viciado que enxerga na relação com uma aluna que descobre suas aflições, o caminho de volta do ostracismo emocional e psicológico em que está. Sua atuação em Half Nelson é das coisas mais liberadas de vaidade que se tem notícia no cinema recente.


The cocky

Quem entende inglês sabe que a palavra aí de cima reúne múltiplos significados. De algum jeito, todos eles sintetizam bem o personagem que Gosling vive em  Um crime de mestre. O promotor assistente que está prestes a mudar para um grande escritório de advocacia e que, portanto, assume uma postura negligente em um caso de assassinato é uma demonstração de subordinação a outro grande ator, no caso Anthony Hopkins. Gosling, porém, sabe aproveitar os respiros que tem para brilhar.


Depois de Mark Zuckerberg...
Quem pode negar que A rede social é cool? Além de inteligente, dinâmico e profundamente reverberante do status atual da sociedade, o filme de David Fincher é responsável por desencadear uma nova leva de biografias dos precursores digitais desse novo século. Depois de Mark Zuckerberg vem aí as histórias de Julian Assange, o fundador do Wikileaks, que ameaça encerrar as operações do site por falta de verbas,  e Steve Jobs, o “visionário” da Apple que faleceu no início do mês.
Assange, que teve duas biografias publicadas em 2011, terá dois filmes com propostas bem diferentes. A primeira lhe será mais lisonjeira e os direitos foram adquiridos por Steven Spielberg. A segunda, adquirida pela Sony que lançou A rede social, deve ser mais inflamável e polêmica. A mesma Sony já estuda levar a bio recém-lançada de Steve Jobs para os cinemas e quer Aaron Sorkin, roteirista de A rede social, para “amaciar a carne”. Potenciais vencedores do Oscar? Sucessos de bilheteria? Análises sobre o homem e o meio? Bem vindo a nova corrida espacial hollywoodiana.

Steve Jobs é o próximo da fila de um tipo muito particular de biografia cinematográfica... 


O 15º Hollywood Film Awards
Não é por acaso que alguns dos mais respeitados críticos de cinema dos Estados Unidos apontam o francês The artist, o independente The descendants e o high profile Moneyball como os principais concorrentes da temporada de premiações que se anuncia. As três produções, e os principais responsáveis por elas, foram homenageadas no 15º Hollywood Film Awards. George Clooney, que pode se consagrar mais uma vez como artista completo que é nesta temporada, recebeu um troféu especial em homenagem à carreira. O diretor e roteirista Alexander Payne também foi homenageado, assim como o foram Bennett Miller (diretor de Moneyball), Michel Hazanavicius e Jean Dujardin (diretor e ator de The artist). Tudo bem que a bela inglesa Rosie Huntington-Whiteley, a nova Trasformers girl, também foi homenageada; mas aí já outra história...
 George Clooney comparecer ao evento acompanhado da nova paixão Stacy Keibler


Barba, cabelo, bigode... e cueca
Há não muito tempo atrás, os heróis estavam circunscritos as alegorias que seus filmes eram. Em um movimento repentino, em que Christopher Nolan tem grande responsabilidade, mas que também passa pela trilogia Bourne, a realidade e a tragédia investiram de vez nesse subgênero hollywoodiano. Dois célebres heróis que povoam o imaginário cinematográfico chegarão aos cinemas nos próximos anos um pouco mudados.
O primeiro é o filho de Krypton. O Superman de Zack Snyder, que será vivido pelo britânico Henry Cavill, não usará a cueca vermelha por fora do uniforme e passará a maior parte do tempo sujo e barbado como atestam fotos do set de filmagens divulgadas recentemente. Pode-se argumentar que essas “mudanças visuais” pouco tem a ver com a ideia de explorar a fragilidade do homem de aço. Fragilidade emocional, diga-se.
Outro brucutu frágil é James Bond. A ideia dos produtores de sensibilizar o mulherengo a serviço do MI 6 culminou na contratação de Sam Mendes, o premiado diretor de Beleza americana e Foi apenas um sonho, para mitigar o sofrimento de 007. Com Javier Bardem confirmado como vilão e boatos de que a ideia é “rodar um filme mais sério com aspirações ao Oscar”, ficou resolvido que Bond surgirá com um visual mais relaxado (tipo barba por fazer e aparência depressiva), para dar forma ao sofrimento.
Realidade é outra coisa!

Henry Cavill nos sets de Superman - o homem de aço: o filho de Krypton com um visu a la Tarzan 




Dia das bruxas


Com o fim de semana do halloween à espreita, vale a pena fazer uma listinha para assistir no fim de semana. Claquete elaborou uma lista de filmes para deixar seu fim de semana macabro na medida certa. Estão presentes perolas do terrir, representantes de um terror mais visual, outros de uma vertente mais sugestiva e filmes especializados em pregar sustos. Uma salada de respeito!

1- a bruxa nojenta de Arrasta-me para o inferno; 2- o pé putrefato de Jogos mortais; 3- o momento da verdade em O bebê de Rosemary


 Jogos mortais (Saw, EUA 2004), de James Wan
É bem verdade que a série se desvirtuou e virou um pornô gráfico e absurdo de violência e sangue, mas esse primeiro filme –elogiado em sundance – é uma produção independente com alma de filme B e uma história arrepiante e enervante na medida certa.   


 Brinquedo assassino (Child´s play, EUA 1988), de Tom Holland
A definição de terror gore nos anos 80 era bem diferente da atual e esse filme dirigido com desenvoltura e audácia por Tom Holland ilustra bem isso.  Um serial killer, antes de ser morto, transfere sua alma para um brinquedo, e dá sequência à contagem de vítimas. Aterrorizou toda uma geração. Hoje pode soar ingênuo, mas ainda tem seu impacto.


 O bebê de Rosemary (Rosemary´s baby, EUA 1968), de Roman Polanski
Esse terror psicológico, algo expressionista, do diretor franco polonês é um marco do cinema sugestivo. Bruxas, seitas, Diabo, estupro e alucinações são a matéria prima do cineasta nesse filme assustadoramente impressionante que conta com um desempenho memorável de Mia Farrow.


Os espíritos – a morte está ao seu lado (Shutter, Tailândia, 2006), de Banjong Pisanthanakun
Tudo começa com um atropelamento. Daí, espectros suspeitos começam a aparecer nas fotografias do casal envolvido no atropelamento. Esse filme tailandês, que já ganhou uma refilmagem americana razoável estrelada por Joshua Jackson, sabe como poucos pregar sustos e conta com uma história realmente arrepiante. Sua percepção para aquela dor na coluna será totalmente modificada por esse filme.


Os espíritos (The frighteners, EUA 1996), de Peter Jackson
Antes de sagrar-se um realizador de ponta, Peter Jackson teve seu passado negro e essa fita que mescla humor e terror estrelada por Michael J. Fox é o testamento disso. Fox vive um detetive algo charlatão que se diz capaz de se comunicar com os mortos. O problema é quando ele, de fato, começa a se comunicar com os mortos.


Arrasta-me para o inferno (Drag me to hell, EUA 2009), de Sam Raimi
Sam Raimi é um cara legal. E um cara com profundo conhecimento cinematográfico em termos de ritmo e narrativa. Basta conferir esse filme para concordar. Na trama, que tira sarro da crise financeira, a jovem Christine nega a renovação de um empréstimo a uma velha cigana maltrapilha. Só para esta lhe rogar uma praga daquelas. Com jeitão de lenda urbana, o filme vai longe. É a cereja do bolo no final de semana comemorativo de Halloween.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Crítica - Gigantes de aço

Rocky de metal!

Não deixa de ser surpreendente o efeito que Gigantes de aço (Real steel, EUA 2011) provoca no espectador. Com uma premissa mais ajustada à ficção científica, essa improvável incursão do diretor Shawn Levy pelo gênero se mostra um drama sobre paternidade bastante edificante.
Hugh Jackman vive Charlie Kenton, ex-pugilista com sérios problemas financeiros e de autoestima. Essa combinação lhe embute um comportamento autodestrutivo. Estamos falando de um cara que, literalmente, vende o filho para custear suas apostas. As apostas de Charlie são em robôs lutadores. A história de Gigantes de aço se passa em 2020 e o boxe volta a reinar como principal esporte de luta, só que no ringue estão máquinas e não humanos.
É da convivência forçada – fruto de um acordo financeiro com o tio de seu filho - entre Charlie e o menino Max (o cativante Dakota Goyo), que pai e filho vão notando as muitas similaridades que os aproximam. Essa aproximação ganha velocidade quando Atom, um robô achado no ferro velho, entra na história.
Todos os elementos de um bom drama familiar e de um bom filme de boxe estão presentes em Gigantes de aço. As cenas de luta, coreografadas com a assistência do performance capture, engrandecem um espetáculo visual que encontra par nas carismáticas atuações do par de protagonistas.

Evangeline Lilly e Hugh Jackman em cena do filme: aí você aperta aqui e ó...


É redenção para todo lado. Charlie se redime do passado omisso como pai, tem seu grande momento como lutador de boxe em um ringue (ainda que com ressalvas) e um robô desacreditado triunfa na principal liga de boxe. 
É verdade que não há a envergadura dramática de produções recentes ambientadas no universo do boxe como A luta pela esperança (2006) ou O vencedor (2010), mas Gigantes de aço compensa essa “desvantagem” com muito carisma, energia e bom humor.
Uma das boas surpresas de 2011 nos cinemas.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Filme em destaque: Gigantes de aço


O diretor de Uma noite no museu se junta ao Wolverine para rodar um dos melhores filmes de boxe desde o primeiro Rocky; e Steven Spielberg põe robôs e drama familiar na mistura do blockbuster mais "fofo" da temporada


Filmes de boxe constituem um gênero a parte em Hollywood. Mas como bem sabe o leitor, o boxe, como esporte, vem perdendo espaço para o MMA (artes marciais mistas), cujo principal expoente é o UFC (Ultimate Fight Championship). Esse fator é abordado em determinado momento de Gigantes de aço (Real steel, EUA 2011), filme que recupera o status do boxe no cinema e o faz de maneira bem peculiar.
A trama, adaptada do conto de Richard Matherson – mesmo autor de Eu sou a lenda, se situa em 2020, quando robôs substituem os humanos em esportes violentos como o boxe.
Hugh Jackman vive Charlie Kenton, um ex-pugilista que não se tem em grande estima. Com compulsão por apostas, integra o submundo das lutas de boxe onde, além de contrair dívidas, perde robôs. Charlie, que tem um filho que não quis conhecer, enxerga na disputa pela custódia de Max (Dakota Goyo) com os tios abastados (papéis de Hope Davis e James Rebhorn), uma chance de faturar algum dinheiro.
Charlie cede a custódia de Max por U$ 100 mil, mas aceita ficar com o garoto durante um curto período em que os tios estarão fora do país. É nesse período que se dará a aproximação entre os dois.  E o robô Atom será um importante catalisador nesse sentido. Atom é um robô que Charlie e Max descobrem no ferro velho. Aí está outro forte componente do filme: a capacidade de redenção. Um robô desenhado para ser sparring (robô de treino) capaz de vencer lutas e propiciar a união de pai e filho em torno de um objetivo em comum.
“Primeiro queria lidar com alguém que se achava tão pouco. O que faz uma pessoa agir daquele jeito, tentar ser tão desagradável, fazer com que ninguém se aproxime”, explica Hugh Jackman, em entrevista promocional, sobre o que o atraiu no personagem.
A relação de Charlie Kenton e Max é bastante cara a filmes que levam a chancela de Steven Spielberg e Gigantes de aço é produzido por Spielberg, que confiou a direção ao improvável Shawn Levy de filmes como Uma noite fora de série (2010) e Uma noite no museu (2006).

 Preparação intensiva: Atom e Charlie treinam de uma maneira bem peculiar...


 ... para encarar o desafio contra Zeus, o atual detentor do cinturão de campeão


Emoção e humor
O que mais chama a atenção em Gigantes de aço, a despeito das ótimas cenas de ação rodadas com a tecnologia motion capture, é o coração do filme. Max é incrivelmente carismático e sarcástico. Sua relação com o pai começa pelo viés de um humor mais ácido e dá vez a emoção à medida que o clímax se aproxima.
Uma referência sólida é Rocky – um lutador (1977), talvez o mais emblemático filme de boxe do cinema americano. Portanto não se pode esperar uma ficção científica vistosa. “Um aparelho de celular pode mudar em 20 anos, mas um jantar vai continuar parecendo um jantar. Eu queria que tudo fosse familiar para o espectador”, argumenta Levy, deixando claro que fazer uma ficção científica não era a prioridade.
E Gigantes de aço, de fato, se assemelha mais com a atmosfera de um filme de boxe do que com uma ficção científica. As duas semanas no topo das bilheterias americanas averiguam que o boxe pode já não ostentar grande destaque entre os americanos nos ringues, mas continua soberano nas telas de cinema. 

Crítica - Qual seu número?


Grito de liberdade!

À primeira vista, Qual seu número? (What´s your number?, EUA 2011) pode parecer uma grande piada grosseira. E a presença de Anna Faris, de filmes como Todo mundo em pânico e A casa das coelhinhas, pode favorecer essa impressão. Mas o filme de Mark Mylod rapidamente a supera, ainda que vez ou outra uma piada grosseira surja para nos imputar dúvidas. 
Ally (Anna Faris) surta quando vê um artigo em uma revista que sugere que uma mulher que passou dos 20 parceiros sexuais não encontrará sua alma gêmea. Ally então decide realizar um inventário de seus exs para certificar-se que o homem certo não escapará de seu crivo. Para isso contará com a ajuda de Colin (Chris Evans), um vizinho mulherengo com um potencial danado para ser o vigésimo primeiro.
Um dos grandes baratos de Qual seu número? é o sarro que tira das convenções machistas que imperam mesmo em um universo feminino, como, por exemplo, nas revistas femininas, cuja estupidez e ridículo são satirizados desde os créditos iniciais. São por convenções sociais que Ally põe toda a sua vida em stand by para descobrir o ex de sua vida e não avançar ao vigésimo primeiro parceiro sexual.
Conforme a busca vai se revelando catastrófica e Ally e Colin vão, conforme dita o manual das comédias românticas, se aproximando, Qual seu número? delineia uma ruptura na estrutura desse tipo de filme. O cara certo e decente não poderia ser o mais errado. O homem dos sonhos da mãe não necessariamente é o homem dos sonhos da filha. Como mostrou Shrek, um ogro pode muito bem ser um príncipe moderno. Essas ideias aparentemente tão desconexas fazem muito sentido quando o clímax de Qual seu número? surge como um grito de liberdade de um gênero que confina suas heroínas a arquétipos pré-estabelecidos. Não deixa de ser interessante ter Anna Faris, uma comediante um tanto anárquica e desbocada, para dar liga a essa proposta um tanto quanto necessária.
O filme é cheio de boas sacadas nesse departamento. Das músicas dos anos 80 (Lionel Ritchie tem um destaque especial) até a gag envolvendo Chris Pratt, marido de Anna Faris na vida real, como Donald nojento, um dos primeiros ex-namorados que Ally rastreia.
Qual seu número? é um filme carismático, divertido e que propõe algo muito mais genuíno do que muitas outras comédias românticas: estipular que o que importa é ser você mesmo (a). O discurso da fita não se ampara, porém, apenas nessa concepção. Irrompe com fronteiras machistas, ainda que haja um pequeno retrocesso na cena final, dentro do gênero.
Inteligente, bem intencionado, com um elenco tinindo e bastante original na proposta e concepção – apresentar como as comédias românticas são machistas e como muito do feminismo é fachada – Qual seu número? vem reforçar um 2011 muito positivo para um gênero com heroínas que gozam de cada vez mais liberdade de escolha e ação.

domingo, 23 de outubro de 2011

Insight

A custódia de Shame


Uma das maiores preocupações da Fox Searchlight, braço independente do estúdio Fox que nos últimos anos tem se especializado em adquirir filmes elogiados em festivais ao redor do mundo, é como vender Shame – fita que adquiriu após a consagração crítica da mesma nos festivais de Toronto e Veneza – para o público e para os prêmios.
A Fox searchlight tem em seu catálogo nessa temporada de premiações outros dois filmes com ambições a prêmios (The descendants, do cult Alexander Payne e Martha  Marcy May Marlene, de Sean Durkin).  Dos três, apenas a fita de Alexander Payne foi produzida pelo estúdio. O filme de Durkin foi adquirido após o frisson que causou no último festival de Sundance.
Mas é Shame, de Steve McQueen, que polariza as atenções do estúdio em termos de estratégia de marketing. Primeiro porque o filme de McQueen agradou mais a crítica do que os outros dois filmes; segundo porque sua temática é das mais singulares e capciosas para um filme que pretende agregar simpatia dos prêmios, em linhas gerais tão conservadores, e gerar lucro ao mesmo tempo.
O tema de Shame é sexo. Mais precisamente a solidão da compulsão sexual. Do vício. Michael Fassbender vive um executivo nova-iorquino (o filme, embora seja uma produção britânica é ambientado em Nova Iorque) incapaz de se conectar com outro ser humano. À noite, se aventura na caça à presas sexuais. Seu universo recebe novas e imprevisíveis energias quando a irmã vivida por Carey Mulligan, também ela com suas marcas de revertério sexual, muda-se para a casa (e rotina) do irmão.

Michael Fassbender e Carey Mulligan em cena do filme: uma relação incestuosa é uma das sugestões do texto...


O filme traz insinuações de incesto, nudez explícita, cenas de sexo heterossexual explícitas, cenas de sexo homossexual, ménage a trois, cenas de sexo em grupo, entre outras figurações que não se vê todo dia por aí em um filme no circuito. “Mas o sexo não é gratuito e é desenhado para mostrar a desintegração do personagem”, argumentou a presidente executiva Nancy Utley ao Hollywood Reporter. Utley se mostrou entusiasmada com as possibilidades que Shame traz para o cinema. “Pode mudar a perspectiva com que a indústria e o público lidam com filmes com classificação para maiores de 18 anos”, sugeriu a executiva que vê o filme de McQueen como “distinto” e “original”. Mas admite que “não é um filme que todos receberão facilmente”.
Shame, que valeu a Michael Fassbender o leão de ouro no último festival de Veneza,  “é um filme que merece ser visto” disse o CEO da Focus, James Schamus ao semanário americano de entretenimento. “Um bom filme deveria ter o direito de ter essas imagens.”
É esse o tipo de discussão que a Fox Searchlight tenta incutir na agenda cultural para promover Shame e despertar uma espécie de curiosidade narrativa do espectador. Seja ele cinéfilo ou não.
“Eu acho que Shame irá aguçar a curiosidade das pessoas”, argumenta Steve Gilula – responsável pela aquisição da fita para distribuição pelo selo Fox Searchlight. “Estou otimista de que será um filme significativo e mudará a atitude das pessoas em relação ao uso do sexo no cinema”.   
Muitos críticos que assistiram ao filme em Veneza e Toronto reagiram de maneira apreensiva após a divulgação do primeiro trailer de Shame. Eles argumentam que o trailer cheio de pudores sugere um filme diferente do que o espectador encontrará nos cinemas. Vale o registro de que o trailer, que o leitor pode conferir aqui, não apresenta uma cena de nudez sequer. Nancy Utley não entende dessa forma. A presidente executiva do estúdio vê na internet uma ferramenta catalisadora de interesses em favor do filme. “Vai ser bem fácil para a gente criar barulho acerca de Shame liberando material online”.
De qualquer jeito, a despeito das pretensões e preocupações da Fox Searchlight, Shame parece ser um filme com combustível suficiente para inflamar debates sobre cinema e, não obstante, tal como Freud nos induz, sobre sexo. 

sábado, 22 de outubro de 2011

Crítica - Meu país

Famiglia!

Além do fundo autobiográfico, Meu país (Brasil, 2011), estréia na direção de longa metragens de André Ristum, surge como um estrangeiro dentro da produção cinematográfica nacional. Intimista, valorizador dos silêncios e propenso a reflexão, o longa se configura como uma estréia poderosa para Ristum.
Rodrigo Santoro vive Marcos, brasileiro radicado na Itália, muito bem casado com a filha do chefe que o tem como braço direito no negócio da família. Mas Marcos precisa voltar ao Brasil após a morte do pai (Paulo José) para ajustes burocráticos em relação a herança e dívidas. Marcos não esconde o desconforto da viagem em que reencontra o irmão Tiago (Cauã Raymond), um tipo irresponsável que se projetava na escuridão da jogatina com a leniência do pai. Logo Marcos percebe que, assim como o filme na cinematografia nacional, também ele é um estrangeiro naquele contexto.
As coisas, já suficientemente complicadas, se complicam ainda mais quando Marcos toma ciência de que tem uma irmã, fruto de um relacionamento extraconjugal de seu pai, deficiente mental. É através de Manoela (Débora Falabella) que Marcos e sua família irão expiar angústias e frustrações.

Rodrigo Santoro é a força gravitacional de Meu país e Cauã Raymond funciona como uma bússola 


O drama pincelado por Ristum se desenvolve em camadas e metáforas. O acerto de contas de Marcos com seu passado, com o passado de seu pai e com sua família são prospectos de um futuro impensado, evitado. A angústia e imobilidade que acometem o personagem em face dos desdobramentos da morte do pai vão dando vez a descobertas dolorosas, mas significativas sobre si mesmo e suas vontades.
O fato de Marcos ir se afastando de sua mulher (e da Itália) à medida que mergulha nos problemas da família é revelador do status do personagem, um homem cético, maníaco por controle, profundamente reprimido (só desaba em lágrimas lá pelas tantas do filme) e que carrega mais mágoas do que suporta o olhar. Nesse departamento é preciso louvar, uma vez mais, Rodrigo Santoro. O ator vive Marcos com a insalubridade que a caracterização exige. Uma figura reta, endurecida e de gestos robóticos que vai se transformando e revelando fragilidades com o decorrer da trama. Santoro, que já atuou em inglês e espanhol, fala italiano de maneira convicta e não permite que os rumos da atuação (e do personagem) se desconectem em outro idioma. Ele flui do italiano para o português com esmero e refinamento.
O restante do elenco também contribui para a sutil angústia que permeia o registro. Ristum desenvolve seu filme como um poeta que observa beleza nas tragédias. Meu país é um filme sereno, emocional e, de certa forma, corajoso. Por propor uma reflexão e um embrenhamento tão caros ao cinema em geral, mas tão raros em sua assertividade em uma produção nacional.

Cantinho do DVD

Existem filmes com premissas tão absurdas que nos desafiamos a gostar deles. Juntos pelo acaso, destaque de Cantinho do DVD desta semana é um desses filmes. Ajuda a nos dobrar, o entrosamento de Katherine Heigl e Josh Duhamel. Eles fazem deste filme, que marca a estréia de um importante produtor televisivo na direção de cinema, um guilty pleasure bem adocicado.






Crítica

É preciso louvar a capacidade dos roteiristas e produtores hollywoodianos de sacudir a comédia romântica. Nos últimos três anos, a despeito do império mais do que justificado dos clichês, as premissas em voga no gênero tem sido bastante variadas. Juntos pelo acaso (Life as we know it, EUA 2010) é um bom exemplo disso. A estréia na direção de cinema de Greg Berlanti, ótimo roteirista e criador de séries agradáveis como Jack & Bobby e Everwood, apresenta uma premissa tão improvável quanto magnética. Holly (Katherine Heigl) e Messer (Josh Duhamel) são apresentados um ao outro pelo casal de amigos em comum Peter e Alison Novak, mas não demonstram lá muita química juntos. Forçados à convivência em virtude de serem melhores amigos do casal, são surpreendidos quando após um acidente fatal envolvendo Peter e Alison descobrem que eles lhe deixaram a guarda conjunta da filha Sofie, de apenas um ano.
É inconcebível pensar em um quadro desses, mas é mais do que interessante observar como os dois irão administrar o inusitado – ainda que se saiba rezar a missa das comédias românticas. As situações são bem engraçadas e o filme sabe ser fofo.
Josh Duhamel sabe fazer o macho vulnerável e Katherine Heigl parece não precisar mais provar ser digna do posto de heroína romântica da Hollywood atual. Os clichês se avolumam a medida que o filme avança e reforçam que aquilo, afinal, se trata de cinema e que os julgamentos devem ser recolhidos. 
A cena do aeroporto está lá, o cara certo na hora errada, o cara errado na hora certa e até uma assistente social chorona ampliam os efeitos dessa comédia romântica que, diferentemente de tantas outras, sabe nos conquistar com charme, boas piadas e uma menininha que justifica duas pessoas tão diferentes se apaixonarem. 

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Perfil - Ryan Gosling

Com cheiro de monstro sagrado...


Existem atores que não dizem logo a que vieram. Geralmente não se fala muito desses atores. Especialmente quando ainda são jovens e tem um longo caminho pela frente a trilhar. Ryan Gosling, nascido no inverno de 1980 de Ontário, cidadezinha canadense, é um desses casos. Gosling vive um 2011 acima de qualquer suspeita que provoca empatia imediata em crítica e público. Com três filmes exacerbantes em elogios, muitos deles em virtude de sua presença, o ator parece deixar para trás o rótulo de promessa.
Os 30 anos de idade (completará 31 em novembro próximo) acusam alguma experiência quando Ryan Gosling surge como o romântico desiludido de Namorados para sempre (2010), mas ainda servem ao papel de idealista descobrindo o mundo – e sua sordidez – em Tudo pelo poder (2011), filme que muitos creem pode render ao ator sua segunda indicação ao Oscar.

Gosling em cena de Tudo pelo poder, prometido para dezembro nos cinemas brasileiros: performance elogiada


A primeira vez que Ryan Gosling foi convidado para a maior festa do cinema foi no ano de 2007. Aos 26 anos poderia ter se tornado o ator mais jovem a ter conquistado uma estatueta na categoria principal de atuação pelo professor viciado de Half Nelson (2006). Um trabalho pungente e cheio de fúria em uma fita independente que sacramentaria o gosto de Gosling por essa linha de trabalho. Naquele ano o Oscar foi para Forest Whitaker por O último rei da Escócia, mas quem ficou no radar da indústria foi Gosling. “What about that guy from Half Nelson?”, perguntavam articulistas empolgados com a ascensão de um novo ator a la Robert De Niro em matéria de entrega e capacidade de transmutação em um papel.
Mas a verdade é que Gosling já havia chamado atenção antes. No independente audacioso Tolerância zero (2001), o ator vivia um judeu com forte identificação com os ideais nazistas. Uma complexidade muito bem encorpada e nivelada pela atuação de Gosling que um ano antes – em seu primeiro papel no cinema – tinha sido um dos comandados de Denzel Washington no filme Disney Duelo de titãs – sobre um time de futebol americano escolar as voltas com o racismo.
E foi a Disney a casa de Gosling por muito tempo. Assim como Justin Timberlake, Britney Spears e outros, o ator também integrou o clube do Mickey Mouse.
Em 2002 estrelou o que se pode chamar de seu primeiro filme no mainstream hollywoodiano. Ao lado de Michael Pitt foi um dos psicopatas caçados por Sandra Bullock em Cálculo mortal. A participação no filme lhe rendeu um namoro com a miss simpatia que duraria dois anos.
Contudo, é seguro dizer que foi o romance água com açúcar Diário de uma paixão que colocou Ryan Gosling no mapa. Pelo menos do público em geral. A história de amor que viveu com Rachel McAdams no filme de Nick Cassavetes é considerada por muitos a melhor e mais contagiante dos últimos 20 anos no cinema.


 Ryan, ainda com cara de garoto, enamorado de Sandra Bullock...

... e tascando um beijaço em Rachel McAdams no MTV Movie Awards de 2005. Ele e Rachel também namoraram por um breve período após as gravações de Diário de uma paixão



Vieram outros filmes, como o inteligente thriller Um crime de mestre (2007) em que faz um advogado arrogante e ambicioso antagonizando Anthony Hopkins; o singelo e edificante A garota ideal (2007), em que prova ser capaz de segurar dramaticamente um filme ao viver um personagem que se apaixona por uma boneca inflável; e Drive (2011), em que acentua aquelas comparações com De Niro ao viver um personagem muito parecido com o que De Niro viveu em Taxi driver, em um filme que não faz questão de esconder ser influenciado pela fita de Scorsese.
2011 parece mesmo ser o ano da virada para Ryan Gosling. Com uma segunda indicação ao Oscar à vista, o ator, que já coleciona duas indicações ao Globo de ouro, duas ao SAG e outras duas para o Independent Spirit Awards, se experimentou como galã e provou ter ótimo timing cômico em Amor a toda prova, uma das delícias cinematográficas desse ano.
Gosling podia não ser dos mais eloquentes em sua gênese como ator, mas inegavelmente aprofundou-se em seu ofício com gana, obstinação e um tremendo talento. Ainda há muito por fazer e conquistar. Gosling está só esquentando.