A pergunta que enuncia esse texto, aparentemente tão abrangente quanto provocativa,
busca, na verdade, confrontar essa noção de que a “era do digital” democratizou
o cinema. O que não necessariamente indica que o contrário se verificou. Parece
pacífico nessa era da convergência de mídias que o formato digital facilitou o
acesso, a produção e a distribuição de filmes.
Federico Fellini é um dos expoentes do cinema italiano de
todos os tempos. Cineasta que tão bem acampou traços biográficos em seu cinema,
sem abdicar de uma forte visão crítica da sociedade, Fellini se tornou um autor
de cinema que por meio de filmes imortais como A estrada da vida, Oito e meio,
A doce vida e Roma de Fellini logrou a película como parte essencial da
experiência cinematográfica. Não está em discussão apenas a riqueza e força das
imagens concebidas pelo diretor, mas também a independência artística das
mesmas.
Inegável que o formato digital possibilita experiências
narrativamente inovadoras como verificadas em filmes como Poder sem limites,
Cloverfield – o monstro e A casa, filmes gravados com câmeras de celulares ou
pequenas câmeras digitais que modificam a estrutura narrativa dos filmes; mas
até onde essas imagens podem chegar? Surgirá um novo Fellini na era digital?
Improvável. O filme A vida em um dia, atualmente em cartaz nos cinemas de São
Paulo e Rio de Janeiro, demonstra que o formato não comporta nada além de si
mesmo. O projeto desenvolvido pelos cineastas Ridley Scott e Kevin McDonald reúne
diversos vídeos filmados e postados por usuários do site de compartilhamento de
vídeos Youtube com a finalidade de gerar esse longa-metragem agora nos cinemas.
A ideia da democratização é deverás atraente, para não falar que é
incrivelmente generosa. Mas a efemeridade dessa democratização é um perigo em
termos históricos. É fatídico que existem cineastas que dominam o digital com
invejável fôlego. Caso de gente como Michael Mann e James Cameron, mas nenhum
deles é um Fellini em todo o peso histórico e conceitual que este nome carrega.
Nenhum deles será.
O que está em pauta não são os aspectos positivos da “era
digital”, já largamente debatidos e há muito consentidos pelos principais
pilares do cinema enquanto arte e indústria. Está em pauta o que talvez seja o
grande aspecto negativo dessa catarse digital e que poucos parecem realmente
conscientizados do fato.
Parece factível supor que surgirão novos “James Camerons” e
“Michael Manns”, mas um novo Fellini está cada vez mais distante de nosso
futuro. Eis um anseio que parece relegado ao mesmo passado, ao qual a película
está fadada a caminhar.
Não gosto dessa ideia de comparar novos diretores com nomes importantes do gênero. Acredito que cada profissional deve querer trilhar um caminho próprio, sem comparações. Acho que podem surgir nomes influenciados por Fellini e por outros grandes diretores do cinema, mas nunca teremos um novo Fellini, um novo Hitchcock, um novo Wyler, um novo Welles e assim por diante.
ResponderExcluirBeijos!
Kamila: É Ka... vc não entendeu a essência do texto. Não comparo diretores ou mesmo a envergadura de suas obras. Estou abordando as limitações do formato digital. A capacidade de novos diretores criarem imagens que excedam o próprio significado. Defendo que o formato digital enquanto democratiza o cinema lhe priva de certo romantismo inebriado pela película. James Cameron, Fellini e Michael Mann só estão aí como personificações desse argumento. Não está se discutindo a influência artística desses diretores ou qualquer coisa parecida...
ResponderExcluirBjs