É até certo ponto imprudente buscar o significado de um ano, em um contexto sócio-cultural, ao fechar das cortinas do próprio. Contudo, o desafio é certamente prazeroso. Ao apagar das luzes, 2011 deixa uma indústria cinematográfica mais consolidada no Brasil – ainda que distante do ideal – e muitos números e tendências que ainda precisam ser abalizados.
Hollywood fecha o ano com recordes de faturamento, mas com os preços dos ingressos inflacionados e com uma porção de plataformas alternativas de distribuição em análise. 2011, no futuro, será visto possivelmente como o marco zero de vias alternativas para distribuição de filmes. Foi nesse ano que as locadoras virtuais experimentaram um crescimento maiúsculo, na casa dos 200% em uma média internacional em relação a 2009. Foi o ano em que importantes estúdios firmaram acordos de distribuição de seus filmes por redes sociais como o Facebook. Ainda que o sistema seja experimental, e disponível apenas nos EUA, permite elucubrações a respeito. A Warner, por exemplo, já disponibiliza filmes relativamente recentes de seu catálogo por U$ 1,99 para usuários do Facebook nos EUA.
Outros estúdios, como Sony, Universal e a própria Warner discutem um modelo de distribuição um tanto mais controverso. Disponibilizar lançamentos de cinema no sistema de Vídeo on Demand (VOD, na sigla em inglês) apenas sessenta dias após a estréia nos cinemas. Filmes como Passe livre e Esposa de mentirinha foram lançados nesse formato. Reféns, no entanto, teve um intervalo de apenas 15 dias. A justificativa foi tentar aumentar a arrecadação do filme que fracassara vigorosamente em levar público aos cinemas.
Os estúdios entraram em uma dispendiosa queda de braço com o mercado exibidor que, com essa nova estratégia de distribuição, vê encolher a sua fatia do bolo.
O alto preço do VOD (em média U $ 35) também é um empecilho.
A Net e outras operadoras de tv por assinatura estão começando a afirmar o serviço no Brasil valendo-se dos lançamentos em dvds.
Jennifer Aniston e Adam Sandler em cena de Esposa de mentira, filme disponibilizado para assinantes da Directv 60 dias após o lançamento nos cinemas
Mas o que isso tudo permite intuir? Que a indústria do cinema está se debatendo na busca por soluções para demandas contemporâneas. O conceito de entretenimento está mudando, mas as mudanças não serão radicais e Hollywood precisa descobrir como oxigenar e não asfixiar seu nicho de negócios.
O que nos leva ao circuito de festivais. Nunca foram tantos. Só no Brasil, há congestionamento de festivais no segundo semestre. Em 2011, por exemplo, o festival de Brasília teve de ser antecipado para não coincidir com quatro outros eventos realizados simultaneamente no nordeste. Acabou por dividir parcialmente as atenções com o Festival do Rio.
A importância dos festivais cresce em virtude da facilidade com que se fazem filmes hoje em dia. O que não implica em qualidade narrativa ou estética, mas o digital favorece a produção e os festivais são valiosas plataformas para vender um filme. A fita nacional brasileira Desaparecidos é um caso célebre. Inspirado pelos sucessos de A bruxa de Blair e Atividade paranormal, David Schurmann rodou a versão nacional híbrida desses dois sucessos independentes americanos valendo-se de câmeras digitais, redes sociais e campanhas virais. A fita, atualmente em cartaz em três salas paulistanas, não conseguiu um distribuidor comercial. Schurman então lançou o filme na marra. É um sonho realizado, mas não atesta qualidade. Como foi o caso do uruguaio A casa, longa metragem inteiramente gravado com um Iphone.
Essas invencionices valem algum momento midiático, mas são pouco produtivas em termos mais amplos e culturais. Outra produção nacional lançada em 2011, Os 3 é fruto dessa estranha osmose entre tecnologia e cinema. A fita de Nando Olival tenta confluir questões clássicas do cinema com modernidades da era dos reality shows. O filme não consegue atingir seus objetivos, mas alinha uma lógica de produção que tem tudo para atingir seu pico nos próximos dez anos. Haverá, mais do que nunca, diretores estreantes pensando pouco o cinema - e a tendência é verificar um número ainda maior em países como o Brasil.
O cineasta alemão Wim Wenders deve ganhar uma indicação ao Oscar por seu documentário rodado em 3D
A linguagem cinematográfica, por sua vez, pode se ver em face de mudanças. James Cameron defende essa ideia há alguns anos. Em 2011 ganhou simpatizantes de peso na figura de cineastas como Wim Wenders, que rodou seu documentário Pina em 3D, Werner Herzog, outro a conceber um doc (The cave of forgotten dreams) no formato, Steven Spielberg (As aventuras de Tintim) e Martin Scorsese (A invenção de Hugo Cabret).
Este último, uma verdadeira enciclopédia cinematográfica ambulante, ecoou Cameron e disse entender que o 3D está para o cinema atual como os adventos do som e da cor estiveram em outra época. Os novos entusiastas do 3D vem socorrer a menina dos olhos de Cameron em um momento que o formato se vê vítima da cobiça desenfreada dos mesmos estúdios que discutem uma agenda alternativa de distribuição de filmes. Não é possível apontar se Scorsese e companhia estão certos, mas certamente o sucesso do 3D em sua proposta de tornar-se uma ferramenta narrativa cinematográfica passa pelo entusiasmo desses profissionais. Nesse sentido, enquanto o 3D encolhe nas bilheterias, o debate acerca de sua legitimidade como ferramenta narrativa se sofistica.
Esses foram os temas que subliminarmente pautaram o cinema enquanto arte e negócio, refletidos um no outro, em 2011. 2012 talvez encaminhe algumas respostas, mas a probabilidade é que viabilize mais algumas perguntas.
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