Caos e ordem
Joaquin Phoenix é um dos alicerces do novo filme de Paul Thomas Anderson, que lança um olhar sobre as entranhas do pensamento religioso na medida que ilumina os conflitos que aproximam dois homens de diferentes vivências
“Tom Cruise viu e ainda somos amigos”. Essa foi a frase mais repetida pelo cineasta americano Paul Thomas Anderson, no festival de Veneza do ano
passado, onde O mestre teve sua première internacional e de lá saiu com os
prêmios de ator (dividido entre Joaquin Phoenix e Philip Seymour Hoffman) e
direção.
A razão do comentário é porque o mais novo filme do diretor
de Magnólia (1999) e Sangue negro (2007) é inspirado na cientologia, religião
da qual Cruise é espécie de relações públicas.
Se admite similaridades com o movimento que originou a
Cientologia, Anderson não vai além. “Não conheço muito da Cientologia hoje. Não
posso ser mais específico do que isso”. Mas basta o que conhece para erigir um
drama profundo sobre as ramificações e influências da religião e discutir, com
esse escopo, de política a sexo. O mestre é, ainda, uma análise pormenorizada
do homem e seu meio. Nas palavras da jornalista e crítica de cinema Ana Maria
Bahiana, que considera este o melhor filme de 2012, é uma “dança delicada e
imprevisível entre o forte e o fraco, o mestre e o discípulo, o senhor e o
escravo. O caos e a ordem, a verdade e a mentira, a lucidez e a inconsciência”.
A história acompanha a trajetória de Freddie Quell (Joaquin
Phoenix), veterano da segunda guerra que muitos diriam estar enlouquecendo.
Acolhido por Lancaster Dodd (Philip Seymour Hoffman), um intelectual que
organiza teorias com a mesma sagacidade que as experimenta, Freddie passa a ser
peça central no pensamento que Dodd deseja constituir.
“Mas O mestre não é a história de Lancaster”, adverte
Bahiana. “Mas de Freddie, torto, ferido, quase mudo como o Plainview
(personagem de Daniel Day Lewis) de Sangue negro. Ele é o id para o superego
delirante de Lancaster; a massa bruta, o impulso primal, que ao mesmo tempo
anseia e rejeita a ordem, o carinho, o conforto”. Peter Travers, da Rolling
Stone americana, diz que Anderson ao negar-se “pensar pelo público”, enfurece
parte dele. Travers, em sua crítica, classificou o filme como “nirvana para amantes
do cinema”. Para ele, O mestre também é um filme sobre “pertencimento e o preço
que você paga por esse privilégio”.
Intelecto e força bruta: os dois personagens principais de O mestre apresentam múltiplas camadas
Seguramente um dos filmes mais elogiados dos últimos tempos,
o presidente do júri de 2012 em Veneza, o cineasta americano Michael Mann,
defendeu diversos prêmios para o filme, mais foi impedido de levar sua ideia
adiante porque o estatuto do festival proíbe que o vencedor do leão de ouro
receba outros prêmios, mas não é exatamente uma unanimidade. Um dos críticos de
cinema mais prestigiados do mundo, o americano Roger Ebert, não vê essa força
toda no filme de Anderson. “O mestre é fabulosamente interpretado, mas quando
eu tento alcança-lo de fato, minhas mãos ficam no ar”, ponderou. Para o
crítico, faltou transpiração ao filme. “Tem um material rico, mas não fica
claro o que pensa a respeito dele”. O que é defeito para Ebert, é mérito para
outros. “Não é um filme fácil”, finaliza Bahiana.
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