terça-feira, 18 de maio de 2010

Crítica - O preço da traição


Um elaborado filme sobre o desejo

O desejo é um elemento recorrentemente abordado no cinema. Nem sempre com resultados satisfatórios. O preço da traição (Chloe, EUA/FRA/CAN 2009) é uma produção que atinge com razoável sucesso seus objetivos. Discutir e aprofundar a força desse sentimento essencialmente humano. Na fita, remake do ótimo filme francês Nathalie X, de Anne Fontaine, presenciamos a ginecologista Catherine (Julianne Moore) desconfiada de que seu marido David, um charmoso professor universitário (Liam Neeson), esteja lhe traindo. Instigada pelo jeito bajulador com que trata todas as mulheres, ela contrata uma prostituta para flertar com David e ver como ele reage. Não é preciso dizer que os rumos dessa aventura não se delineiam como Catherine supunha.
O primeiro grande acerto do diretor Atom Egoyan foi, em dado momento, divorciar-se do filme original. A certa altura O preço da traição é um filme inteiramente novo e esboça uma análise do desejo distinta da realizada por Fontaine em seu filme. O outro grande acerto de Egoyan está na elegância da condução da história, os filmes de Adrian Lyne são uma referência clara aqui, e na forma ritmada como desenvolve sua história.
A insegurança de Catherine e todo o sentimento de abandono e desamor encontram eco na bela Chloe (Amanda Seyfried), que acaba apaixonando-se por Catherine, tendo como assentamento para esse sentimento a fragilidade emocional de ambas. O desejo é o motor de todas as coisas em O preço da traição. Da ação e da não ação. O impulso e a repressão do desejo são muito bem contextualizados pelo roteiro de Erin Wilson (que já havia escrito o também intenso Secretária). É interessante notar que Catherine, mesmo na posição de conhecer muito bem o corpo feminino, é profundamente reprimida sexualmente. Uma sutileza brilhantemente transfigurada pela bela atuação de Julianne Moore. Liam Neeson também faz uma ótima composição, mas quem arrebata mesmo em cena é Amanda Seyfried. Belíssima em cena, a atriz se entrega com veemência a uma personagem machucada e complexa. Ela não se intimida diante de cenas de difícil tato. Como aquelas em que expõe todo o colapso emocional de sua personagem ou em uma sensual cena lésbica com Julianne Moore.


Amanda Seyfried e Julianne Moore, ótimas, em cena do filme: Afinal, qual a diferença entre desejo e loucura?


Há quem possa argumentar que Egoyan enverede pela obviedade do thriller erótico. Não deixa de ser verdade. A solução de O preço da traição diminui sua força. É simplista e convencional, mas não desmerece a qualidade com que o tema principal, o desejo e suas circunstâncias, foram abordados. É óbvio que uma produção com dinheiro hollywoodiano precise se ajeitar como tal, mas Egoyan foi muitíssimo bem sucedido em preservar seu status autoral. O preço da traição é um excelente estudo sobre o que predispunha ser. O melhor de tudo é que tem luz própria, não é simplesmente uma versão americana da mesma proposta francesa.

8 comentários:

  1. Desde o ano passado que venho conferido notícias e imagens deste longa, e estou muito curioso para conferi-lo!

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  2. Olha, eu achei o filme bem ruim... Faltou vigor no roteiro e, justamente, algo mais elaborado. Ficou óbvio. Sem falar do final apressado e insatisfatório.

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  3. Oi Rei,
    Eu ainda não conferi esse filme, mas quero pagar esse preço pra ver,rs!

    Engraçado é que comentei no meu twitter que o Liam Neesom não tinha cara de que iria trair, que era mais fácil a Amanda pegar a Moore, haha... ando intuitiva demais, eu sabia que ia rolar um lesbo moment.

    Enfim, acho interessante a premissa do desejo e o fato de lembrar algo de Lyne... acho que vou curtir!


    Bjs

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  4. Alan: Acho que vc vai gostar alan. É um entretenimento inteligente. ABS

    Matheus: Obrigado pela esportividade e por ter comparecido aqui para ler a minha critica Matheus. Fico feliz mesmo. Então, discordamos em relação ao aproveitamento do filme. Como disse, o final é problemático, mas a matéria do filme, penso, é abordada satisfatoriamente. Essa previsibilidade hollywoodiana incomoda mesmo espectadores doutrinados, mas creio que o filme apresente mais do que seu arco narrativo convencional faz crer.
    Grande abraço!

    Madame: O filme é bom. Vale a conferida. Acho que há uma discussão muito interessante sobre as circunstâncias do desejo. Esse, a despeito da trama central, é o grande trunfo do filme.
    Bjs

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  5. Uua, escrevi quase a mesma coisa que você, mas pode-se ver o pq de vc ser jornalista e eu não!
    O seu domínio pelas palavras disse o que eu quis dizer com meu NÃO domínio delas. Mas falando no filme...é maravilhoso.
    Mesmo com o final hollywoodiano, o filme ousa, e todas as cenas são carregadas de tensão e constrangimento. O elenco é brilhante. E mesmo sendo tudo óbvio, não desmerece em nada o longa.
    Torci muito pra essa presilha ter um uso melhor, se é que você entende...

    Bjão
    http://amuupoint.blogspot.com/

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  6. Obrigado pelos elogios Mila. Realmente o filme é uma experiência bastante agradável. E tb torci para a presilha ter um uso melhor! rsrs
    Bjs

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  7. Gostei muito do filme e pela primeira vez vejo uma crítica coerente ! Parabéns!Lamentável saber que houve tamanho rebuliço e expectativa por causa de uma cena sensual, enquanto que o filme como um todo é bom! São os sentimentos e carências, a princípio se pensa que os atos de cada um são insanos, meio sem sentido, mas qual de nós, em algum momento da vida, não cometeu algo duvidoso,uma pequena mentira,uma loucura! Não é uma cena,são detalhes, vários detalhes, e todas as cenas são fortes.A fotografia em tons amarelados, roupas que combinam com folhagens, a força dos espelhos e vidros,as locações em Toronto, a trilha musical, a banda canadense Raised by Swans,fora a atuação de Amanda como Chloe que é surpreendente e, embora Julianne esteja muito bem ,acredito que Amanda rouba a cena e está bem mais a vontade, apesar das cenas fortes. Há uma delicadeza em tudo!Verias este filmes várias vezes sem enjoar!

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  8. Reinaldo, muito boa sua análise!!Finalmente encontro alguém que entendeu a essência deste tão delicado filme.Maravilhoso quando você diz "A insegurança de Catherine e todo o sentimento de abandono e desamor encontram eco na bela Chloe (Amanda Seyfried), que acaba apaixonando-se por Catherine, tendo como assentamento para esse sentimento a fragilidade emocional de ambas. O desejo é o motor de todas as coisas em O preço da traição. Da ação e da não ação... mas quem arrebata mesmo em cena é Amanda Seyfried. Belíssima em cena, a atriz se entrega com veemência a uma personagem machucada e complexa...O preço da traição é um excelente estudo sobre o que predispunha ser." PARABÉNS REINALDO!!OBRIGADO!

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