domingo, 21 de agosto de 2011

Questões cinematográficas - A arte de fazer comédia no cinema

O grande ator Jack Nicholson disse certa vez, em uma célebre entrevista a Rolling Stone americana, que tinha um profundo respeito por comediantes; pois sabia que não era fácil fazer os outros rirem. No cinema, de acordo com o raciocínio de Nicholson, o desafio é ainda maior. “Fazer chorar é fácil e o texto muitas das vezes tem grande responsabilidade nisso. Agora provocar o riso é de grande responsabilidade do ator”, ponderou Nicholson na ocasião.
Outro ícone que fez mais rir do que Jack Nicholson, Dean Martin, que integrou o chamado Rat Pack ao lado de Frank Sinatra, disse que fazer comédia é como matar um leão por dia. Bob Farrely, diretor de filmes que podem ser rotulados como bobinhos e escrachados, assegurou que todo comediante é, na verdade, profundamente triste. “Fazer comédia deprime”, colocou Steve Martin em entrevista a Esquire nos anos 90. Martin, um dos grandes comediantes de sua geração, é também um cantor, compositor e autor literário. Um artista fluente em sua arte que atingiu a grandeza, pelas próprias palavras, se deprimindo.
O cinema, de modo geral, não é suficientemente grato com quem lhe confere leveza. Gente como Jim Carrey, Tina Fey, Jerry Lewis e Jack Lemmon nem sempre gozaram de prestígio junto à crítica.


Steve Martin estampa a capa da Esquire: ele precisa de um abraço...


O humor é algo escorregadio. Nem todo ator sabe manejá-lo fisicamente. Outros escrevem maravilhas para determinadas mídias e fracassam vertiginosamente no cinema. Jerry Seinfield é um bom exemplo nesse nicho.
O trato com o humor evoluiu no compasso das transformações que surgiram no seio da sociedade que passou a ser mais cínica, liberal – ainda que apresente rompantes moralistas – e tolerante. Contudo, a comédia continua sendo considerada um gênero menor em Hollywood. Blake Edwars, Woody Allen, Billy Wilder são exemplos de grandes cineastas que fizeram grandes comédias – sempre críticas, inteligentes e divertidas – que foram mais festejados em suas incursões dramáticas.
Nicholson, que é grande amigo de James L. Brooks, que dirigiu o ator nos oscarizados Laços de ternura e Melhor é impossível, acha que o amigo é um dos grandes propulsores da comédia americana. Isso porque Brooks é o criador de Os simpsons – o seriado mais longevo da tv americana. Mas no cinema, Brooks não tem tido sorte. Seus últimos filmes, Espanglês (2004) e Como você sabe (2010) amargaram críticas ruins e apontaram para uma saturação de um certo tipo de humor.
O fato de Woody Allen ter se refugiado na Europa também sugere essa interpretação. O humor americano hoje parece desenvolvido para a geração Youtube e países como o Brasil seguem essa tendência ao consagrar nas bilheterias filmes como Cilada.com. O stand up comedy – algo intrínseco à cultura do humor americano – está chegando no Brasil com força – mas influenciado por esse “empobrecimento digital” do humor.

James L.Brooks orienta Jack Nicholson e Paul Rudd no set de Como você sabe: tipo de humor que está perdendo o espaço no cinema...


Fazer comédia no cinema parece algo cada vez mais circunscrito ao gosto popular. Ao entretenimento leve e idiossincrático. É um movimento perigoso o que se testemunha.
Tanto o é, que as melhores comédias da atualidade estão alojadas na tv. Alexander Payne, que fez os mordazes Eleição e As confissões de Schmidt (Olha o Nicholson aí de novo!), além do saboroso Sideways-entre umas e outras, recorreu a HBO para fazer a perola do humor negro Hung – em que Tomas Jane faz um homem em crise financeira que recorre aos seus dotes físicos como subterfúgio econômico. Modern family e 30th Rock continuam a impressionar pelo vigor narrativo e a capacidade de refletir as relações familiares e profissionais valendo-se do humor. Essas eram preocupações que o cinema abraçava. A razão de não abraçar mais passa tanto pelo (des) interesse do público como pela hesitação dos estúdios em apostar em um tipo de humor que não agrade jovens cheios de espinhas.
Talvez por isso, fazer comédia deprima. Steve Martin, no entanto, continua apostando no humor. Assim como James L. Brooks. Billy Wilder disse certa vez que reside na capacidade de rir de si mesmo, o grande triunfo civilizatório do homem. Não podemos nos desconectar dessa verdade.

6 comentários:

  1. Boa reflexão! Eu concordo que o desafio de fazer rir é muito mais arriscado do que de levar o público às lágrimas. Comédia é uma faca de dois gumes, infelizmente considerado pouco relevante no meio cinematográfico pela sua sedução comercial. Senti falta de Jim Carrey no texto, que é O comediante dos últimos tempos, embora os papeis recentes estejam um pouco aquém de sua envergadura.

    Ah, tenho que ver essas séries norte-americanas, mas não dou conta nem dos filmes! rs. Não sabia que Payne estava na telinha e desconhecia totalmente esse "Hung", obrigatório conferir!


    abs!

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  2. Concordo com tudo. Fazer comédia é difícil e quando há uma boa comédia que consiga ser sucesso e principalmente arrancar umas boas risadas, é algo a ser comemorado. Pensando agora, não consigo me lembrar da melhor comédia que eu já vi... Nem sei se há uma "melhor".

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  3. bom o texto. eu acho que isso da comédia não tão valorizada quanto o drama no cinema é algo natural. o terror também é visto como algo menor, mesmo com o gênero tendo verdadeiras obras primas (como os filmes de george romero etc). mesmo assim há comédias clássicas e valorizadas pela crítica (annie hall) e ainda há boa comédia sendo feita hoje (como com os atores will ferrell e steve carell)

    abraços!

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  4. CARA! Ontem revi "Antes Só do que Mal Acompanhado" do fabuloso John Hughes (última fita da minha virada cinematográfica de FDS - sempre é bom terminar com um filme leve depois de ter visto uma obra prima do Western de Leone [Quando Explode A Vingança])enfim...lá tinha um engraçado e genial Steve Martin e um adorável John Candy. Sabe? O meu limite de comédia!

    Honestamente tenho saudade daqueles filmes do James L. Brooks (posto Melhor é Impossível em breve). Seus últimos filmes, sobretudo aquela bobagem com a espanhola Paz Vega e um chatérrimo Adam Sandler me deixaram entediado! Não to gostando muito das comédias recentes. Sinceramente.

    Nicholson tem toda razão. E digo mais: "não é fácil fazer o Rodrigo aqui rir de verdade." Rs! tem que ser um comediante fodão pra isso. HA!

    Abraços

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  5. Na minha opinião, fazer comédia é muito mais difícil do que fazer drama. Porque fazer rir envolve uma série de elementos, especialmente ter um timing cômico correto e não é todo mundo que tem isso.

    Adorei teu texto, Reinaldo!!

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  6. Elton: Obrigado meu caro. Além de Hung, há outras ótima séries em cartaz na Tv. E os cineastas estão cada vez mais presentes. Neil Jordam está por trás da excelente The borgias, com Jeremy Irons. Jim Carrey está citado no texto. Só não o cito mais, por falta de conjuntura com os trabalhos destacados. Abs

    Alan: Valeu meu caro. Há tipos e tipos de comédias. Infelizmente, certos estilos estão sobrepujando outros e isso, como atentei no artigo, é um movimento perigoso.
    Abs

    Ciro: Concordo plenamente que haja boas comédias sendo feitas hj. As colunas dos últimos domingos (TOP 10 e Claquete repercute) assinalaram isso. Acontece que um humor mais sofisticado, inteligente e cult está sendo abnegado em Hollywood.
    Abs

    Rodrigo: Os últimos do James L. Brooks foram mais fracos mesmo. Mas a questão não é exatamente essa. É a crescente falta de espaço para o humor que Brooks pratica no cinema.
    E acho bom que não seja fácil provocar risos no senhor rodrigo... rsrs
    Abs

    Kamila: Obrigado Ka. Concordamos plenamente aqui.
    Bjs

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