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quinta-feira, 4 de julho de 2013

Espaço Claquete - Trair é uma arte

Em primeiro lugar é preciso relevar o péssimo título nacional. Trair é uma arte (Boogie Woogie, ING 2009) tenta fazer trocadilho com duas vertentes do filme: a traição e o mundo da arte. O título original é muito mais feliz ao fiar-se na obra que move um dos arcos da trama – um quadro de valor inestimável que pertence a um homem à beira da morte (Christopher Lee) que o comprou do próprio artista e que é assediado pelo principal galerista de Londres (Danny Huston) para vendê-lo.
Trair é uma arte é comédia muito mais lisérgica e muito menos escandalosa do que o nome sugere. O filme de Duncan Ward, baseado no livro de Danny Moyninhan – que também assina o roteiro – é uma análise, por vezes muito feliz, do mundinho da arte. De seus clichês – e os clichês são repercutidos com o devido cinismo inglês – e de seus meandros.
O filme congrega os mais variados tipos que integram a cena da alta arte. Do galerista prepotente homossexual que defende uma heterossexualidade agressiva inexistente ao colecionador cheio de compulsões que rivaliza anonimamente com ele. A diretora da galeria moderninha com ambições maiores do que colocar silicone nos seios, a harmonia entre a cena gay e a pop arte, a quarentona consumista que se ressente do universo no qual está inserida, mas não da luxúria que ele enseja e por aí vai.
Há bons momentos no filme de Ward e o diretor, para alguém tão pouco experimentado no ofício, equilibra muito bem as tramas de sua narrativa multifacetada. O sexo, e as traições, surgem como um elemento de barganha, de manifestação de poder e, também, de expressão de um desejo mais agudo, não necessariamente apenas carnal. Ainda que a frivolidade da arte, e a facilidade com que se pula de galho em galho é um sintoma desse comentário, seja externada com rigidez demolidora por Ward e Moyninhan, o filme cunha que o mundo da arte tem signos bem distintos do eixo social em que a grande maioria dos mortais se ajusta.
Um exemplo nítido ocorre em um diálogo entre o riquíssimo colecionador vivido com gosto por Stellan Skarsgard e seu advogado por força do divórcio do primeiro. Confrontado com o fato de ter que dividir sua comentada coleção de arte com a futura ex-esposa, ele diz ao advogado para vender tudo. O advogado lhe adverte que a medida não surtirá efeito, pois o dinheiro decorrente das vendas precisará ser dividido, no que o colecionador devolve: “é apenas dinheiro, não vale nada”.
O diálogo revela essa desequilibrada noção de status que impera no mundo da arte e o quanto ela pode ser ferina.
O filme poderia ser mais ácido. Contudo, já vale como um entretenimento acima da média. Ainda que não seja arte.

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