domingo, 28 de agosto de 2011

Insight

Os astros encolheram?

Todo ano é a mesma coisa. As chamadas franchises lucram absurdos, vitaminadas pelo uso indiscriminado e exagerado do 3D, e a soberania das estrelas de cinema é posta à prova. Em épocas de crise financeira e recessão econômica, o panorama é ainda mais alarmante e, desde o solavanco que a economia global levou em 2008, a indústria do cinema tem prestado mais atenção a essa questão em particular.
O ator William Dafoe, que tem no currículo filmes díspares como O paciente inglês (1997), Homem aranha (2002) e Anticristo (2009), disse outro dia que Hollywood se preocupa mais em vender do que em produzir filmes. A fala de Dafoe, além de sintomática da reação dos estúdios às famigeradas crises, permite uma inflexão ainda mais profunda.

Shia LaBeouf corre em cena de Tranformers - o lado oculto da lua: o terceiro filme da franquia, o primeiro em 3D, superou o bilhão de dólares e estimulou o estúdio Paramount a seguir em frente 


Hollywood, como sublinhou o ator, está mais preocupada em garantir que não haja prejuízos do que arriscar o lucro. Passa por aí o lastro cada vez maior de refilmagens e adaptações amontoadas de outras mídias, de HQs a literatura pop juvenil de gosto duvidoso. Mas isso em si, não é problema – pelo menos não para os fins desse artigo. A aposta em filmes que são, antes disso, produtos é válida. É preciso pôr em ação o gigantismo de uma indústria como a do cinema americano e os astros fazem parte disso. O que chama à atenção, e no verão de 2011 isso ficou mais visível, é como os atores tiveram espaço diminuído na própria elaboração dos projetos. Essa constatação remete a outra. De que no alvorecer do século XXI vive-se a era dos personagens, não dos astros. Bobagem. Gente como Brad Pitt, Angelina Jolie, Tom Hanks e Julia Roberts continua a exercer fascínio. Com a consolidação da internet, esse fascínio foi ligeiramente deslocado do cinema – mas não foi esse deslocamento que ocasionou esse hipotético encolhimento dos astros. Foi a estratégia adotada pelos estúdios.
Dois fins de semana são emblemáticos para ilustrar esse debate. O primeiro, o tradicional 4 de julho, teve os lançamentos de Transformers: o lado oculto da lua e Larry Crowne: o amor está de volta. O primeiro filme é uma franquia poderosa que traz a assinatura de Steven Spielberg e mais de U$ 200 milhões de orçamento, o segundo é uma fita independente que marca o retorno de Tom Hanks à direção. Uma comédia sofisticada, veja você, justamente sobre a crise econômica. O primeiro já atingiu, com toda as suas restrições enquanto trabalho artístico, o bilhão de dólares. O segundo, que vem tendo sua estréia constantemente adiada nos cinemas brasileiros, recebeu críticas negativas e desapareceu do Top 10 americano em três semanas.

 Daniel Craig e Harrison Ford na capa que a revista Entertainmet Weekly deu para Cowboys & Aliens: um hype irresistível


Tom Hanks e Julia Roberts atraíram uma audiência na faixa dos 30 a 45 anos aos cinemas para ver Larry Crowne, mas as críticas ruins esvaziaram o interesse pelo filme


O segundo fim de semana é o de 29 de julho. A aventura Cowboys & Aliens venceu por pouco mais U$ 900 mil a batalha contra Os smurfs no box Office americano. Em um fim de semana com altos ganhos de bilheterias, o filme estrelado por Daniel Craig e Harrison Ford faturou U$ 36,431 milhões enquanto que o da turma azul ficou com U$ 35,611 milhões. Embora baseada em uma HQ, Cowboys & Aliens se escora no seu par de astros e derrotou as criaturas em CGI que tinham o respaldo do 3D e uma popularidade prévia muito maior.
Esses recortes apontam para a falta de contexto dos profetas do fim da era das estrelas. Internacionalmente, o apelo de um Hollywood star beira o incomensurável. Não à toa, os festivais de cinema como Berlim, Cannes e Veneza estão cada vez mais repletos da nata Hollywoodiana e os grandes estúdios levam suas estrelas para eventos promocionais em países emergentes como Brasil, México e Rússia.
A estratégia hollywoodiana de privilegiar produtos de outras mídias atingirá um ponto de saturação e esse cenário está mais próximo do que muitos imaginam. Quando isso ocorrer, os astros estarão lá. Incólumes. Prontos para aumentarem seus cachês.

6 comentários:

  1. É perceptível que Hollywood prefere vender, vender e vender muito. A indústria hollywoodiana só é movida à dinheiro. Não tem jeito!

    Esse ano deu uma melhorada, não é? Vários filmes conseguiram "se pagar", algo meio difícil atualmente já que grande maioria parecer nascer fadado ao fracasso.

    Uma pena que este filme de Tom Hanks não foi um sucesso. O filme parecer ser bastante simpático. Como gosto do gênero e Julia Roberts, vou assistir quando for lançado!

    P.s.: Esse seu texto me fez lembrar de um outro escrito por você mesmo, no qual você fez uma boa discussão sobre cinema comercial e cinema "independente"... Não é mesmo?

    Abs ;)

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  2. Reinaldo, você é imbatível nessas reflexões sobre Hollywood. Mas, a vontade de interação com novas - e diferentes - mídias é até mesmo uma estratégia de sobrevivência para Hollywood. Ela precisa disso para continuar atraindo a atenção do público, especialmente dos mais jovens.

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  3. Ótima análise, Rei! ;)
    Pôxa, fiquei meio frustrada de saber que o filme do Tom Hanks tem recebido críticas negativas - sempre tenho altas expectativas quanto ao trabalho dele.

    Beijos

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  4. Alan: Pois é Alan. Essa sempre foi a lógica Hollywoodiana, mas estatísticas comprovam que nos últimos cinco anos, menos filmes foram produzidos e houve uma realocação de prioridades. Em parte devido a crise financeira e em parte por essa pujança que as adaptações e refilmagens apresentam, justamente por já ter uma base de fãs consolidados.

    A estréia de Larry Crowne está agendada para 9 de setembro. É torcer para não ser adiada novamente.

    Boa memória. A seção Insight já abordou variações desse tema em outras oportunidades. Se bem me lembro, o texto que vc alude foi um sobre a vitória do filme independnete Um homem misterioso, estrelado por George Clooney, em seu fds de estréia.

    Abs

    Kamila: Poxa Ka, obrigado pelo elogio. Fico muito feliz por ser essa referência. Valeu mesmo. Bjs

    Aline: Na pior da hipóteses, vale pelo Tom Hanks ator.
    Bjs

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  5. Gostei muito do insight, Reinaldo. Eu estava analisando justamente essa questão dias desses, mas a minha percepção é ainda mais 'grave', digamos, pois são poucos, pouquíssimas estrelas que conseguem atrair público ao cinema. Não digo que o fenômeno star system não existe mais, mas eu respondo a sua pergunta: sim, os astros encolheram. Ao menos, é o que indica os números das bilheterias.

    Jolie, Pitt, Roberts e Hanks que tu cita no texto são astros e estrelas sensacionais, essenciais para o showbiz. Mas não fazem show sozinhos. A influência do marketing é categórico para o sucesso do filme, nem que a reunião de atores seja uma constelação.

    E isso é algo lamentável, pois o que me veem à cabeça agora é Adam Sandler, esse sim, um dos poucos que, sozinho, consegue pagar um filme sendo a MERDA que faz todo ano. Alguns atores estão em ascensão, outros começaram no mainstream, mas versatilizam a carreira (Steve Carell) etc. Mas, na minha avaliação, os astros de hoje não têm tanta voz para comandarem um show sozinho. Precisa dos backing vocals das distribuidoras, sem dúvidas.

    grande abraço!

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  6. Obrigado pela ótima repercussão Elton. Sempre pontual e com uma bagagem analítica que o gabarita. Mas... a conclusão é que os astros não diminuíram não. O que diminuiu foi o espaço que os estúdios concedem a eles -como vc bem colocou o famigerado marketing. O tal do backing vocal.
    Como eu pontuei no artigo, o interesse segue o mesmo, senão maior. Houve sim um deslocamento desse interesse com o advento da internet. Isso, aliado a essa estratégia de investir em personagens e produtos que já contam com "mídia espontânea" arrefeceu o alcance de certas estrelas. Mas o artigo sublinha o relativismo da estratégia dos estúdios e fecha com a conclusão de que a roda gigante vai girar. É claro que não voltaremos a era de ouro de hollywood em que os estúdios fechavam acordos exclusivíssimos com suas estrelas, mas o panorama vai mudar sim...
    Abs

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