Um filme vip!
O primeiro filme de Toniko Melo, baseado no livro Vips –histórias reais de um mentiroso da jornalista Mariana Caltabiano, recria a trajetória de Marcelo Nascimento Rocha – falsário que ganhou fama nacional após passar-se pelo empresário Henrique Constantino, um dos filhos do dono da empresa aérea Gol. Vips (Brasil, EUA 2011) não é exatamente uma biografia dessa figura, ainda que se esmere na reconstituição de alguns eventos reais. É um imaginativo retrato de um homem em busca de identidade. Melo e os roteiristas Bráulio Mantovani e Thiago Dottori se interessam por desvendar um personagem que impressionava tanto pela habilidade de dissimular, como pelo despeito de levar suas simulações às últimas consequências. E bolam ótimas metáforas para fazer da experiência de se assistir Vips mais prazerosa. Referências a peixes e touradas (visuais ou verbais) se ajustam à via dramática cruzada pelo personagem de Wagner Moura no filme. Tudo com muita eficiência. A busca pela identidade é algo que fica muito claro na composição de Moura, aquele tipo de ator que ajuda a construir o sentido de um filme.
Wagner Moura na pele de Marcelo: farsante em busca da própria verdade
O elaborado estudo de personagem não evita a romantização da figura de Marcelo. Aí se encontra uma influência forte do cinema americano dos anos 70 e, mais intimamente, com o praticado na década anterior no Brasil (O bandido da luz vermelha de Rogério Zganzerla é uma referência óbvia). Surgiu nesse período a necessidade quase orgânica do cinema nacional purificar personagens de moral desviada. A essa tentação, Vips resiste. Nesse sentido, o filme guarda muitas semelhanças com um dos melhores Spielberg dos últimos anos, Prenda-me se for capaz. A dramaturgia de Vips e o coração de Marcelo (sua relação com o pai, a adoração pelo ofício de pilotar, entre outros) remetem diretamente ao filme estrelado por Leonardo DiCaprio.
O que Toniko Melo busca com seu filme é mimetizar a força de um homem que, a sua maneira, foi importante. Criando realidades e apossando-se de outras, como aponta a genial cena final, o Marcelo de Toniko Melo e Wagner Moura foi o alguém que sua mãe (Gisele Fróes), a cabeleireira com recortes de celebridades no espelho, sonhou. E foi além. Convenceu muita gente de que era muitos alguéns. É tão triste quanto especial. É essa beleza envergonhada que Vips anuncia com a devida percepção.