Um novo olhar
Filmes que abordam o impacto de um ambiente familiar
desestruturado em uma criança existem em quantidade considerável, mas o olhar
que Pelos olhos de Maisie (What Maisie knew, EUA 2012) propõe foi muito pouco
experimentado pelo cinema. Adaptado do romance de Henry James, o filme de Scott
McGehee e David Siegel empresta de sua matriz literária a sutileza na
arquitetura do registro e a calma na condução da narrativa.
Susanna (Julianne Moore) é uma mulher que parece entorpecida
pela existência. Sem muita segurança emocional afasta-se da filha Maisie à
medida que a liberdade propiciada pelo divórcio do pai da menina, Beale (Steve
Coogan), lhe dá essa abertura. Tampouco o pai parece comprometido com a ideia
de fazer da filha uma prioridade. Mas essa conclusão, o espectador terá que
peneirar porque um dos acertos desse belo filme independente americano é montar
sua história toda na perspectiva de Maisie (a impressionante Onata Aprile), a
dócil, esperta e cativante filha que padece da indisponibilidade emocional de
seus pais. Aos poucos ela vai se ambientando com a presença e o carinho de
Margo (Joanna Vanderham), sua babá que passa a ser sua madrasta, e Lincoln
(Alexander Skarsgard), um bartender camarada com quem sua mãe se casa na
expectativa de reaver judicialmente a guarda da menina.
A dramaturgia de Pelos olhos de Maisie se ergue toda na
órbita da observação da menina do mundo ao seu redor. Do receio de Margo e
Lincoln até a total entrega a esses dois estranhos que se apresentam mais
interessados nela do que seus próprios pais.
O filme, contudo, evita maiores julgamentos. Em momento
algum, Susanna, outro belo trabalho de Moore, e Beale são apresentados como
figuras desviadas ou defenestráveis. O julgamento é todo do espectador. O filme
se limita a divagar a respeito de nossas indisponibilidades. De como nos
distanciamos daquilo que desejamos e de quem imaginamos ser. A docilidade de
Maisie contrasta com a negligência que a vitima quando da separação litigiosa
de seus pais e ela encontra abrigo emocional onde menos se espera. Essa
capacidade do ser humano de renunciar à paternidade, e às responsabilidades,
encontra analogia inversamente proporcional na capacidade do ser humano de
abraçar a paternidade, e as responsabilidades, em face da necessidade
litigante.
É esse o grande achado de Pelos olhos de Maisie. Filtrar o
amor da dor. A esperança do desamparo em uma pequena crônica familiar sensível
ao que o ser humano tem de mais egoísta, mas também ao que tem de mais
encantador. Pelos olhos de Maisie é, enfim, um filme suscetível a emoção. Do
público e de seus personagens.
Esse filme parece ter passado completamente despercebido, mas me parece uma obra tão simpática, do pouco que tenho lido sobre o longa.
ResponderExcluirOlá Reinaldo. Faço coro a Kamila quanto ao filme. Curioso. Procurar conferi-lo. Desculpe a minha ausência, mas estou numa fase desanimada de blog. Espero ter mais ânimo e retornar com novas postagens.
ResponderExcluirProcurei ler seus posts anteriores. Adorei o Oscar Watch e a matéria sobre o DiCpario. O que foi aquela atuação em "O Lobo de Wall Streett"? Sensacional. E Scorsese chutando bundas.
Estou conferindo os filmes desta temporada Oscar. Além de "Lobo", ontem pude assistir "Ela". Genial. Spike Jonze voltando com tudo e acho que Phoenix tb foi esnobado. Vou continuar com "12 Anos de Escravidão"... já vi tb "Álbum de Família" que só ganha pelo seu maravilhoso elenco.
Parabéns pelas matérias!
Abração.
Kamila: É simpático sim Ka. Diria que é até um pouco mais do que simpático.
ResponderExcluirBjs
Rodrigo: Ô meu amigo e eu bem sei como é esse desânimo que bate de frente e sem dó. Obrigado pelos elogios, pela consideração de continuar vindo aqui em face desse desencanto. Espero que retome seu fôlego blogueiro logo, porque sei, e me conforta seu depoimento atestando isso, que a paixão pelo cinema sege irretocável. Nós cinéfilos somos, graças a Deus, irreparáveis e irrepreensíveis nesse tópico. E ainda temos Scorsese chutando bundas para nos animar.
Aquele abraço!
Nossa, fiquei com vontade de ver agora que li sua resenha, mas, para não perder o costume, vou procurar ler o livro primeiro, rsrsrs Depois vou ver se lembro se vir aqui dar meus pitacos ;)
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