terça-feira, 20 de março de 2012

Questões cinematográficas - Meryl Streep e as atrizes que domam o tempo


Depois da conquista do terceiro Oscar parece pertinente falar de Meryl Streep, atriz que favorece diversificados enfoques sobre a arte da interpretação. Considerada por muitos a melhor atriz da história, Streep, aos  62 anos, evidencia um fato até então tomado como raro no cinema: o poder das atrizes veteranas. Há não muito tempo atrás, Nicole Kidman queixou-se, e outras atrizes de mediano talento aventaram lamentos similares, de que Hollywood era ingrato com atrizes acima dos 40 anos. Halle Berry, que ganhou um Oscar com 35 anos, bradou que à medida que uma atriz se aproxima dos 40 anos, mais raros os papéis ficam. Glenn Close, certa vez, fez um diagnóstico mais encorpado. Disse que são melhores os papéis escritos para os homens e que são raros os papéis pensados para atrizes veteranas. Esse “desabafo” ocorreu à época que a atriz debutou em uma série de TV regular (a elogiada Damages). Para Glenn, a tv nadava na contramão do cinema e estaria sendo muito mais generosa com as atrizes veteranas nesse começo de século XXI.

O que Meryl Streep, e a própria Glenn Close, demonstra é que este raciocínio precisa urgentemente ser relativizado. Sim, Hollywood privilegia os atores e propõe papéis masculinos mais intrigantes, desafiadores e envolventes do que o faz para suas atrizes, mas este é um fenômeno, além de perene, concomitante com a oferta de talentos na faixa etária de atores e não é algo que aconteça apenas no cinema americano. Fernanda Montenegro, por exemplo, em suas últimas incursões no cinema não foi agraciada com papéis relevantes dramaticamente. Catherine Deneuve e Isabelle Adjani, musas francesas de outrora, há muito digladiam por alguma relevância artística descolada da nostalgia de suas aparições passadas.
Veteranos em alta: Streep e Christopher Plummer, ambos
vencedores do Oscar em 2012, se cumprimentam 
Meryl Streep, no entanto, reclama para si a vanguarda. Enquanto gente como Nicole Kidman, Meg Ryan e Sandra Bullock se comiseram pela escassez de bom material para atrizes em sua faixa-etária, Meryl Streep não advoga a causa. É inegável que a atriz vive nessa etapa da carreira, seu melhor momento. Nos últimos dez anos, foram cinco indicações ao Oscar e 18 filmes, nos mais variados gêneros, em que foi protagonista de mais da metade deles. Mais impressionante ainda é o fato de que muitos deles se tornaram sucessos de bilheteria indiscutíveis (casos de Simplesmente complicado, Julie & Julia, Mamma mia e O diabo veste Prada) superando os U$ 100 milhões nas bilheterias americanas.
Meryl Streep já goza de unanimidade crítica há algum tempo, mas se descobriu rainha do box Office depois dos 50 anos. Essa condição se deveria mais ao carisma da atriz ou a oferta de bons papéis no mercado? Excelência rima com excelência e Nancy Meyers, roteirista e diretora de Simplesmente complicado, sabia exatamente o perfil de atriz que queria para viver uma mulher que se reinventa na fase madura da vida. Meyers sempre cria personagens femininas fortes para seus filmes e suas heroínas são defendidas por atrizes de talento indiscutível (Kate Winslet, Diane Keaton e Meryl Streep).
Uma rápida olhada na seleção das atrizes postulantes ao Oscar este ano confirma essa teoria. Glenn Close (65 anos) e Viola Davis (47 anos), que competiram com Streep pelo Oscar, já estão na fase veterana da vida e vivem momentos dourados da carreira. Close, por exemplo, foi indicada duplamente ao prêmio do sindicato dos atores em 2012 – por Damages e pelo filme Albert Nobbs. Outras atrizes veteranas estavam bem cotadas para o Oscar, como, por exemplo, Tilda Swinton (51 anos) que é outra a colecionar papéis vistosos no cinema. Quando falta algo que lhe instigue no cinema americano ela participa de projetos europeus; estratégia recentemente utilizada e que fez com que Um sonho de amor, produção italiana recebesse mais destaque na imprensa internacional. A inglesa Kristin Scott Thomas (52 anos) faz uso do mesmo expediente e bate cartão em produções francesas, italianas e inglesas.

Tilda Swinton, Robin Wright e Kristin Scott Thomas: atrizes que buscam desafios no cinema independente ou europeu e mantêm-se artisticamente relevantes


O cinema independente ou a colaboração com cineastas expressivos são estratégias igualmente certeiras que outras atrizes como Helen Mirren (66 anos), Ellen Burstyn (79 anos) e Robin Wright (48 anos) lançam mão.
São atrizes que optam por exercer o controle de suas carreiras da maneira mais ativa possível e não se resignam com os rumos de uma indústria voltada para o lucro e para um público cada vez mais jovem.
Meryl Streep, neste contexto, é mais do que um expoente. É uma religião.  

7 comentários:

  1. É aquela velha história de chorar e não ir atrás do que se quer. De ter que traçar uma estratégia para sair do marasmo do cinema puramente Hollywoodiano.
    Assim como em qualquer outra profissão, acho que tudo depende muito do profissional e de como ele se relaciona com o mercado e os outros profissionais do mesmo. Nesse quesito (como na atuação), Maryl é unanimidade. Linda, serena e forte.

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  2. Com o passar da idade os papéis aparecem para quem tem talento. Como a beleza ficou no passado, sobrevivi no cinema apenas quem provou ser boa atriz ou ator.

    As ótimas atrizes que vc citou são exemplos.

    Abraço

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  3. Fala Reinaldo! Só para vc não esquecer e ter a certeza de que sempre passo por aqui, e de que sempre dou a devida atenção ao seu magnífico trabalho (sim!, eu leio todos os seus textos, apesar de não comentá-los todos como o fazia antes :( ), aqui vai uma correção: o nome e a idade da atriz de "Requièn Para Um Sonho" estão errados. Viu só, como leio raciocinando teus textos?! hehhe
    É isso, grande abraço!
    Não me canso de passar por aqui! ;)
    P.S. (Não poderia deixar de causar polêmica! hehehe): A última vez que discordei de vc, foi quando li a crítica de John Carter. Pois eu odiei completamente aquele filme e, pela segunda vez na vida, percebi que todos os presentes no cinema (isso é demais raro!) compartilhavam comigo o mesmo sentimento. De qualquer forma, eu estava por demais extasiado após 12h de plantão... E, por isso, não tenho certeza se o filme era ruim de verdade. uahuauhau

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  4. Poxa, Reinaldo. GRANDE texto!!! Eu acho que você foi certeiro na sua análise, não só da Meryl Streep, como também das outras atrizes citadas, como Glenn Close, Kristin Scott Thomas e Tilda Swinton. Em comum entre elas, além do talento, é que elas possuem uma capacidade de adaptação enorme e souberam encontrar caminhos diversos no mercado, mantendo ainda os seus nomes em evidência.

    A Meryl, pra mim, é a maior atriz da história. A maior atriz que eu já vi atuar. O que eu mais gosto nela, talvez, é que ela não se deixa afetar por todas as glórias e reconhecimentos que ela já conquistou. Ela está sempre se desafiando, sempre tentando fazer coisas diferentes e se reinventando. Adoro isso nela.

    Beijos!

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  5. Patrícia Ströher: E disse tudo!
    Bjs

    Hugo: E disse tudo (2)!
    Abs

    Cássio Bezerra: Grande Cássio! Prazer imenso em ler o seu comentário.Fico feliz de saber que bate ponto aqui em Claquete e, mais ainda, em constatar que continua apreciando os textos e a abordagem do blog.
    Quanto a Burstyn, é verdade. Movi o "s" de lugar. Obrigado pelo toque. Quanto a idade, lamento é informar que é essa mesma. A atriz é de 1932. Conservada, é verdade, mas quase octogenária.
    Quanto a "John Carter", confesso minha inquietação. Quem gostou do filme discordou de minha crítica e que desgostou, como vc, tb discordou. Em linhas gerais posso dizer que se minha crítica não reprova inteiramente John Carter - porque realmente acho que não seria o caso - tem forte inclinação negativa. Se trata de um filme de muitas ambições e poucas conquistas. Deixemos assim.
    Aquele abraço!

    Kamila: Compartilhamos dessa grande admiração pela Meryl Ka. Obrigado pelos elogios e pelo comentário.
    Bjs

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  6. Excetuando minha total devoção por Meryl, acho que o Oscar dela, em 2012, foi um verdadeiro marco. Existe algo de muito especial nessa consagração: afirma que um ator pode sim voltar a ter momentos de glória, mesmo após anos desde vitórias anteriores. A Academia deveria pensar sempre assim: o que vale é o melhor desempenho, não a política. E a Meryl, após anos mostrando que sobreviveu e, principalmente, se reinventou com o tempo, já merecia esse reconhecimento faz horas. Poucos atores conseguem ter uma trajetória como a dela.

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  7. Matheus: Acho que o Oscar foi justo pela contribuição de Meryl ao cinema e pela excepcional regularidade que ela tem apresentado. São trabalhos primorosos sequenciados em um nível que poucas atrizes apresentam. Era preciso distingui-la. Agora, discordo que era o melhor desempenho do ano. Entre as indicadas, para mim, ela só estava a frente de Michelle.
    Abs

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