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quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Crítica - Robocop

Blockbuster com tutano; talvez até demais

José Padilha fez o filme que quis fazer e fez um filme que quem quer que tenha assistido aos dois Tropa de elite reconhece sua assinatura em Robocop (EUA 2014). O que mais chama a atenção e conta pontos a favor do cineasta brasileiro nessa sua promissora e elogiável estreia no cinema americano é que ele não se intimidou ante a expectativa de refilmar um clássico oitentista tão venerado por fãs e crítica como o é Robocop. Ao invés de tornar-se refém da versão de Verhoeven, Padilha fez um filme com pensamento próprio e ambições calibradas em sua filmografia.
A começar pela valorização do debate entre homem e máquina. O homem é capaz de suplantar a máquina? Ao trazer o elemento familiar para um dos principais eixos da narrativa, Padilha subverte a lógica estabelecida pelo primeiro filme e adiciona mais um elemento de combustão em seu filme. Mas o traço político é o que mais interessa o diretor. Michael Keaton faz Raymond Sellers, uma espécie de Steve Jobs do mal. A definição talvez seja vã, mas é Padilha quem força a comparação ao vestir o personagem como Jobs e até mesmo colocar uma das frases mais famosas do pai da Apple na boca do presidente da OmniCorp: “As pessoas não sabem o que querem até que alguém mostre a elas”.
Sellers é o principal fornecedor de drones e robôs para o exército americano e tenta a todo custo derrubar uma lei que proíbe o uso de máquinas em solo americano. A direita ultraconservadora americana, representada pelo jornalista Pat Novak (Samuel L. Jackson), apoia a visão de Sellers de que nenhum policial precisa morrer para manter as ruas das cidades americanas seguras.
Quando Robocop começa, a opinião pública é majoritariamente contrária à ideia de robôs atuando nas ruas americanas, mas Sellers tem uma brilhante ideia. Colocar um homem dentro da máquina. Produzir um “faz de conta” robusto e cativar o público. Ganhar a opinião pública. É aí que entra Alex Murphy (Joel Kinnaman), detetive honesto que depois de sofrer um atentado fica à beira da morte. Sua mulher (Abbie Cornish) aprova que ele faça parte do programa pioneiro oferecido pela OmniCorp.  

O Robocop em ação... 

... e Michael Keaton, de volta à boa forma, como a melhor coisa do filme

José Padilha não está mais interessado na ação do que em escrutinar o jogo político que se ergue por trás da existência do Robocop e é desse desbravamento que Robocop se ocupa em sua maior parte. O diretor brasileiro não estava brincando quando disse que iria fazer um filme que discutisse o uso de drones. Robocop vai fundo na discussão, mas peca justamente por não oferecer um ponto de vista mais lapidado. A direita, embora caricata, não surge vilanizada no filme e o vilão de Keaton (o grande atrativo do filme em conjunto com Jackson) é mais acinzentado do que os anos 80 permitiriam ser.
A família de Murphy também parece logo deixada de lado pela narrativa, como se fosse um apêndice necessário apenas para estabelecer o conflito entre homem e máquina que caracteriza uma das muitas diferenças entre o Robocop de Padilha e o de Verhoeven.
Outro problema do filme é a falta de catarse. Mesmo quando Robocop “se vinga” do responsável pelo atentado a Murphy, tudo parece mecanizado demais. Talvez tenha sido uma opção de Padilha para realçar essa automatização da violência, mas o filme carece de violência – uma contingência de mercado – o que acaba por esvaziar de sentido essa alternativa.
A discussão proposta pelo diretor, no entanto, não se perde ou anula. Robocop é um blockbuster com o louvável desejo de querer fazer a audiência pensar. Padilha fez um filme que repete em muitos aspectos a estrutura do segundo Tropa de elite, mas sem o ranço pedagógico que impregnou no filme em questão. Ele deixa com o público a competência de julgar e fecha seu filme com uma provocação à América.
A prolixidade de Robocop talvez seja a razão da divisão que o filme incitou na crítica, mas é inegável - gostando do resultado obtido por Padilha ou não - que se trata de um filme de personalidade, descaradamente atual e, ainda que com menos humor, tão provocador quanto o filme original.

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