quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Crítica - Melancolia

Mal estar da alma!


Melancolia no dicionário é tristeza sem causa, por vezes acompanhada de uma saudade difusa. Um distúrbio emocional caracterizado por um estado de abatimento mental.
Melancolia (Melancholia, Dinamarca/França/Suécia/Alemanha 2011), a nova fita de Lars Von Trier, começa com um prólogo que se pretende, em sua plasticidade, uma obra de arte à parte do filme e, paradoxalmente, um complemento ao próprio filme. De beleza estarrecedora, o conjunto de imagens em slow motion que Von Trier apresenta à platéia vai ganhando significado à medida que o filme vai se resolvendo, e a beleza se transmuta em simbologia. Algo que o próprio filme pretende ser: um emaranhado de simbologias e metáforas. Desde a mais óbvia, o planeta que surge como ameaça à Terra e o estado de espírito da protagonista compartilharem o mesmo nome, até as mais inerentes – como o fato do cavalo de Justine (Kirsten Dunst), tal qual sua dona, não conseguir ultrapassar uma barreira.
Lars Von Trier é um cineasta semiótico. Seu interesse em significantes e significados extravasa os limites do cinema, mas nem por isso Von Trier se limita em termos de linguagem e narrativa. Melancolia é divido em duas partes. Na primeira, intitulada Justine, percebemos ecos do movimento que o diretor ajudou a criar, (Dogma 95), mas que de certa forma abandonou. A câmara trepidante acompanha os principais elementos e personagens de um casamento realizado em um castelo. Quando pousamos os olhos em Justine ela parece feliz. Mas essa impressão vai se dissipando à medida que a noite avança e sua irmã, a contida Claire (Charlotte Gainsbourg), a questiona se está tudo bem. Von Trier conta com a capacidade de ilações de seu público para mostrar que Justine é uma moça de profundo caos emocional que, na iminência do casamento, está a despedaçar-se. A investigação que Von Trier oferece é meramente subjetiva e sugestiva. O pai (John Hurt), que só vê Bettys à sua volta, e a mãe (a sempre poderosa e altiva Charlotte Rampling), castradora e infeliz, com sua metralhadora verbal, insinuam um ambiente familiar em pedaços. A irmã Claire e o marido John (um contido Kiefer Sutherland) tentam manter as aparências, enquanto tudo o mais parece ruir. A primeira parte de Melancolia, que marca em escala gradativa a manifestação desse sentimento em Justine, tem pelo menos uma grande cena. Quando Justine se justifica para sua cada vez mais inquieta irmã e diz que as reclamações que começam a surgir são ilegítimas, pois ela está sorrindo.

Plasticidade e fúria: Ao som de Wagner, Von Trier constrói sua ópera sobre o fim do mundo e o ocaso da humanidade


Mas é no segundo tomo de Melancolia, intitulado Claire, que Von Trier alcança os agudos de sua obra. Quando foca em Claire, o cineasta consegue-através do contraste cada vez mais flagrante entre as irmãs – tecer alguns prodigiosos comentários sobre diferentes percepções de mundo. É instigante perceber como Justine passa a ter uma postura mais serena em face da morte iminente e Claire se desespera. O paralelo é saboroso. Uma irmã se desespera ante à vida e outra com a inevitabilidade da morte.
A ansiosa Claire se depara com duas visões de mundo. A científica, encarnada pelo marido John, e a metafísica na figura da irmã Justine. A proximidade do planeta Melancolia faz com que Melancolia, o filme, se revista de melancolia na iminência do desfecho mais cruel e pessimista que poderia se avizinhar. Nesse aspecto, Von Trier consegue fazer com que seu público se aproxime ainda mais do que vivenciam Claire e Justine. O mal estar da alma, coisa que todo ser humano apresenta com frequência bem particular, se manifesta quando a luz varre, pela última vez, a tela do cinema.

7 comentários:

  1. Eita que maravilha! Rapaz, ainda não vi o filme, estou com horários completamente bagunçados... Quero ver o mais rápido possível!

    ResponderExcluir
  2. Maravilhosa crítica que me aguçou ainda mais a curiosidade. Pela Kirsten Dunst e por uma obra inquietante de um polêmico diretor, claro que vou no cinema conferir.

    Abs.
    Rodrigo

    *Acho que Lars nunca foi fiel ao Dogma 95 né? Rs!

    ResponderExcluir
  3. Realmente, ótima crítica Reinaldo!! Me deixou mais ansioso para conferir logo o filme...

    ResponderExcluir
  4. Ainda não vi, mas Charlotte me aguarde. Ela é incrível.

    O Falcão Maltês

    ResponderExcluir
  5. Wow, se superou aqui, meu caro! Excelente crítica, meus parabéns!

    De von Trier, espero tudo. O foda é esperar o cinema da província onde moro exibir o filme rs. Expectômetro a mil!


    abs!

    ResponderExcluir
  6. "Lars Von Trier é um cineasta semiótico." Perfeita definição, Reinaldo. E uma ótima crítica mesmo.


    bjs

    ResponderExcluir
  7. Luiz Santiago: Acho que vc vai gostar meu caro. Abs

    Rodrigo Mendes: Valeu meu brother.Acho que vc vai gostar. Quanto a Kirsten, ela está muito bem. Como vc já é fanzoca, vai delirar.rsrs. Mas acho que a Palma pode ter sido exagerada. Não à toa, a crítica preferia Tilda Swinton por We need to talk about kevin.
    Já abordei essa "hipocresia" de Von Trier em artigo publicado na seção Insight. Ele criou um movimento que nunca abraçou. Talvez Os idiotas seja o mais adequado ao Dogma 95.
    Abs

    Alan: Vc vai gostar! You´ll see!
    Abs

    Antônio Nahd Júnior:De fato, do elenco ela é quem mais impressiona.
    Abs

    Elton: Obrigado Elton. Valeu mesmo. Espero que os exibidores de Maringá se compadecam de vc.rsrs.
    Abs

    Amanda:Obrigado Amanda.
    Bjao

    ResponderExcluir