segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

OSCAR WATCH - Critica: A fita branca

Um ensaio sobre a gestação do mal


O favorito ao Oscar de filme estrangeiro é um primor de realização. Um filme que é uma tese sociológica, mas não deixa de ser cinema em todo o seu esplendor

O diretor alemão Michael Haneke sempre se dedicou a investigar a combustão da violência e seus entrincheiramentos na sociedade. Pois bem, em seu novo filme, o excepcional A fita branca( Das weisse band – eine deutsche kindergeschichte, Ale/FRA/Áustria 2009) ele redimensiona não só a própria obra como toda a noção que se tem das raízes da violência.
Haneke conta a história de um vilarejo alemão às vésperas da eclosão da primeira guerra mundial. A paz desse vilarejo é balançada com o surgimento de estranhos e misteriosos incidentes que vão desde o acidente sofrido pelo médico do vilarejo até a tortura de uma criança retardada.
O título original, Fita branca- uma história sobre crianças alemãs antecipa um pouco do que veremos na tela. Veremos crianças que agonizam entre o tédio e o autoritarismo e o que Haneke mostra, com rigor narrativo e precisão germânica, é o que essa perigosa combinação pode ocasionar.
Muitos têm dito que o filme é um estudo sobre o nascedouro do nazismo. A afirmação não está de todo errada, mas é imprecisa e simplista. O escopo de Haneke é muito maior. Ele faz um ensaio vigoroso sobre a gestação do mal. Sobre como o absolutismo proveniente de uma educação autoritária, de abusos pontuais e de uma mentalidade abrutalhada pode deformar valores e condutas. Isso não valia apenas para a Alemanha do inicio do século XX. Isso continua valendo tanto na esfera global, regional, quanto familiar.
Haneke realiza seu melhor trabalho. Com a bela e cortante fotografia em preto e branco de Cristian Berger, que desenvolveu um método de iluminação arrojado para o filme (em que sombreia belamente a face dos atores mirins), sem fazer uso de trilha sonora (uma característica que Haneke carrega de filme a filme) e com um excelente elenco (principalmente as crianças), o diretor faz um filme ritmado (alguns o acusam de ser arrastado) e que se contenta nas sugestões. Haneke não se obriga a fornecer respostas nem em apressar a resolução de seu filme para os impacientes. Na verdade o filme não se resolve. O que se contempla em A fita branca ainda prescinde de resolução e quanto a respostas, há muitas possíveis. O espectador ficará com a que menos lhe causa pavor ou a que lhe for mais contundente. Nenhuma, no entanto, lhe será satisfatória.

9 comentários:

  1. Acabei de assitir ao filme, e concordo inteiramente com seu texto. Está aí um filme que com certeza servirá para muita discussão, assim como os anteriores do sempre interessante M. Haneke.

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  2. Obrigado Diego. Que bom te ver aqui novamente. Esses debates em torno de sua obra, são sem dúvida,grandes trunfos do cinema desse grande provocador. ABS

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  3. Haneke também é conhecido por explorar "a fundo" a parte psicológica de seus personagens. Não sei se isso é presente em "A Fita Branca", mas o que me interessa é sua premissa, passada na Primeira Guerra.

    Beijos! ;)

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  4. Não Ma. A psicologia dos personagens não interessa Haneke aqui. Afora as crianças e mais um ou outro personagem, eles não são nem nomeados. São conhecidos como o professor, o médico, a parteira, o barão...
    O que interessa Haneke é desenvolver sua narrativa. Explorar sua idéia. Nesse sentido, os personagens são muletas narrativas. Nada mais. E isso não é demérito nenhum. Não nesse caso. Bjs

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  5. A cada crítica que leio sobre "A Fita Branca", aumenta minha vontade de vê-lo. Parece ser um grande filme!

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  6. Pela última frase, não fiquei muito desejoso de assistir não!! A que menos me causar pavor???

    Hahahahhah

    Abraço Reinaldo...
    Vou decidir se assito!!!

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  7. Ka: É um grande filme. Vale a pena sim. Bjs

    Eri: Pois é Eri, o filme defende um ponto de vista que não é muito cristão, vamos dizer assim. E como o final é um tanto amplo, o espectador pode se desviar da verdade de Haneke. ABS

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  8. Oi Reinaldo, tudo bem? Não assisti ainda, estou pra ver hoje entre ele e o Lobisomen (não sei ainda qual escolherei). Gostei bastante do fragmento "gestão do mal". Soa interessantíssimo! Sobre autoritarismo e tédio, é fascinante pensar como estas duas palavras combinam tanto uma com a outra e se retroalimentam. Receber o autoritarismo em si, em qualquer ambiente social, entedia a vida de qualquer indivíduo e dá espaço a criar monstros caso a pessoa não consiga lidar com este tipo de abuso. Meu senso de liberdade me fará pensar muito em A fita branca. Excelente! gosto de desafios reflexivos. bjs!

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  9. Espero que vc tenha optado por A fita branca. O lobisomem foi uma decepção para mim. Vou postar minha critica do filme hj aqui. A fita branca é um excelente material para reflexão. Isso, posso lhe garantir. Bjs

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