Tensões urbanas
Juliana Reis, diretora de Disparos (Brasil 2012), disse em
uma entrevista recente que ajoelha e reza para David Mamet, dramaturgo e
cineasta americano, de quem admite influência no ofício de roteirista. Essa
influência pode ser sutilmente observada no alinhamento dos conflitos de seu
longa de estreia.
Interessa mais uma análise mais aprofundada do tema que
enseja, do que a desconstrução de personagens que nunca avançam à superfície. É
uma proposta corajosa, se observada junto a outras opções da diretora que tem
na elaborada edição o oxigênio de um filme que pulsa um debate complexo sobre
violência e tensões urbanas.
Disparos é fruto de um caso verídico que aconteceu com um
conhecido da diretora e poderia ganhar ares de ensaio social na mão de um
cineasta mais metido a sociólogo (e são muitos no Brasil), mas Juliana Reis
percebe o potencial cinematográfico da trama e investe em um suspense com
grande vigor estético. Talvez seja essa a grande sensação de seu filme. Ensejar
um debate social, mas não se prender a ele. Ofertando a sua audiência um
thriller policial inusitado e com ritmo crescente de tensão, embora muito pouco
de fato aconteça após a apresentação do conflito central. Mas também não
precisaria. O conflito central abastece todo um questionamento paradoxal que
parece alimentar as grandes cidades do mundo moderno. O fotógrafo Henrique
(Gustavo Machado) é vítima de um assalto e, em um piscar de olhos, se configura
no sujeito que negou socorro a uma vítima de atropelamento. Isso porque o
motorista de uma caminhonete branca jogou o carro contra os assaltantes (o
segundo fugiu machucado) pelo que Henrique classificou de “solidariedade
humana”. Juliana Reis quer mais do que relativizar o papel de vítima e, para
isso, investe em uma tensa dinâmica entre o cínico inspetor Freire (bela
composição de Caco Ciocler) e Henrique. Ela intenciona discutir o alcance e
impacto das tensões urbanas e, nesse contexto, a montagem afere ainda mais
relevo ao desenho proposto pelo texto de Reis.
Sem heróis e sem vilões: debate ensejado por Disparos, e cristalizado na dinâmica entre o policial vivido por Ciocler e o fotógrafo interpretado por Machado, vai além dos rótulos
Assim como a atuação de Ciocler. Ele encorpa muitíssimo bem
alguns dos clichês que rondam a força policial, especialmente no Brasil. No
entanto, o ator humaniza seu policial demonstrando que a “falta de seriedade”
dele nada mais é do que um artifício desestabilizador para fazer (bem) seu
trabalho. Reis tão pouco se interessa em vitimizar Henrique ,
sujeito pouco simpático e que se sente confortável no papel de vítima (se
anuncia como tal inúmeras vezes no decorrer do filme). São construções que
acrescem à complexidade que Disparos dispara com seu argumento, mas que não se
incumbe de contemporizar. As duas últimas cenas, uma já no decorrer dos
créditos, emergem não como falso moralismo, mas como alerta de que nossa
sociedade não comporta mais tão facilmente o esquadrinhamento convencional de
vítimas e algozes.
Que trama interessante! Parece que faz uma boa discussão moral sobre uma situação que poderia acontecer com qualquer um de nós. Fiquei muito curiosa em relação ao filme. Espero que estreie por aqui! Beijos!
ResponderExcluirO Caco Ciocler estava d+ mesmo.
ResponderExcluirQuente esse filme...
Bjs.
Kamila: O filme é bom sim Ka. Uma grata surpresa nacional!
ResponderExcluirBjs
Pat: Ciocler vestiu muito bem o personagem!
bjs
Uma grata surpresa, mesmo. Gosto da forma como ela lida com o tema e como a gente vai se envolvendo com as histórias.
ResponderExcluirbjs
Amanda: Assinando embaixo do seu comentário!
ResponderExcluirbjs