sexta-feira, 28 de junho de 2013

Crítica - Segredos de sangue

Rito de passagem macabro

Chan-Wook Park, de filmes como Oldboy (2003), Lady vingança (2005) e Sede de sangue (2009) é dono de um repertório visual peculiar e de um estilo consagrado em sua celebrada trilogia da vingança. Nessa sua estreia no cinema americano, com Segredos de sangue (Stoker, EUA 2013), o sul-coreano – por meio de uma direção vigorosa e inventiva – remove a banalidade de um roteiro moído em clichês e entrega um filme satisfatório nas divagações estilísticas e temáticas que propõe.
Escrito por Wentworth Miller – ator cujo trabalho mais expressivo foi na série de TV Prison Break – Segredos de sangue é um filme sobre psicopatia, em família, mas psicopatia. Com o olhar e talento de Park, se transforma em uma análise estilizada e imaginativa sobre o rito de passagem de uma garota proveniente de uma família com fortes chagas emocionais à maturidade.
India (Mia Wasikowska) perde seu pai justamente no dia de seu 18º aniversário. Park logo nos demonstra que aquela garota é peculiar, estranha, demasiadamente introspectiva. Refratária a qualquer contato físico, tinha um vínculo mais aprofundado com seu pai (Dermot Mulroney), com quem estabeleceu uma parceria na caça de animais pequenos, e uma atribulada relação silenciosa com sua mãe, Evelyn (Nicole Kidman). É neste dia que toma conhecimento da existência de seu tio Charlie (Matthew Goode), um tipo calado, charmoso e não menos peculiar que India. Logo a estranha dinâmica da família é posta em relevo por Park. India, destratada na escola, sente-se atraída por seu tio. Sexualmente, mas há algo a mais nessa atração que se estabelece fortuitamente em um jogo de poder improvisado entre os dois. A mãe, perdida em sua volatilidade emocional, é outra atraída pela figura de Charlie.

Jogo de perversão: Charlie e India se estudam em um jogo de poder potencializado pelo estilo de Park

Aos poucos, as reais intenções do personagem – em contraposição ao clamor existencial de India – vão ganhando corpo na narrativa engendrada com inventividade por Park. A predileção por planos inusitados, a violência em rompantes surpreendentes, além de uma edição feroz nas fragmentações que faz de eventos paralelos, lembranças e devaneios, são características do cineasta que tornam Segredos de sangue uma experiência muito mais assertiva do que se poderia imaginar.
Não obstante, Mia Wasikowska – atriz que a cada trabalho se firma como um dos pilares da nova geração de atrizes – com sua composição minuciosa da absorta India torna Segredos de sangue um filme muito mais impactante. A atriz bifurca-se muito bem entre o que precisa esconder de sua personagem e o que precisa revelar, beirando o sublime em matéria de contenção e ritmo. É uma atuação inspirada que, realçada pela direção enérgica de Park, faz de Segredos de sangue um filme muito mais interessante do que originalmente ambicionava ser.

3 comentários:

  1. É isso, a história seria tola, mas a direção e as atuações o tornam um filme incrível. Gostei muito do resultado.

    bjs

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  2. Olá meu caro!
    Assisti ao filme Domingo baixado pela internet e com ótima qualidade blu-ray. É sensacional, grande estréia de Chan-Wook Park no ocidente. Ele transforma uma premissa de rotina num filme sensacional. O rito de passagem mais esquisito e visualmente hipnotizante que já vi. O elenco é bom, Mia Wasikowska e Matthew Goode extremamente horripilantes, mas o melhor de tudo é a volta (vamos dizer que desde Reencontrando a Felicidade) de Nicole Kidman. Destaque pontual também para as senhoras Phyllis Somerville (sou fã e comecei a prestar atenção nela desde Pecados Íntimos) e Jacki Weaver.

    Esta coisa de tio Charlie (A Sombra de Uma Dúvida do Hitchcock pode ter sido inspiração) visitando a família repentinamente é sempre um problema!

    Ótimo texto.

    Abs.

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  3. Não sei se incrível, mas certamente muito mais interessante.
    bjs

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