terça-feira, 3 de abril de 2012

Crítica - Um método perigoso

Triângulo amoroso-intelectual 

Um método perigoso (A dangerous method, EUA/CAN 2011) propõe uma minuciosa análise das circunstâncias que aproximaram e afastaram Jung e Freud, os dois principais pilares do pensamento psicanalítico. E faz isso da maneira mais atraente possível, ao iluminar a figura de Sabina Spielrein (Keira Knightley). A russa judia foi a primeira paciente de Jung, interpretado com precisão e respeito por Michael Fassbender, tratada pelo método revolucionário proposto por Freud (Viggo Mortensen). A cura pela fala era algo ainda visto com profunda desconfiança pela comunidade médico-científica e o entendimento de Freud alinhava à sexualidade todos os problemas de ordem emocional/psicológica.
O que Um método perigoso captura com extrema sensibilidade crítica é a forma como Sabina desestabilizou convicções de Jung e proporcionou um amadurecimento do pensamento teórico freudiano. Essa vertente é patenteada pela conflituosa relação que se estabelece entre os três vértices desse triângulo. Embora Sabina e Jung se relacionem amorosamente, é com Freud que a futura psiquiatra irá desenvolver afinidade teórica. Esse embasamento se mostra riquíssimo na construção dramática de Um método perigoso e no comentário que Cronenberg e o roteirista Christopher Hampton tecem sobre esses personagens. A fita se prolonga por cerca de 15 anos e finda pouco antes da eclosão da primeira guerra mundial. O interesse de Cronenberg em radiografar a evolução do relacionamento entre Freud e Jung pode submergir o espectador em um filme verborrágico e pouco contemplativo. O que não é necessariamente algo negativo. A constante insurgência de conflitos sofisticadamente colocados pelos personagens transmuta Um método perigoso em uma seção de análise reveladora. Não à toa, o filme se encerra com seus personagens mergulhados em erupções internas e diante de frustrações de variadas procedências.

Keira e Fassbender em momento de tensão sexual: a cura de um está diretamente relacionada ao surgimento de angústias existenciais por parte do outro


Freud, na construção vigorosa de Viggo Mortensen, é um sujeito calmo que demonstra grande ansiedade pelo que julga ser uma contribuição inestimável à humanidade. É também um sujeito arrogante, suscetível a alguma inveja do abastado Jung e ainda mais intransigente no que toca a defesa de seu ponto de vista. No entanto, sua retidão moral e teórica é algo que não foge à percepção da realização. Por outro lado, Jung é registrado com mais carisma e fragilidade por Michael Fassbender. O despudor de Jung para afrontar Freud em suas convicções é algo valorizado pela narrativa que não o condena por seus desvios teóricos e morais, mas acaba por reforçar – ao menos dramaticamente – o método freudiano através deles.
Keira Knightley faz por merecer novo elogio pormenorizado em seu segundo trabalho consecutivo. Depois de uma aparição contida e generosa em Não me abandone jamais, a atriz assume o difícil papel de Sabina com inteligência e relevo dramático. A histeria da personagem quando a conhecemos é apresentada com sagacidade pela atriz que elaborou cacoetes capazes de transmitir à audiência a agonia que sua personagem experimenta. O flerte com a caricatura é algo do qual Knightley escapa habilmente. Ajuda, é claro, ter Michael Fassbender como bússola.
Um método perigoso é uma amostra de como o cinema pode se apresentar como articulador de ideias e revisor histórico. Se não é um filme pulsante e catártico como geralmente o são as fitas de Cronenberg, é embasamento teórico para a obra de um cineasta um tanto freudiano e fonte incendiária para debates dos seguidores de ambos os intelectuais. É cinema que pensa!

4 comentários:

  1. Eu estou bastante curiosa para assistir a este filme. Confesso que conheço pouco das teorias de Jung e Freud e espero que esse fato não me atrapalhe na hora de acompanhar a trama de “Um Método Perigoso”. É tão raro a gente ver um filme que faz a gente pensar e refletir, que, quando a gente tem essa oportunidade, é melhor aproveitar. :)

    E confesso também que prefiro mais o David Cronenberg nessa linguagem cinematográfica convencional do que em seus filmes mais “ousados” do ponto de vista do roteiro e da linguagem.

    Beijos!

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  2. Sobre o filme em si e o verbo, acho que já chegamos a uma conclusão, não? hehehe. Gosto do resultado construído por Cronenberg aqui, apesar do diferente, e realmente tem material para muita análise.

    Só discordo em relação a Keira Knightley, acho realmente a moça uma boa atriz, mas achei que ela exagerou nos cacoetes na primeira parte.

    bjs

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  3. Kamila: Atrapalhar não atrapalha Ka, mas conhecer as teorias de ambos, ainda que superficialmente, ajuda a tornar a experiência muito mais prazerosa.E sei que vc prefere essa fase "comportada" de Cronenberg... rsrs.
    Bjs

    Amanda: Está tudo pacificado Amandita!rsrs. Menos a questão da Keira.rsrs. Eu, ao contrário de vc, tenho minhas reservas quanto a atriz. Acho ela bonita, carismática e tudo mais, mas acho- a bem duvidosa em termos de talento. Contudo, aqui, achoa- sublime. Muito bem dirigida por Cronenberg. Lembre-se que ela precisava expressar fisicamente histeria. Algo que relatos médicos da época mostram que as pacientes ficavam descontroladas e desenvolviam tiques. Como o filme dá grandes saltos temporais era preciso sublinhar bem a evolução da personagem. Acho que Keira foi não menos do que irrepreensível e faço minhas as palavras de Viggo Mortensen em entrevista à Folha de São Paulo: ela merecia indicações a prêmios.
    Bjs

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  4. Um dos filmes onde a psicologia está presente. Este eo assunto da hipnose são dois dos que eu gostaria de ver em algumas produções, um exemplo é a nova série série O Hipnotizador, uma história em que um homem revela segredos através desta prática, o melhor neste 2015. como recomendado.

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