Todo ano é a mesma coisa. Críticos e analistas se põem a
conjecturar sobre qual é o tema mais vívido na safra de filmes de Oscar. Há
quem note um comentário sutil da Academia nesta elaboração e há quem perceba a
preponderância do acaso no agrupamento de alguns títulos que se comunicam. No
ano passado, por exemplo, existia um forte apelo político com candidatos como
Lincoln, Argo e A hora mais escura e a escravidão, novamente em voga com 12
anos de escravidão, também se destacava no já citado Lincoln e em Django livre.
Neste ano, parece certo apontar que o tema preponderante é a
sobrevivência. Neste ano fica difícil defender uma intervenção pensada da
Academia na constituição dessa frente temática. Até porque, se o nível da
competição é altíssimo, os filmes são radicalmente diferentes entre si.
Produções como Capitão Phillips, Gravidade, Trapaça, 12 anos de escravidão e
Clube de Compras Dallas apresentam personagens e conflitos dramáticos que podem
ser resumidos como batalhas pela sobrevivência. Em Capitão Phillips, filmado
com aquele indefectível esmero documental de Paul Greengrass, um capitão faz o
possível para sobreviver a uma inusitada, ainda que até certo ponto esperada,
ameaça pirata. Gravidade apresenta a batalha solitária de uma astronauta de
primeira viagem à deriva no espaço enquanto que Trapaça mostra um grupo de
personagens tentando sacar da cartola versões melhores de si mesmos.
Em 12 anos de escravidão há o epíteto; o protagonista –
sequestrado e feito escravo pelo período de 12 anos – declara querer viver e
não sobreviver, mas é de sua luta pela sobrevivência que o filme se ocupa.
Clube de compras Dallas talvez apresente a mais tradicional luta pela
sobrevivência encampada pelo cinema, a batalha contra uma doença em uma época
em que incompreensão e intolerância tornavam a AIDS ainda mais fatal.
Para ver o amanhecer: Em Gravidade, Sandra Bullock faz o possível e o impossível para voltar à Terra; em Trapaça, dois vigaristas pegos em flagrante precisam administrar a ganância de um agente do FBI para não serem presos nem mortos pela máfia; em 12 anos de escravidão, um homem livre feito escravo supera anos de tortura e barbárie para contar sua história e em Clube de Compras Dallas, um tipo machista que se descobre aidético contrabandeia remédios do México para salvar sua vida e daqueles que inicialmente eram objeto de seu preconceito
Presente em variações providencialmente complementares em
termos de perspectiva, a sobrevivência em seu grau mais absoluto, como em
Gravidade ou 12 anos de escravidão, ou subjetivo, como em Trapaça, é o tema do
ano.
O caráter acidental do principal tema a ventilar o Oscar
2014 redimensiona a potência promocional da academia aferindo profundidade a um
debate geralmente ralo e superficial circunscritos a preferências pontuais e
campanhas de marketing. O segundo grande tema do ano, esse aventado de forma
menos acidental, é a forma particularmente americana de lidar com a crise
financeira. Se em Blue Jasmine de Woody Allen, há uma comparação cínica entre
classes sociais, em O lobo de Wall Street, há uma sátira escrachada de Wall
Street enquanto monumento de pujança financeira.
Excelente sacada sobre o tema sobrevivência. Acho que, em um mundo cada vez mais caótico e superficial, a busca pela sobrevivência é como um oxigênio. No geral, essa busca é uma forma de enganar a nós mesmos.
ResponderExcluirbjs
Cris/Madame
Obrigado pelo feedback Cris.Eu sou um dos fanáticos por identificar sentidos ocultos nos indicados ao Oscar... rsrs
ResponderExcluirBeijos