terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Crítica - Bravura indômita

Beleza indomável


Não é a toa que o novo filme dos irmãos Coen ostenta dez indicações ao Oscar 2011, incluindo filme, direção, ator e roteiro adaptado. Bravura indômita (True grit, EUA 2010) remake do filme homônimo de 1969, dirigido por Henry Hathaway é de uma beleza e ressonância ímpares. Os Coen argumentam que seu filme é mais uma adaptação do livro de Charles Portis do que uma refilmagem da obra que deu o único Oscar a John Wayne. Há verdade na afirmação dos cineastas. O novo Bravura indômita além de ser mais soturno e ambíguo do que o primeiro filme, prima por diálogos ácidos e personagens de comportamento irascível. Algo identificável dentro da filmografia dos Coen. Talvez o autor Portis estivesse esperando ser traduzido para o cinema pelos Coen. A fidelidade ao livro é pressuposta. Tudo em Bravura indômita transpira minimalismo. Desde a caracterização do beberrão Rooster Cogburn por Jeff Bridges – que transita com sobriedade entre a caricatura e a verticalização do personagem – até a bela fotografia de Roger Deakins que propicia ao filme dos Coen daqueles momentos de contemplação de rara beleza.


Western puro sangue: Jeff Bridges e Matt Damon brilham no maior sucesso comercial da carreira dos irmãos Coen


A beleza de Bravura indômita, no entanto, não está restrita ao vistoso trabalho de Deakins, merecidamente indicado ao Oscar. Os Coen realizam um western clássico. Reverente. Em última instância, revitalizado. Diferentemente do austero e revisionista Onde os fracos não têm vez, Bravura indômita honra as tradições de um gênero em abusivo descaso. O filme dos Coen, embora recalcado pela contemporaneidade do registro, é um nostálgico exercício de cinefilia. Dos tempos em que o cinema americano autoral se valia da mise-en-scène dos filmes de bang bang para discorrer sobre valores morais e o estado das coisas no mundo. A preocupação dos Coen ao não refratar a violência (que surge sempre de forma inesperada e abrupta) do filme era reafirmar o gênero como propulsor da estética em que a violência viabiliza a arte. Tarantino (e seu Bastardos inglórios) é um dos que admite a influência direta desse modo de se fazer cinema.
A história de uma menina que busca justiça (ou seria vingança?) para seu pai, de um homem que se orgulha de poder confiscar bebidas e que ganha sentido novamente ao ser o depositário das esperanças dessa decidida menina de 14 anos é uma parábola das mais vigorosas sobre obstinação. Não deixa de ser uma aventura idílica também; reforçada pelo final de profunda ressonância dramática e beleza perene. Bravura indômita inscreve-se, portanto, como um filme de beleza indomável que vem proporcionar sobrevida a um gênero que andava um tanto esquecido, mas que os Coen demonstram ainda ser capaz de arrebatar multidões.

9 comentários:

  1. Como não sou a maior fã de westerns, acho que meu gosto pessoal ficou comprometido ao assistir "Bravura Indômita". Para mim, o filme só se tornou interessante no terceiro - e lindo - ato. Espero ver Hailee Steinfeld e Roger Deakins conquistando merecidos Oscars...

    ResponderExcluir
  2. Eu também gostei bastante do filme, como você achei um bom resgate ao gênero, da forma peculiar dos Coen. Tanto que acho que irei rever amanhã. Hailee Steinfeld já se tornou a minha favorita ao Oscar desde ver sua impressionante atuação.

    bjs

    ResponderExcluir
  3. Por ser fã dos dos westerns clássicos, achei que nesse filme faltou fôlego em alguns momentos. A beleza da fita é inegável, mas possui algumas partes sem ritmo e desnecessárias (se é que podemos chamar assim a cena de tiro ao alvo com comida). A partir da metade do filme, só a menina está focada no objetivo de capturar o assassino, por isso tanto destaque para Hailee Steinfeld na atuação. A protagonista da história na verdade é ELA.

    :: João Linno ::

    www.cinemosaico.com

    ResponderExcluir
  4. Muito bom o texto, Reinaldo. Olhar subjetivo muito certeiro e bem argumentado sobre a nova obra dos Coen. Porém, eu não reparto da mesma visão que a sua, pois fiquei bem decepcionando com essa releitura do western desses cineastas que admiro tanto. Não senti a pegada deles, achei pouco ousado, acho que faltou muito até para se estabelecer como um faroeste de fato.

    Não chego a dizer que o Velho Oeste é mera decoração para a história, não, porque reconheço que o filme tem espírito, mas eu não fui sugado por ele. Durante a sessão, predominou a indiferença da minha parte - e isso era o que menos esperaria vindo de um filme dos Coen...

    Boas atuações, achei o roteiro deficiente em vários aspectos, e concordamos em ressaltar o trabalho de Roger Deakins, a plasticidade, a contemplação... o filme ganha vida com sua fotografia impecável. Seria um Oscar merecidíssimo! Fora isso - e talvez Edição de Som - não premiaria mais nada entre as 10 nomeações que recebeu.


    abraço!

    ResponderExcluir
  5. Texto empolgante Reinaldo!
    Só me deixa com mais vontade e afirma a certeza de que o filme é uma obra espetacular.

    No final de semana estou no cinema.
    Abs.
    Rodrigo

    ResponderExcluir
  6. Kamila: Uma das funções do crítico é não permitir que seu gosto pessoal interfira (demais) na apreciação da obra. É mais nobre,ainda, reconhecer os limites de tal atitude... bjs

    Amanda: não acho que Hailee seja a melhor. Mas ela está melhor que a favorita... bjs

    Elton: Conforme já pontuei contigo, acho que os Coen se saíram muito bem da arapuca que é recriar Bravura indômita. não desmereceram o filme de 69, honraram brilhantemente o livro de Portis e revestiram o filme de algumas sutilezas que lhe são características... abs

    Rodrigo: Não diria que é espetacular, mas é um ótimo filme. Vc vai gostar. Mas precisa gostar de Western para apreciar esse filme... diferentemente do que ocorria com Onde os fracos não têm vez.
    Abs
    Cine mosaico: Pois a cena do tiro ao alvo é um pequeno Macguffin inerente a todo western clássico... Pena que vc não achou a altura dos clássicos que cultua. Abs

    Elton:

    ResponderExcluir
  7. eu esperava mais, mas ainda assim achei o filme incrível! muito engraçado!

    http://filme-do-dia.blogspot.com/

    ResponderExcluir
  8. Ótimo texto, Reinaldo. Eu não esperava muito do filme, pois não sou adepto dos irmãos Coen - e não é que apreciei? Um absurdo Hailee Steinfeld ser indicada a coadjuvante, a Academia parece testar nossa inteligência (ou seria paciencia?), né mesmo? Mas, já que concorre a coadjuvante, ela é a preferida. Ao meu ver, ela é bem melhor que Melissa Leo que, apesar de ótima no "O Vencedor", não acho que mereça Oscar algum.

    "Bravura Indômita" só não é perfeito como "Cisne Negro" ou tão original quanto "A Origem", mas tem seu grande valor, desde já.

    Abraço

    ResponderExcluir
  9. Kahlil: Que bom que gostou. O problema em tratando-se dos Coen é que sempre esperamos mais deles não é?! rsrs
    Abs

    Cristiano: Pois é a academia comprou o mote dos estrategistas do Oscar que a queriam onde ela teria mais chances de vitória. E não é que ela já passou Melissa Leo nas bolsas de apostas de Londres?
    Aquele abraço!

    ResponderExcluir