Thriller inteligente e sofisticado
Não é de hoje que os thrillers financeiros rendem bons
filmes. Nos últimos anos tivemos a sequência de Wall Street, Poder e cobiça
(2010) e Margin Call – o dia antes do fim (2011) abrilhantando esse subgênero
cada vez mais reluzente. 2012 parece ser o ano de A negociação (Arbitrage, EUA
2012). Surgido no festival de Sundance deste ano, o filme tem a felicidade de
ostentar a melhor atuação da carreira de Richard Gere, que aos 63 anos já tem
uma carreia com pelo menos 40 anos. Não é pouca coisa. Mas o filme de estreia
na direção de Nicholas Jarecki não merece ser lembrado pelo rótulo (já
lisonjeiro) de melhor trabalho da carreira de Richard Gere. O filme tem muito
mais a apresentar. Filho de corretores de Wall Street, Jarecki escreveu o
roteiro de A negociação e foi buscar financiamento para o filme. A proposta é
mais ousada do que a trama que move Margin call, por exemplo, a qual seu
diretor e roteirista J.C Chandor detém referencial semelhante ao de
Jarecki.
A negociação acompanha de muito perto uma semana decisiva na
vida de Robert Miller (Gere). Um magnata do mundo financeiro que, como muita
gente em Wall Street ,
perde dinheiro com investimentos megalomaníacos. Para reaver as perdas de uma
aposta errada, Miller tenta vender sua empresa enquanto disfarça o rombo
financeiro com dinheiro emprestado e movendo fortunas de um fundo para outro de
maneira a ludibriar auditorias independentes indispensáveis para aquisições
desse porte. A pressão estoura de vez quando ele se envolve em um acidente
automobilístico, fatal para sua amante, e escapa da cena que passa a ser
automaticamente de um crime. Em seu encalço, um detetive com bom faro para
tipos escorregadios vivido por Tim Roth. Ao relacionar a tensão oriunda da
negociação envolvendo o império financeiro de Miller à investigação da qual ele
é alvo, Jarecki poderia facilmente se perder. Não é o que ocorre. A negociação
ganha estofo dramático e se costura em um thriller francamente claustrofóbico.
Gere brilha como Robert Miller, um leão de Wall Street que não se enxerga como tal
A visão de mundo de Miller, em suas distorções inebriadas
pelo poder, é outro ponto forte do filme. O confronto entre a moral usual e
aquela esfumaçada pela condição de Miller é um dos desagravos de A negociação
enquanto obra cinematográfica. Não que o filme seja moralista ou moralizante.
Longe disso! A negociação é um thriller inteligente e sofisticado que torna a
iluminar um mundo que sempre nos provoca um misto de fascinação e asco, mas que
a cada incursão nos surge mais humano. Nesse sentido, Richard Gere é um
providencial ás. Carismático e charmoso, ele alcança aqui efeitos similares ao
obtido por Michael Douglas no primeiro Wall Street. Mas com um diferencial. Ele
compõe seu Robert Miller como um homem que se vê como um homem bom, levado
pelas circunstâncias; diferentemente do Gordon Gekko de Douglas.
Gere dá relevo à consternação emocional de seu personagem e
permite que o público se identifique com um homem bastante peculiar em suas
particularidades. Um tour de force que congrega sutileza e expressividade.
Enfim, a negociação entre Gere e A negociação, o filme,
rende frutos a ambos. Mas, no limiar, é mesmo Gere quem se sai melhor desse
sedutor negócio.
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