Golpe à americana
David O. Russell reúne um punhado de seus atores favoritos para uma história divertida, ligeiramente real e que apresenta personagens fascinantes
“David justifica suas personagens femininas. Sabe? Elas não
estão lá apenas por estar. Elas tem uma razão dramática para pertencerem àquele
universo”, relata Amy Adams que em sua segunda colaboração com o diretor David
O. Russell conquistou sua segunda indicação ao Oscar. Ao todo Amy detém cinco
indicações ao prêmio da Acadêmia.
Essa preocupação com os personagens é reiterada por Russell
na mesma entrevista de divulgação. “Gosto de pensar que meus personagens
conduzem a trama. Eu sou todo a favor dos personagens”, explica o diretor que
com Trapaça finaliza sua informal trilogia da reinvenção. O primeiro O vencedor,
indicado a sete Oscars, incluindo melhor filme, mostrava como o boxeador Mick
Ward precisava se afastar da família para vencer na carreira. Em O lado bom da
vida, indicado a oito Oscars, também incluindo melhor filme, uma moça bipolar e
um rapaz com transtorno obsessivo compulsivo representam a tábua de salvação um
do outro. Em Trapaça, que concorre a dez Oscars, assim como os outros, também a
melhor filme, dois vigaristas, vividos por Christian Bale e Amy Adams, são
forçados a colaborar com o agente do FBI vivido por Bradley Cooper para
desbaratar um esquema que envolve máfia, políticos e toda sorte de tipos
corruptos.
Trapaça é o filme mais ambicioso de Russell desde Três reis
(1999), uma sátira venenosa à guerra do golfo. Trapaça se passa nos anos 70 e
perpassa gêneros tão diferentes como a comédia de erros e o suspense, abarcando
o drama, o thriller policial e a farsa.
Há quem chame Trapaça, lhe aferindo aspecto pejorativo, de
um “Scorsese light” ou “sub-Scorsese”. Para o jornalista e crítico de cinema
Roberto Sadovski essa é uma tremenda bobagem. “Apesar de Trapaça habitar
um universo familiar ao diretor de Os Bons Companheiros, a pegada é
diferente, menos nervosa, mais cômica. Para Sadovski, “o tom leve é uma opção
narrativa inteligente” até mesmo para adensar melhor as mudanças de gênero
impetradas por Russell.
Trapaça apresenta uma reconstituição de época acachapante.
Tanto pela direção de arte como pelos figurinos e penteados. Esse esmero ajuda
a entender a ambição de Russell. “Eu posso explicar a minha relação com os anos
70 através de cada um desses personagens. Das músicas que gostam, de seus
sonhos...”, diz Russell à reportagem do jornal O Globo.
Esse carinho pelos personagens é mais perceptível em Trapaça
do que em qualquer outro trabalho do cineasta, talvez por essa nostalgia
incontida, talvez porque a proposta de voltar aos anos 70 pedisse esse carinho,
talvez porque o tributo a Scorsese seja apenas uma das muitas nuanças desse
filme que consegue ser drama, comédia, suspense, policial e, antes de tudo
isso, um filme de David O. Russell, uma das grifes mais reconhecíveis da nova
Hollywood.
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