Por razões diversas, mas umbilicalmente ligadas à estratégia
de operação do Wikileaks, o filme sobre a criação do site e seu idealizador
atraíram interesses difusos e antagônicos desde seu anúncio. Julian Assange,
que ainda não gozava de seu confinamento voluntário na embaixada equatoriana em
Londres, não aprovou a ideia de ter um filme sobre sua figura realizado pelo
cinema americano. Assange, admita ele ou não, é um forte oposicionista dos EUA
no plano internacional. E a reciprocidade é verdadeira. De qualquer modo, um filme feito no esquema comercial hollywoodiano não necessariamente incorpora o
discurso institucional, ainda que Hollywood seja o mais formidável exemplo de
soft power disponível na atualidade.
A produção assinada por Bill Condon reúne um pequeno
conglomerado de estúdios, os principais são DreamWorks, Relience Entertainment
e Participant Media, e se baseia em dois livros. São eles “Inside Wikileaks: my time
with Julian Assange at the world´s most dangerous website”, de Daniel
Domscheit-Berg e "Wikeleaks: inside Julian Assange´s war on secrecy", de David
Leigh e Luke Harding. A adaptação para o cinema é assinada por John
Singer.
Os dois livros fizeram razoável sucesso no meio editorial e
não foram objeto de bravata de Assange na ocasião de seus lançamentos. Por
certo, combinados ou independentes, proveem um painel muito mais complexo e
irrigado do personagem e sua cria, o Wikileaks. Foi justamente essa a percepção
dominante quando da estreia do filme no último festival de Toronto em setembro. A grande
maioria da crítica torceu o nariz para o filme, especialmente a americana que
gostaria que o filme tomasse partido. “O partido que fosse”, chegou a pontuar o
jornal The Washington Post. Assange, à medida que se aproxima a estreia do
filme (marcada para esta semana nos EUA), iniciou uma campanha pública de
desmoralização nos mesmos moldes e rotina da que perpetra contra governos e
grande empresas. Primeiro vazou o roteiro do filme com um memorando apontando
as muitas falhas no texto. Depois divulgou uma carta enviada por ele ao
protagonista do filme, Benedict Cumberbatch em resposta à abordagem deste
para encontra-lo. A carta fora enviada em janeiro e tornada pública agora em outubro. Nela ,
Assange elogia Cumberbatch, mas ressalta (implicitamente) sua ingenuidade ao
participar do filme.
Assange dirige-se para um pronunciamento na embaixada equatoriana em Londres: um homem que gosta de revelar segredos, desde que não seja os seus
No geral, as chances do filme chegar ao Oscar parecem
reduzidas neste momento, para satisfação de Assange que adotou uma postura
muito mais agressiva do que Mark Zuckerberg, outra figura polêmica a
representar o “império digital” a ganhar um filme sobre si e sua cria.
Segundo Bill Condon, houve por parte da realização uma
preocupação muito grande em evitar preconceitos e fórmulas convencionais de
filmes de espionagem na confecção de O quinto poder. Por isso, a opção por se
basear em livros jornalísticos. Frustrar a ampla maioria da crítica americana –
Assange não é exatamente uma figura popular por lá – e também Julian Assange é
um sinal de que a proposta pode não ter sido tão fracassada assim.
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