terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Crítica - Margin call:o dia antes do fim

O sabor da crise

Esta pequena jóia do cinema independente americano está sendo saudada pela crítica como o melhor filme sobre o mercado financeiro já feito pelo cinema americano. Não é um elogio qualquer, tão pouco uma supervalorização do que representa Margin call – o dia antes do fim (Margin call, EUA 2011). Ainda que classificá-lo como o melhor petardo hollywoodiano contra os destemperos de Wall Street carregue alguma ideologia. Isso posto, é fatídico que Margin call é um elaborado e ácido exame de como se dá um passo maior do que as pernas. No filme de estréia de J.C. Chandor, que compensou a falta de experiência como diretor com a vivência no mercado financeiro (seu pai era consultor em Wall Street), presenciamos as 24 horas anteriores à eclosão da crise financeira que sacudiu o mundo em 2008. Embora não seja mencionado, a analogia com o gigante Lehman Brothers é óbvia; ainda que o filme seja simplista a ponto de creditar à atuação de um só banco o derretimento do crédito que se viu em 2008, é fiel ao inventário dos fatos. Pelo menos em uma hierarquização lógica da sucessão de eventos possíveis em um cenário como aquele.
Chandor acerta, e muito, ao imprimir no filme um ritmo de thriller. Inaugurando, portanto, um novo filão. O do thriller financeiro. Sinais dos tempos e de um roteiro que não se preocupa em mastigar as informações para seu espectador. A ideia é que o espectador concorra com o filme. Assim como o espectador de qualquer outro thriller. Já se sabe mais ou menos aonde o filme irá chegar, mas o caminho até lá é que provocará emoção. Isso quer dizer que para curtir Margin call em toda  a sua exuberância narrativa, ainda que se saiba exatamente em que ponto e mais ou menos como o filme terminará, é preciso conhecer – ao menos em um nível intermediário - como opera o mercado financeiro.

Jeremy Irons entra em cena no ato final e rouba o filme para si: um ator em estado de pura genialidade


Outra bola cheia do filme é o elenco, capaz de entreter quem não entende bulhufas de papéis, títulos e volatilidade. Em um time com Stanley Tucci, Demi Moore, Simon Baker, Zachary Quinto, Penn Badgley, Paul Bettany, Jeremy Irons e Kevin Spacey fica difícil apontar os melhores, mas o destaque recai sobre os três últimos. Bettany faz um típico yuppie que já viu muita coisa, mas ainda se maravilha com a capacidade do mercado, e dos peixes maiores que ele, de absorver toda a encrenca e sair lucrando com ela. Jeremy Irons surge como o dono do banco – aquele tipo bem clichê mesmo. Mas de tão bom ator que é, vira o clichê do avesso e cria algo tão assustadoramente sedutor que cativa a cada olhar. Kevin Spacey, é bom que se diga, tem um daqueles personagens mágicos que possibilitam um ator de seu quilate brilhar intensamente. E ele sabe brilhar. Na pele de Sam Rogers, um executivo que não se incomoda com as demissões sumárias em seu departamento, mas chora copiosamente ao saber que sua cadela está desenganada, o ator encontra um dos grandes momentos de sua carreira como intérprete.
Margin call é um filme que se sente confortável na ambiguidade. Não se incumbe de explicar os tramites de Wall Street, mas não resiste a tentação de criticar a vida que se leva no topo daqueles arranha-céus. Em uma cena genial um personagem explica como se gasta facilmente U$ 2,5 milhões em menos de um ano. É em uma cena como essa que somos obrigados a constatar que estamos vendo uma peça de ficção. Mas não é. Em outro momento o mesmo personagem exclama: “Que se fodam as pessoas normais”. E nós rimos da situação.
A ambiguidade não é só de Margin call. Ela é humana também. Sublinhar isso, de maneira tão sutil e bem engendrada, foi o grande acerto de J.C. Chandor.

4 comentários:

  1. Ainda não assisti esse filme, mas pretendo ver ainda antes do final do ano. Seu texto me animou ainda mais. Abs!

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  2. Parece que escolhi o ano certo para me interessar por economia, né? rsrsrs
    Bem, espero que o filme ainda esteja em cartaz semana que vem, apesar de Kevin Spacey sempre ser um nome que me leva com alguma urgência à sala de cinema - nesta só resta tempo para completar a lista dos presentes de natal, rsrsrs

    Bjs,
    Aline

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  3. Um filme que, para mim, valeu mais pelo elenco... Continuo sem me interessar por histórias relativas ao período da crise econômica de 2008. "Trabalho Interno" me traumatizou!

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  4. Celo:Valeu Celo. Espero que vc goste.
    Abs

    Aline:rsrs. Acho que vai estar em cartaz sim.
    Bjs

    Matheus:rsrs. Te entendo. Trabalho interno tem mesmo sua veia traumatizante...
    Abs

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