domingo, 29 de dezembro de 2013

Crítica - Álbum de família

Sofro, logo existo!

Álbum de família (August: osage county, EUA 2013) abre com uma frase de T.S. Elliot (“A vida é longa”) para logo desautorizar um dos maiores cânones da literatura americana. É um início promissor. Não à toa, o filme é baseado na peça vencedora do Pulitzer e adaptada pelo próprio autor, Tracy Letts. Mas diferentemente de Killer Joe – matador de aluguel, também adaptado por Letts de sua própria peça, a transição do teatro para o cinema se faz sentir. O elenco, recheado de figurões de Hollywood, brilha intensamente com material delirantemente dramático e bem pavimentado no humor negro, mas não evita a sensação de que o filme como um todo só existe como veículo para seus atores – em especial Meryl Streep e Julia Roberts, ambas cotadas para o Oscar.
Dirigido por John Wells (A grande virada) e produzido por George Clooney, Álbum de família tem sua ação detonada pela morte do patriarca da família Weston, vivido por Sam Shepard. Meryl Streep faz a viúva, que padece de um câncer na boca e de um vício incontrolável por antidepressivos e congêneres. A morte do marido reúne a família novamente. Julia Roberts faz Barb, a filha mais velha e que guarda mais semelhanças com a mãe do que gostaria de admitir, Julianne Nicholson faz Ivy, a filha que subtraiu-se de si mesma e ficou na cidade cuidando dos pais enquanto as outras irmãs saíram de Osage county. Juliette Lewis faz a despirocada Karen, que troca de homem frequentemente e traz o noivo surpresa (Dermot Mulroney) para o funeral do pai. Soma-se a essa galeria de personagens, a irmã de Violet (Streep), vivida com força demolidora por Margo Martindale. Seu marido é interpretado por Chris Cooper e o filho que ela rejeita é vivido por Benedict Cumberbatch. Os dois atores fazem um contraponto ao tom superlativo das principais mulheres da trama.
O elenco é completado, ainda, por Ewan McGregor como o marido de Barb e Abigail Breslin, como a filha do casal.
Atrizes em êxtase: o elenco feminino é a principal força, e deverás ostensiva, de Álbum de família

Segredos sórdidos e ressentimentos desmesurados movem a narrativa que se resolve nos contornos de um filme tradicional sobre famílias desestruturadas. No entanto, um olhar mais refinado revelará um conflito geracional como valioso subtexto. Há nos contornos da narrativa a preocupação em situar as diferenças pulsantes entre as gerações da família e é aí, nesse bom subtexto, que há menor incidência da mão pesada de Wells e justamente por isso percebe-se o quanto é bom o texto de Letts e como a transição para o cinema o engessou, reconfigurando-o como um filme de atores.
Toda a família tem suas rachaduras e o sofrimento dos membros do clã Weston vai, invariavelmente, avocar a identificação da audiência. Esse aspecto deturpa, em favor do filme, a avaliação que se faz dele de imediato. O tempo, no entanto, jogará luz sobre as limitações de um filme que receberia a pecha de “televisivo” – definição cada vez mais deslocada em virtude da qualidade crescente que se verifica na referida mídia – não fosse o elenco de ases da atuação.
Não se advoga que há demérito em uma produção por ela ser talhada para atores brilharem, apenas se defende que, no caso de Álbum de família, essa qualidade derroga sua potencialidade narrativa resultando em um filme impactante no primeiro momento, mas longe de maiores notas.

Um comentário:

  1. Ainda em êxtase com a cena da refeição pós-enterro, nós vamos do trágico ao cômico em segundos.

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