domingo, 25 de setembro de 2011

Insight

Por que Tropa de elite 2 é o filme certo na hora errada?



A pergunta é mesmo capciosa. Pelo terceiro ano seguido, a escolha do representante brasileiro para pleitear uma vaga entre os indicados ao Oscar de melhor filme estrangeiro é alvo de questionamentos e contestações em uma seção Insight do blog. Em 2007, o primeiro Tropa de elite foi negligenciado em favor de O ano em que meus pais saíram de férias, de Cao Hamburguer. O filme que relacionava ditadura e futebol com o tempero do olhar de uma criança, segundo a comissão responsável pela indicação do representante brasileiro, era mais “coerente” com as demandas do restrito, e de idade avançada, colegiado responsável pela escolha dos filmes estrangeiros na disputa pelo Oscar. Fato é que, enquanto O ano em que meus pais saíram de férias já era carta fora do baralho, o primeiro Tropa ganhava em Berlim o Urso de ouro. Aquele filme, considerado pelo editor de Claquete como melhor lançamento em cinema do ano de 2007, era muito superior ao filme que bateu todos os recordes possíveis e imagináveis em 2010. Mas não era uma unanimidade. Sofreu patrulhamento ideológico, o ápice ocorreu na premiere da fita no festival do Rio, e foi acusado de ser fascista e fazer apologia a um estado policial. Leviandades que foram desarmadas quando o júri presidido pelo cineasta de esquerda Costas Gravas outorgou o prêmio máximo ao filme de José Padilha em Berlim.
Tropa de elite 2 – o inimigo agora é outro foi recebido sob os acordes da unanimidade crítica e do acolhimento popular. A fita apresentava Nascimento (o herói popular consagrado no primeiro filme e que gerou neologismos como “Rambo da classe média”) alinhado a políticas tomadas como de esquerda. O processo de amadurecimento do personagem que foi abraçado pela audiência tinha gosto de mea culpa da realização por, no filme anterior, responsabilizar diretamente a classe média por algumas das mais itinerantes mazelas de seu cotidiano.
Tropa de elite 2 é ótimo cinema. Mas é também uma tentativa de diálogo com um público mais amplo e diversificado. É, em última análise, uma obra que busca – antes da catarse - a reflexão. Isso tudo está mais delimitado no segundo filme do que no primeiro. É um filme pensado para ser mais universal – ainda que trate de um contexto essencialmente carioca.
A escolha de Tropa de elite 2 para representar o Brasil no Oscar 2012 permite ilações divergentes. A primeira diz respeito à própria produção cinematográfica atual. É fato que o Brasil avança no ritmo de produção em escala industrial. Em 2011 estrearam comédias, romances, comédias que flertam com ficção científica, filmes experimentais, dramas, filmes de ação, etc. Mas ainda falta ao cinema nacional inventividade. Isso se reflete na percepção da comissão julgadora responsável por apontar o filme que irá representar o Brasil na briga pelo Oscar. Existe a preocupação em antecipar os parâmetros do colegiado que escolherá os indicados (e buscar um filme estreado em 2010 só reforça essa condição). E mesmo sob essa orientação a falta de imaginação é incrível.
Tropa de elite 2 é um filme que faz muito sentido dentro da lógica brasileira. Assim como o primeiro Tropa. Mas os americanos já fazem filmes sobre corrupção policial há muito tempo. A categoria de filme estrangeiro tem se mostrado pouco receptiva a produções erigidas sob tal temática. Veja os filmes que despontam como favoritos este ano. O libanês Where do we go now? foi escolhido pelo júri popular do último festival de Toronto como o melhor do evento. A trama, uma comédia farsesca, versa sobre mulheres e seus planos para manterem seus maridos longe da guerra. A escolha francesa, La guerre est déclarée, versa sobre um casal às voltas com a batalha contra um tumor cerebral que vitima o filho A Alemanha escolheu Pina, documentário em 3D de Wim Wenders sobre a vida e obra da coreógrafa alemã Pina Bausch para representar o país. A Finlândia elegeu Le Havre, sobre um boêmio que ajuda um menino imigrante da África a se esconder na França, como o representante do país.
Um filme que se valesse mais de metáforas e fosse mais sutil na articulação de suas idéias, como Trabalhar cansa, de Marco Dutra e Juliana Rojas, (que já participou de festivais internacionais) ou Meu país, de André Ristum, talvez fossem escolhas mais consonantes com os rumos da produção internacional que, no final das contas, representam o parâmetro que a própria produção nacional tem como objetivo.
Tropa de elite 2 é o filme certo para alavancar a produção cinematográfica no país, instaurar o debate sobre mecanismos de distribuição e até mesmo sobre o impacto de produções politizadas no âmbito sócio-cultural, mas não é o filme que valerá ao Brasil seu primeiro Oscar.

8 comentários:

  1. Diante da lista com os 15 filmes inscritos para representar o Brasil, acho que só mesmo "Tropa de Elite 2" tinha alguma chance. Por ser o melhor filme - entre os que vi, claro - e pela popularidade controversa do original. "Trabalhar Cansa" foi mesmo bem recebido em festivais afora, mas "Meu País" não constava na lista, mas a história da família degenerada talvez tinha mesmo muitas chances.

    Eu sempre serei da opinião de que se deve indicar o nosso melhor, independente de avaliar tramas e enredos para concluir se há alguma chance ou não. Como esquecer de "Olga"? Filme sobre uma esquerdista, mártir do Brasil... e aquilo tudo é patético. Da mesma forma foi surpreendente escolherem "O ano em que meus pais..." sobre o primeiro "Tropa de Elite", que é sensacional. O negócio foi que o primeiro tinha reais chances de ser indicado - tanto é que ficou entre os 9 filmes na pré-lista dos acadêmicos -, "Tropa 1" já era mais complicado...

    A questão é que finalmente a Academia mudou a regra de selecionar os 5 filmes classificados na categoria Filme Estrangeiro. Não são mais os velhinhos conservadores da Academia que vão dar seus palpites geralmente arbitrários e frear produções mais vigorosas - se fosse assim, jamais que "Dogtooth" seria nomeado esse ano.

    Eu estou otimista e apesar da concorrência parecer fortíssima (Kaurismaki, Yimou, Wenders, Béla Tarr...), Brasil tem plenas chances de ser nomeado com "Tropa de Elite 2". 1) excelente filme e sucesso de bilheteria por aqui e 2) muitos críticos caíram de amores pelo filme, como indica uma visão parcial do Rotten Tomatoes.

    Nunca torci tanto por uma indicação ao Brasil como neste próximo Oscar =D


    abs!

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  2. Ah, não dava para indicar só o Wagner Moura como melhor ator? Não, eu não tô levando nenhum centavo para conduzir essa campanha, rsrsrs

    Os dois filmes que vc sugere que teriam maiores chances, dado o contexto atual, eu ainda não assisti, então não posso falar muito, mas vou ficar feliz "Tropa 2", entrar na lista de indicados - sei que é difícil, mas estou cruzando os dedinhos :P

    Bjs

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  3. Olá, cara :D não sei se lembra de mim, tinha um blog e comentava bastante por aqui. Era o No Mundo Agora. Agora estou de volta com um novo blog e o seu ainda continua na ativa, mt bom ,vou conferir sempre
    Abração!
    http://blogpapodeblogueiro.blogspot.com/

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  4. Perfeito texto! Concordo que a história de "Tropa de Elite 2" faz mais sentido, tem mais ressonância para a gente, porque o longa fala de características típicas da sociedade brasileira.

    Acho que a obra era a melhor mesmo pra nos representar no Oscar 2012 porque é o melhor filme brasileiro lançado no ano passado.

    Porém, acho que partir daí pra uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro é OUTRA história... O filme tem que transpor várias barreiras, a principal é a da violência que é o tema geral do filme. E esse não é um dos temas favoritos da comissão que escolhe esses indicados. Eles preferem a violência estilizada, tratada de forma mais "suave". A violência como a retratada em "Tropa de Elite 2", de forma nua e crua, vai chocá-los.

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  5. Faço coro ao final do seu texto (excelente Insight Reinaldo) Tropa 2 foi um teste “a la Hollywood” feito no Brasil, mas não acho um filme com tamanha proporção para ser Indicado e quiçá vencer Oscar de Melhor Fita Estrangeira?

    Sou da opinião de que o Padilha teve um mau descaramento com a promoção do primeiro Tropa, aliás, já te disse isso uma vez aqui. Isso fez perder pontos comigo, mas ainda acho a obra interessante, densa, ponta firme e Moura excelente em ambos. O segundo é apenas mais comercial e não me convenceu do contrário.

    Brasileiro sonha alto demais meu caro. O inimigo agora é....opa a realidade é outra!

    Abraço
    Rodrigo

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  6. Ótima análise, Reinaldo, mas vou fazer coro a Elton na parte otimista, porque "brasileiro não desiste nunca", hehe. Falando sério, acho que os prognósticos são mesmo esses, mas a Academia tem nos surpreendido muitas vezes e pelo menos dessa vez o Minc agiu certo, mandou seu melhor filme e não o que ele considerou ano passado como o que "tinha mais chances" que foi Lula.

    bjs

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  7. Elton: impressões e gostos a parte, a mudança de regra da academia nessa categoria não foi tão profunda quanto vc faz crer. O colegiado é o mesmo. Acontece que agora são computados apenas os votos daqueles que comprovarem terem visto todos os filmes inscritos na disputa. Isso tira muita gente da bacia e, obviamente, as melhores produções - mesmo que não tenham muito marketing - acabam vingando.
    Abs

    Aline: rsrs. pois é... Mas acho que Wagner Moura tb não tinha chance nessa briga não...
    bjs

    Thiago: Lembro sim cara. Vou lá te prestigiar. Abs

    Kamila: Não sei se vc entendeu exatamente o meu ponto aqui, mas eu não acho que Tropa 2 seja o melhor filme para representar o nosso cinema no Oscar...
    Bjs

    Rodrigo Mendes: rsrs. Bom receber o seu apoio aqui Rodrigo. O filme é ótimo,mas além de não ser superior ao original, não irá suprir a função que o primeiro Tropa deveria ter exercido...
    abs

    Amanda:Não acho que tenha mandado o melhor filme. Acho que a escolha de Tropa 2 mostra como a "indústria" de cinema brasileira ainda é deficitária...
    Mas aí já são outros 500.
    bjs

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  8. Embora não mude o foco do texto, tão pouco modifique a linha de raciocínio desenvolvida, uma pontual correção se faz necessária. Diz respeito ao método de escolha dos candidatos a filme estrangeiro no Oscar. Desde o início da década passada, a academia vem modificando o rito da categoria - ainda que tenha preservado o corpo de seus jurados. A partir de 2011, e tudo indica que o modelo deve se perpetuar, o processo mudou. Um comitê, formado por profissionais de cinema de variadas procedências, é o responsável por apontar os escolhidos. Esse comitê é pequeno e, assim como o constituído pelo Ministério da Cultura para eleger o representante nacional, não deve ser repetido. Aqui está o link de um texto em inglês que o leitor Elton gentilmente indicou: http://www.thewrap.com/awards/column-post/heres-who-put-dogtooth-oscar-shortlist-24129

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