domingo, 23 de fevereiro de 2014

Insight - Quero ser Shia LaBeouf


Um dos grandes sucessos do cinema no nascedouro do século XXI foi Quero ser John Malkovich, dirigido por Spike Jonze e escrito por Charlie Kaufman. O filme brinca com a possibilidade de um simples mortal entrar na mente do célebre ator americano por quinze minutos.
Shia LaBeouf não é John Malkovich, talvez queira ser, mas essa é outra história. Aos 27 anos, o ator californiano que alcançou o estrelato como protagonista da trilogia Transformers parece viver uma crise peculiar, ainda que terrivelmente comum no mundo das celebridades instantâneas e da fogueira de vaidades hollywoodiana.
Tudo começou timidamente lá pelos idos de 2010, quando se pôs a diminuir a relevância da série Transformers e assumir uma culpa, que ninguém via, pelo quarto Indiana Jones, que estrelou em 2008, ser abaixo das expectativas dos fãs. LaBeouf começou a flertar com projetos mais sérios. Rodou a sequência Wall Street: pode e cobiça com Oliver Stone e filmes menores, em projeção, mas não em ambição, como Os infratores (2012), Sem proteção (2012) e Conquistas perigosas (2013).
LaBeouf dava declarações polêmicas, dizia-se interessado em expressar-se artisticamente e cansado da vida hollywoodiana. Fez um curta-metragem e, depois de surgirem acusações de plágio, confessou ter se enrolado nos limites entre inspiração e cópia. Para pedir desculpas ao plagiado, contratou um avião para desenhar as desculpas no céu com fumaça. Foi criticado pelo gesto megalomaníaco nas redes sociais e chegou a trocar farpas com personalidades de sua estatura em Hollywood, como a criadora da série Girls, Lena Dunhan. Suas divagações filosóficas no Twitter logo foram postas em suspeição também. Descobriu-se que grande parte era reprodução não creditada. LaBeouf então anunciou sua retirada da vida pública. Em paralelo corria atrás de Lars VonTrier prometendo fazer sexo e cenas de nudez explícita para estar em seu Ninfomaníaca.
No último festival de Berlim, para promover a versão integral e sem cortes do filme de Von Trier, o ator surgiu com um saco de papel na cabeça com os dizeres “não sou mais famoso”. Na mesma cidade montou uma exposição de artes plásticas em que a principal obra era ele. A ideia era ele ficar em uma sala escura, com o saco de papel na cabeça, e olhando fixamente para quem se dispusesse a compartilhar daquele silêncio incômodo com ele.

LaBeouf em Berlim: egocentrismo exacerbado ou algo a dizer?

A exposição foi pouco concorrida. Ele decidiu levar essa manifestação artística para Los Angeles, onde está em cartaz. Entrando na galeria, escolhe-se um objeto entre os muitos que estão à disposição do frequentador. Uma jarrinha com tuítes agressivos contra ele, um bonequinho de Optimus Prime e coisas que, de alguma maneira, remetam a LaBeouf, por mais discreta que seja a relação. A pessoa entra na sala escura e lá está LaBeouf com o saco de papel na cabeça e com olhos marejados olhando fixamente, sem tempo determinado, para ela.
É uma crítica ao culto a celebridade? LaBeouf está tentando uma elaboração artística sobre o significado de celebridade? Ou apenas quer atenção? Não é a primeira vez que astros do cinema tentam radicalizar a relação com a indústria que os molda. Joaquin Phoenix, há não muito tempo atrás, fingiu que tinha largado tudo para trás para seguir carreira de rap. Surgia barbudo, descabelado e fedido e falava coisas sem sentido. Era tudo um documentário exagerado sobre o ônus da fama. O ator deixou-se filmar recebendo sexo oral e com alguém defecando sobre ele.  
Quero ser John Malkovich, em sua proposta surrealista, Phoenix e LaBeouf revelam um mal-estar empírico, desabrido e de difícil elaboração. LaBeourf, à distância que a avaliação permite, parece não se reconhecer mais e mergulhado em uma melancolia que Sofia Coppola tão bem circundou em The Bling ring – a gangue de Hollywood.
La Beouf parece resignado com o fato de que só a arte é a resposta. Mas é preciso identificar nela as perguntas também.

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