Conservadora pero no mucho
Como sempre a academia dá demonstrações de conservadorismo. Deixou de fora os elogiados Drive e Os homens que não amavam as mulheres (violentos demais?), não lembrou de Um método perigoso e Shame (subversivos demais?) e não reconheceu excelentes filmes estrangeiros da temporada (Melancolia, A pele que habito, A separação) na categoria principal. No entanto, a academia indicou um filme francês mudo e em preto e branco para o Oscar de melhor filme; indicou um ator parcialmente desconhecido (Demian Bichir) para o Oscar de melhor ator e reconheceu um trabalho francamente progressista em matéria de cinema (A árvore da vida) na categoria de melhor filme. São sinais de que a academia, em sua atual configuração, passa longe da uniformidade de pensamento que muitos lhe atribuem.
Todos os indicados ao Oscar podem ser conferidos aqui.
A crônica do Oscar recente
Tilda Swinton que já era tida como certeza entre as concorrentes a melhor atriz no Oscar acabou de fora da disputa. Por uma razão muito simples. Ganhou um Oscar há pouco tempo, por Conduta de risco (2008). Bem sabemos que a academia tem essa estranha e controversa política de compensação. Dessa maneira, preferiu nomear a novata Rooney Mara e a veterana há muito esquecida Glenn Close. Esse mesmo raciocínio permite intuir que para Meryl Streep continuar sendo indicada, é melhor que o terceiro Oscar não venha tão cedo.
Deixaram o Fincher de fora
Raciocínio semelhante se aplica à exclusão de David Fincher entre os diretores. Após concorrer duas vezes em quatro anos, o grupo de diretores da academia deve ter achado que nomear Fincher pelo segundo ano consecutivo seria demais. A academia reconheceu seu filme (Os homens que não amavam as mulheres) em várias categorias, mas não o colocou nas duas principais (filme e direção). Será que isso tem mais a ver com David Fincher ser chato ou com o filme ser violento e adulto demais?
David Fincher e Rooney Mara nas gravações de Os homens que não amavam as mulheres: o filme recebeu cinco indicações ao Oscar, mais do que três filmes que concorrem a melhor produção do ano
Porém...
Michelle Williams foi indicada no ano passado por Namorados para sempre e foi novamente contemplada este ano por Sete dias com Marilyn. Será que essa indicação vai só na conta do Harvey Weinstein?
Bonitões?
Fica para as mulheres a palavra final. Mas a lista de candidatos ao Oscar de melhor ator acabou menos bela do que se anunciava. Não que Demian Bichir e Gary Oldman sejam desprovidos de beleza, mas não chegam assim a ser um Ryan Gosling ou Leonardo DiCaprio.
Bechir, a surpresa latina: entre Javier Bardem e Antonio Banderas...
Multiculturalismo
Todo ano surgem reclamações. “Não há negros entre os indicados”, “Não há latinos concorrendo” ou “Da Europa só os ingleses são lembrados”. Pois bem. As categorias de atuação não poderiam ter sido mais democráticas em 2012. Há dois ingleses concorrendo (Gary Oldman e Kenneth Branagh), um sueco (Max Von Sydow), dois franceses (Berenice Bejo e Jean Dujardin), duas negras (Viola Davis e Octavia Spencer), um latino (Demian Bichir) e até mesmo dois gordinhos (Melissa McCarthy e Jonah Hill).
Shame on you!
Michael Fassbender, cuja cotação vinha crescendo nas últimas semanas, não conseguiu vaga entre os finalistas do Oscar. Shame, aliás, acabou completamente fora da premiação; fato que pode prejudicar sua distribuição nos cinemas brasileiros.
Ele morreu na praia novamente!
Já era até certo ponto esperado que Leonardo DiCaprio não fosse indicado ao Oscar de melhor ator por J.Edgar. Dito e feito. O ator até resistiu a saraivada de críticas negativas que o filme recebeu e conquistou um punhado de indicações a prêmios, mas não chegou ao Oscar.
Incoerências
A ideia da nova regra para a categoria de melhor filme era deixar o Oscar com mais cara de Oscar. Bem, com nove indicados não é bem o que acontece. Assim como em 2009 quando Um sonho possível só teve duas indicações ao Oscar – sendo uma delas para melhor filme do ano – o mesmo aconteceu com Tão forte e tão perto. A fita de Stephen Daldry foi indicada apenas nas categorias de filme e ator coadjuvante.
O mesmo pode ser dito de A árvore da vida, que fisgou três indicações (filme, direção e fotografia). Apesar dessa indicação para direção legitimar a candidatura do filme, fica patente um ar de desencontro na elaboração dos candidatos.
Cena de Tão forte e tão perto, o Um sonho possível da vez...
Índice Claquete
Muita gente se surpreendeu com a inclusão do veterano ator sueco Max Von Sydow por Tão forte e tão perto entre os coadjuvantes. Na verdade, Claquete já havia alertado para essa possibilidade no início de dezembro. Muito antes das primeiras listas de indicados serem divulgadas.
Secular!
Atores veteranos sempre têm vez Oscar. Mas a categoria de ator coadjuvante em 2012 caprichou. Juntos, Nick Nolte (70 anos), Max Von Sydow (82 anos), Christopher Plummer (82 anos) e Kenneth Branagh (51 anos) somam 285 anos. Contra esse time, o que podem fazer os 28 anos de Jonah Hill?
Eu tenho e vocês não tem!
Janet McTeer, indicada ao Oscar de coadjuvante por Albert Nobbs, pode se vangloriar de ser a única na categoria a já ostentar uma indicação ao Oscar. Suas companheiras, Octavia Spencer (Histórias cruzadas), Jessica Chastain (Histórias cruzadas), Berenice Bejo (O artista) e Melissa McCarthy (Missão madrinha de casamento) são marinheiras de primeira viagem. Tudo leva a crer, no entanto, que uma delas possa tirar um sarro a partir de 26 de fevereiro com McTeer.
É chato ser John Williams
Enquanto Jim Carrey se comisera, para John Williams ser indicado ao Oscar é coisa banal do dia a dia. O compositor, que já ostenta 45 indicações em sua carreira, conquistou mais duas para o Oscar 2012. Ele concorre pelos dois trabalhos em colaboração com Steven Spielberg (As aventuras de Tintim e Cavalo de guerra). Vale lembrar que, quando indicado por um trabalho feito com o parceiro de Tubarão, Williams assume certo favoritismo. Foram 14 indicações e três vitórias.
John Williams já não era indicado ao Oscar desde 2006, mas isso é um detalhe menor...
Pitt 3 X 2 Clooney
Não é que George Clooney não tenha se saído bem na fita. É que Brad Pitt se saiu melhor. Os amigos mantêm uma rivalidade saudável com seus filmes, seus trabalhos humanitários e suas presenças em listas de homens mais sexy do mundo. Só que em matéria de cinema, Clooney que já tem Oscar, 3 globos de ouro e outros prêmios, vinha ganhando de lavagem. Esse era o script para o Oscar 2012. Mas Pitt inverteu a lógica. O marido de Angelina Jolie foi indicado a melhor ator por O homem que mudou o jogo e concorre duplamente como produtor pelos filmes A árvore da vida e O homem que mudou o jogo. Clooney, por sua vez, foi indicado a melhor ator por Os descendentes e concorre pelo roteiro de Tudo pelo poder.
O Oscar dos desaparecidos
Não é nenhum absurdo supor que será o Oscar em que haverá menos candidatos ao prêmio de direção presentes. Malick é um notório recluso e, quando indicado em 1999 por Além da linha vermelha, não compareceu. Já Woody Allen só foi à cerimônia do Oscar uma única vez: para prestar uma homenagem a Nova Iorque em 2002, primeira edição do Oscar após os atentados terroristas que derrubaram as torres gêmeas. Nem quando ganhou (em 1978 com Noivo neurótico, noiva nervosa), Woody compareceu.
De volta ao jogo...
E Woody Allen não disputava o Oscar de direção desde 1994 quando foi nomeado por Tiros na Broadway.
Back on the game: Woody Allen recuperou o prestígio de outrora junto ao Oscar e seu Meia-noite em Paris detém quatro indicações aos prêmios da academia
Quem pode com Rango?
Não restam dúvidas. Sem a força da Pixar (que fica fora da disputa pelo Oscar de animação pela primeira vez desde a criação da categoria) e com As aventuras de Tintim fora do páreo, fica difícil contemplar outro filme premiado que não Rango. Mas o francês A cat in Paris (e parece ser o ano da França no Oscar), pode ser o estraga prazeres.
É do Brasil...
E o Brasil está tomando gosto de concorrer ao Oscar sem concorrer de fato. Explica-se. Enquanto produções do país ficam pelo meio do caminho, profissionais e figuras de expressão brasileiras são reconhecidos. Um ano após o documentário Lixo extraordinário, produção inglesa co-dirigida pelo brasileiro João Jardim, concorrer ao Oscar da categoria, o Brasil surge novamente nas entrelinhas. Undefeated é uma produção americana sobre o lutador brasileiro de MMA Anderson Silva. A ginga brasileira está ainda mais presente na categoria de canção original, na qual concorrem Sérgio Mendes e Carlinhos Brown pela composição de “Real in Rio”, da animação Rio.
A caminho da extinção
E por falar na categoria de canção original, os dois únicos concorrentes (o outro é Man or muppet, de Os muppets) atestam de uma vez por todas que a categoria já viu dias melhores. Longe dos megahits dos anos 80 e 90, as canções a cada ano vão decaindo de qualidade e minguando até mesmo em quantidade.
Exércitos de um homem só
O que Alexander Payne, Michel Hazanavicius, Woody Allen, George Clooney e Brad Pitt têm em comum? Todos eles foram indicados em múltiplas categorias. Hazanavicius e Payne, por exemplo, concorrem como produtores, diretores e roteiristas.
Atenção à montagem
Eis uma categoria de suma importância que em 2012, inadvertidamente, garimpa ainda mais a disputa pelo Oscar de melhor filme. Dos cinco indicados (Os descendentes, Os homens que não amavam as mulheres, A invenção de Hugo Cabret, O artista e O homem que mudou o jogo), quatro estão concorrendo na categoria de melhor filme. Três têm seus diretores indicados. Desse grupo de três, dois também têm indicações para o elenco. São eles Os descendentes e O artista, justamente os vencedores do Globo de ouro. Essa combinação (filme, direção, montagem) é um forte indicativo de Oscar de melhor filme. Apenas quatro vezes uma produção foi sagrada a melhor do ano sem ter uma indicação sequer em categoria de atuação. Foram elas O senhor dos anéis: o retorno do rei, Quem quer ser um milionário?, Coração valente e O último imperador. No entanto, todas venceram em montagem e direção. Portanto, ainda há esperanças para A invenção de Hugo Cabret.
Cena de A invenção de Hugo Cabret: o campeão de indicações do ano (11 no total) não é exatamente o favorito ao Oscar de melhor filme...
Cinco roteiros
Prova maior da inconsistência das indicações que não foi corrigida com a nova regra para escolher os concorrentes na categoria de melhor filme, são os finalistas em roteiro.
Apenas cinco dos nove filmes candidatos a melhor do ano estão incluídos entre os dez melhores roteiros. Antes da mudança que colocava dez concorrentes a melhor filme, era praxe supor que os filmes lembrados na categoria de roteiro que não disputavam o prêmio de melhor filme seriam extra-oficialmente o 6º, 7º, 8º,9º e 10º melhores filmes do ano. Essa impressão não só foi esculachada pela academia, como a cada ano que passa, fica mais difícil precisar que filmes são genuinamente admirados pela academia enquanto instituição cinematográfica. Em 2012 essa “imprecisão” ficou mais clara do que nunca.