terça-feira, 22 de novembro de 2011

Claquete repercute - Tudo sobre minha mãe

É no mínimo curioso revisitar Tudo sobre minha mãe (Todo sobre mi madre, ESP 1999) após assistir A pele que habito. Voltar ao filme mais premiado de Almodóvar e aquele que finalmente lhe valeu consagração internacional permite uma perspectiva arrojada da capacidade de reinvenção do cineasta espanhol e de sua incrível força criativa. Mais acachapante, ainda, é a constatação de como Almodóvar preserva a essência de sua obra diagramada no trânsito de gêneros que realizou desde Tudo sobre minha mãe até A pele que habito.
Talvez seja interessante inventariar os prêmios conquistados por essa película de 1999; uma das poucas do espanhol a produzir consenso crítico na ocasião do lançamento.
O Oscar de melhor filme estrangeiro salta à vista. Mas Tudo sobre minha mãe também recebeu o prêmio de direção em Cannes, os Bafta de melhor filme estrangeiro e direção, os prêmios de filme, direção e atriz no European Film Awards, o globo de ouro de melhor filme estrangeiro, entre outras premiações de sindicatos e associações de críticos.
A trama sintetiza toda a fauna almodovariana. Cores vibrantes, arquétipos femininos bem delineados e sombras das figuras masculinas, o transexualismo como elemento de libertação, as referências cinematográficas (embutidas até mesmo no título, como brinca Almodóvar na abertura de seu filme), entre outras coisas.
O brilho das mulheres de Almodóvar: Cecília Roth e Penelope Cruz em performances cheias de coração e carinho


Enfermeira, após um acidente fatal que vitima seu filho, viaja de Madri a Barcelona em busca do pai do rapaz, um travesti chamado Lola, de quem não tem notícias desde que partiu fugida daquela cidade. A jornada de Manuela, uma inspirada Cecília Roth, será de cura interna e externa. Do contato que busca com a atriz Huma Rojo (Marisa Paredes), a quem o filho admirava, serão catalisadas benesses para ambas as partes. Nessa equação também está Rosa (Penelope Cruz), uma freira com jeito de menina que deixou-se engravidar pela mesma Lola que Manuela procura. As fronteiras emocionais dessas três mulheres se confundem e Almodóvar, talvez em seu filme mais solar, demonstra todo o seu apreço pelo feminino. São personagens fortes, irrefreáveis, transbordantes em sentimento materno e revestidas de humanidade e solidariedade que parecem faltar aos personagens masculinos. Em um dado momento, o travesti Agrado (Antonia San Juan) indaga, e o close de Almodóvar sugere que a pergunta se dirige na verdade ao público e não a Manuela, como alguém com seios poderia ser tão machista – em uma referência a Lola.
Mas a graça de Tudo sobre minha mãe, definitivamente o melodrama que patenteou de uma vez por todas o estilo de filmar de Almodóvar, está mais na concepção desse universo poeticamente surreal do que na singela busca por alguma paz da personagem central.   

A beleza também pode estar no absurdo, sugere o diretor. Como o homem transformado em mulher que mantém um comportamento associado ao pior tipo de homem, mas é capaz de seduzir uma jovem freira. Ou na enfermeira que tem uma nova chance de ser mãe, mesmo sem conceber, e a criança sendo do mesmo pai. O que dizer da representatividade da ficção em nossas vidas? Questionamento tão bem acampado pelo sentido que Almodóvar dá à peça Um bonde chamado desejo na trama.
As sutilezas de Almodóvar apaixonam em Tudo sobre minha mãe. Não à toa, o cineasta abandonou –ainda que temporariamente – a alma feminina e foi falar do homem em Fale com ela. Com o consenso crítico gerado por Tudo sobre minha mãe, o espanhol teria alcançado o nirvana de seu cinema. Foi revisar a si mesmo nos filmes da década passada.
Tudo sobre minha mãe continua sendo o mar vermelho do cinema almodovariano. E a travessia foi mais do que bem sucedida. 

7 comentários:

  1. Realmente, é o melhor filme do diretor. Aquela cena do acidente é incrível e emocionante!

    Só fui conferir por esses dias!

    Abs.

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  2. Para mim, "Tudo sobre Minha Mãe" é a obra prima de Almodóvar. Um filme primoroso, em todos os sentidos e que manterá sua força por MUITO tempo! Beijos!

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  3. Alan: Não saberia dizer se é o melhor de Almodóvar, mas certamente o colocaria no top 5.
    Abs

    Kamila: São muitas obras primas aí para medir Ka. rsrs
    Bjs

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  4. Acabei de ver o filme (depois da indicação do blog) e ainda estou extremamente emocionado. O filme é de uma delicadeza, de uma beleza, de uma verdade...
    Enfim, ainda estou extasiado!

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  5. Daniel Henrique: Fico feliz pela deferência e credibilidade Daniel. Mais feliz ainda por você ter conhecido e gostado desse filme.
    Grande abraço!

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  6. Já abusando... te faço um desafio: TOP 5 filmes de Almodóvar.
    Que tal?
    rs

    Abraço!

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  7. É mesmo um desafio Daniel! rsrs

    Assim sem pensar muito, declino estes cinco:
    5- Tudo sobre minha mãe
    4- Ata-me
    3 - A lei do desejo
    2- Carne trêmula
    1- Labirinto de paixões/ A flor do meu segredo

    Olha... mas é difícil viu! rsrs
    Abs

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