As nossas sabotagens de cada dia
À procura do amor (Enough said, EUA 2013) é um filme de
verdade. No sentido de que busca amparar sua narrativa, e seus personagens, na
realidade, por vezes amargurada e em outras tantas, estimulante. O filme de
Nicole Holofcner apresenta um dilema tão inusitado quanto possível, mas não se
dedica exclusivamente a ele; expandindo o alcance do brilhante roteiro nos bons
coadjuvantes e subplots aparentemente despretensiosos.
Julia Louis-Dreyfus vive com admirável e cativante sutileza
Eva, uma massagista que beija os cinquenta anos e vive a expectativa de ter sua
filha única longe de casa, já que ela irá para a faculdade do outro lado do
país. Eva se depara com o mal estar de ficar sozinha e inesperadamente se abre
a uma relação improvável com Albert (James Gandolfini em um de seus últimos
papéis no cinema), um tipo mais gordo e bruto do que seu gosto admite, mas que
vai vencendo-a pelo senso de humor afiado e a generosidade incontida. Acontece
que uma nova cliente de Eva, papel que Catherine Keener faz brincando, desanda
a falar mal do ex-marido e o que Eva vai perceber eventualmente é que esse
ex-marido e seu potencial novo amor são a mesma pessoa.
Gandolfini e Dreyfus: sutileza e fragilidade a serviço de uma narrativa envolvente e verdadeira
A questão que se coloca é: deixar-se contaminar pela
percepção de outra pessoa de Albert ou bloquear essa curiosidade mórbida, se é
que isso é possível? Holofcner, que também assina o roteiro, reveste esse
questionamento de nuanças que falam a cada espectador com uma experiência
amorosa mal sucedida (praticamente toda a população mundial) e enxerga nas
miudezas do cotidiano toda a força desestabilizadora que elas insurgem na vida
conjugal das pessoas. O casal de amigos de Eva formado pelos atores Toni
Collette e Ben Falcone cristalizam essa percepção de Holofcner nas mais
esdrúxulas situações, como a incapacidade de demitir a empregada ou na
constante mudança de decoração da sala de estar da casa deles.
À procura do amor sinaliza como o processo de sabotagem é
contínuo em nossas vidas. Seja pela imobilidade emocional a que nos sujeitamos,
pela recusa em mudar uma postura qualquer ou mesmo em querer antecipar resultados
que não podem ser antecipados, como anos de convivência em uma fase de início
de relação amorosa. Essa crueza tão bem adornada em uma embalagem de comédia
romântica torna a procura pelo amor mais conscienciosa para sabotadores e
sabotados, ainda que estes sejam a mesma pessoa.
Concordo com você, o roteiro do filme é mesmo muito bom. Gostei tanto do filme que cheguei a ler o script. A Julia Louis-Dreyfus é muito boa comediante e está muito bem no papel. Aproveitando, queria dizer que os posts sobre os filmes do Oscar estão demais! Será que o roteiro de "À Procura do Amor" tem chance? Abraço
ResponderExcluirOi José, tudo bem?
ResponderExcluirSaudade dos seus comentários por aqui. Fico feliz que esteja gostando dos posts sobre a corrida pelo Oscar. Vem muita coisa boa por aí ainda! Acho que o roteiro tem chances sim. A categoria de roteiro original está muito menos concorrida do que a de adaptado. É a grande chance do filme, já que Dreyfus não deve ter chances, embora esteja ótima. Acho que Inside Llweyn Davis e Ela são realidades na categoria. Blue Jasmine e À procura do amor estão muito perto de indicações, mas não são certezas ainda.
Abs