sexta-feira, 7 de maio de 2010

Cantinho do DVD

A seção desta semana destaca um valoroso filme de Clint Eastwood. A conquista da honra (Flag of our fathers, EUA 2006) integra um projeto dos mais ambiciosos que o cinema viu nos últimos anos. Eastwood analisou, entre outras coisas, um mesmo conflito sob duas perspectivas distintas. A do lado vitorioso (os EUA) e a do lado derrotado (o Japão). O primeiro filme ainda é mais portentoso na descontrução que faz da figura do herói. Desanuviando todo o jogo de bastidores e a engenharia propagandista que dão corpo a idéia. Eastwood mostra em A conquista da honra que uma guerra pode ser vencida nos campos de batalha, mas sua definição não poderia estar mais distante dali.


* A critica foi escrita à época do lançamento do filme (semana que vem será publicado neste espaço a critica de Cartas de Iwo Jima)



A desconstrução de um mito!

Clint Eastwood não precisa provar mais nada para ninguém. Talvez só para si mesmo. O ator/diretor realizou, em uma tacada só, dois filmes ambientados na segunda guerra mundial. “Ambientados”, porque embora tenham cenas de combate e seja oficialmente sobre a segunda guerra, não são filmes de guerra. São dramas humanos que investigam os agentes dessas guerras. A conquista da honra (Flag of four fathers, EUA 2006), é sobre a perspectiva americana da batalha de Iwo Jima. Uma das mais sangrentas e importantes travadas entre EUA e Japão na segunda guerra. E Cartas de Iwo Jima é a perspectiva japonesa do mesmo conflito.
Aos 76 anos, o diretor só se envolve em projetos que o motivem a fazer mais do que um filme propriamente dito. “É preciso haver um desafio, um componente humano”, disse Clint em várias ocasiões. Pela primeira vez colaborando com Steven Spielberg, seu produtor, Clint viu esse componente humano na obra “Flag o four fathers” de James Bradley, livro que narrava a vida dos seis soldados que hastearam a bandeira americana na ilha de Iwo Jima. A foto, considerada a mais importante da história, foi de grande valia para os EUA vencerem a guerra. O livro de Bradley também foi importante como um ritual de descoberta de seu pai, que nunca havia falado nada sobre seu passado na guerra.
A conquista da honra é, portanto, um filme que se incumbe de discutir a noção de heroísmo. Um país precisa de heróis. Um país em guerra precisa vencer. O cineasta parte então da famosa foto, que virou peça de propaganda do governo americano em busca de financiamento para a guerra, e discute não só a noção de heroísmo, como também os efeitos avassaladores de uma guerra. A real razão dos soldados estarem lá lutando.
É fácil entender porque o filme não fez tanto sucesso nos EUA. Com o país em guerra, um filme que critica severamente o jogo de bastidores do governo para forjar heróis e evoca que em uma guerra, o patriotismo cede ao companheirismo no peito de um soldado, certamente não está destinado ao sucesso de público e crítica. Justamente por debater tão arduamente um dogma americano, o heroísmo. Os EUA sempre tiveram heróis, precisam deles. De fato, eles venceram a guerra. Heróis fabricados ajudaram a vencer a guerra, mesmo tendo custado suas dignidades e até mesmo suas vidas. É o que atesta Eastwood, dividindo a vergonha dos três protagonistas com o público. O americano não reagiu bem à verdade que emergiu das telas, mas há de se admirar que Eastwood, um republicano ferrenho, tenha tido a coragem de rodar um filme tão atual, tão verdadeiro, tão cru, tão premonitório. Os EUA continuam precisando de heróis. Eastwood é um deles.

2 comentários:

  1. É curioso que num mundo que se diz cada vez mais racional, toda tentativa de desmistificar os ditos "heróis" enfrente ampla rejeição de público e crítica. Fiquei bem curiosa, tentarei ver em breve, rsrs

    beijos

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  2. Aline:Pois é, a hipocrisia dessa nossa sociedade, principalmente do lado de cá do hemisfério é impressionante mesmo! Vale a conferida Aline. bjs

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