Itália efervescente
A Itália atravessa crise política ímpar em sua história. A
esquizofrenia do país que parece incapaz de assumir uma proposta de futuro e se
encontra às voltas com o retorno do contestado Silvio Berlusconi ao poder, no
entanto, fomenta um reencontro do cinema italiano com seu vigor. Em 2013, por
exemplo, alguns dos melhores lançamentos nos cinemas brasileiros são produções
italianas. Em fevereiro foi lançado o vencedor do Urso de ouro César deve
morrer, de Paolo Taviani e Vittorio Taviani, uma poderosa crônica
shakespeariana sobre poder e corrupção que estreita os limites da representação
ao acompanhar a montagem da peça Júlio César por um grupo de presidiários. O
filme aposta em uma linguagem nova, arejada e nebula os limites entre ficção,
documentário e arte – em um recorte mais profundo.
Neste fim de semana, estreou nas salas de cinema do país
Reality- a grande ilusão, mais recente filme de Matteo Garrone, que já havia
impressionado com o tenso Gomorra de 2008. Reality, que debutou e foi
premado no festival de Cannes 2012, mostra um homem que se transforma
completamente a partir do momento em que se candidata a participar de um
reality show. Como nota curiosa, vale constatar que o protagonista desse misto
de comédia e drama assinado por Garrone também é um assassino condenado (o
agora ator Aniello Arena), o que estabelece uma nova dinâmica para a
apropriação da arte.
Mais do que qualquer outra coisa, Reality mostra que
diretores dessa nova geração italiana não estão presos a um gênero ou a uma
mesma proposta estética. Mas ainda são os cineastas de maior rodagem que
representam o pico do cinema italiano no momento. Nanni Moretti, ainda é a
maior expressão de um cineasta de primeira grandeza do país desde Federico
Fellini. Há dois anos, lançou Habemus papam, filme sob muitos aspectos
insidioso de uma crise no seio da igreja católica que muitos, mesmo depois da
renúncia de Bento XVI, ainda ignoram. Antes disso, em 2006, havia brindado o
público com uma sátira política à figura de Berlusconi com O crocodilo, filme
que a atual conjuntura política italiana traz à atualidade.
Outro cineasta que dispensa apresentações é Marco
Bellocchio. O cineasta de 74 anos, terá os seus dois últimos filmes em exibição
em São Paulo
neste próximo mês de maio. O principal deles, A bela que dorme, é também um
olhar sobre essa Itália em crise de identidade ao acompanhar múltiplos
personagens e suas posições a respeito da eutanásia. Irmãs jamais (2010), já em
cartaz, é outra bifurcação entre documentário e ficção, dessa vez com o doce
tempero do recorte biográfico, já que além do elenco conta com membros da
família do cineasta e o filme é resultado de workshops que Bellocchio conduziu
por anos em sua cidade natal. A família (italiana?) é o foco da narrativa
fragmentada.
O cineasta Marco Bellocchio no set de A bela que dorme: vitalidade e inquietação artística que iluminam o cinema italiano contemporâneo
Outro cineasta com lançamento programado para as telas
brasileiras ainda no primeiro semestre é Gabriele Muccino, diretor que fez boa
transição para o cinema americano com fitas como À procura da felicidade
estrelado por Will Smith. Beije-me outra vez é mais existencial e menos
político, marca de seu cinema. Mas é também demonstração dessa efervescência do
cinema italiano que não está tão adormecido como se pensava.
O cinema italiano é muito efervescente, além de ser uma referência para outras cinematografias, incluindo a norte-americana. Incrível como eles sempre se renovam, sempre revelam bons diretores e atores. Sempre fico de olho nas obras italianas que estão sendo lançadas. Parabéns pelo texto.
ResponderExcluirObrigado pelo elogio Ka. O cinema italiano, que constantemente é apontado com um dos mais frágeis da Europa, mostra nesses últimos dois anos que está bem forte...
ResponderExcluirbjs