O Oscar 2010 foi marcado pela polarização entre o cinema comercial (representado no gigantismo de Avatar) e o cinema independente (na figura do pouco visto Guerra ao terror). Havia, ainda, uma outra polarização em torno da disputa pelo Oscar de melhor filme: a reverberação da crítica ou do público/indústria nos escolhidos da academia. Não se enganem; o que quer que aconteça no Oscar 2011 será efeito direto do que aconteceu no Oscar 2010. Como bem sabemos, Guerra ao terror prevaleceu de forma maiúscula no Oscar. A academia seguiu o alvoroço da crítica e preferiu laurear o filme independente que evita politizar (o que já é um posicionamento político) a guerra do Iraque a consagrar a evolução tecnológica proposta por Avatar. Mas o que Guerra ao terror propõe em termos cinematográficos?
O filme de Kathryn Bigelow se diferencia da produção americana sobre a ocupação militar no Iraque por focar no cotidiano dos homens em conflito. O filme, apesar de tenso e ruidoso, caracteriza-se pela não ação. Não se filma um conflito armado ou o ensejo da invasão americana. Filma-se uma história de homens encarregados pelo desarme de bombas em um território hostil em que bombas, como sabemos pelo noticiário internacional, explodem a todo o momento. Guerra ao terror tem uma lógica muito particular: acompanhar esses homens sem esmiúçá-los psicologicamente. O desejo é esmiuçar os efeitos psicológicos do conflito de forma análoga, quase que intuitiva. Por isso, o final da fita é tão eloquente no comentário que emerge sobre o sargento William James (Jeremy Renner).
Embora imbuído desse ideal, o filme de Bigelow não é manipulador. O grande diferencial da fita, na comparação com outros filmes sobre o Iraque ou de guerra em geral, é a renúncia ao tom politizado. Guerra ao terror não se interessa pelos ideias neoliberais ou conservadores afugentados nas defesas que o cinema prestara em filmes como Nascido em quatro de julho ou No vale das sombras.
Não obstante, os melhores filmes de guerra, de acordo com levantamentos de conjuntos de críticos, são aqueles em que a orientação política da realização coadjuva – quando não é limada. Apocalipse Now e Nascido para matar dos gênios Francis Ford Coppola e Stanley Kubrick são lembranças inerentes. Não a toa a misê en scène dos filmes citados em muito se assemelha a Guerra ao terror. Embora o exemplar mais recente, justamente o único a ter ganhado o Oscar de melhor filme, seja mais simplório no desenvolvimento das ideias.
Quem está na mira? Guerra ao terror evita a exploração de ideias liberais ou conservadoras
O roteiro de Mark Boal, que é jornalista de formação e que escreveu artigos para a Playboy e a New Yorker enquanto correspondente de guerra, foi alvo de críticas (e processos judiciais) de um ex-combatente no Iraque que clamava ser aquela a sua história. Boal, de fato, inspirou-se em fatos reais. Mas poderia não ter se inspirado. A originalidade de Guerra ao terror está mais na forma como aborda uma guerra e suas reminiscências em termos de discurso, do que pela história contada propriamente dita.
Mas e o Oscar com isso? Ao premiar Guerra ao terror, a academia reafirmava a necessidade de se olhar para a produção independente. Reafirmava o valor de um cinema calcado primordialmente em ideias e que não se ressente da boa técnica vir como apêndice. Por fim, reafirmava sua condição de vanguarda. Guerra ao terror tornou-se grande pelo Oscar. Não o era antes. Essa é a maior repercussão que se poderia ter. Um filme escolhido pela crítica e abraçado pela academia. Poucos resultam essa convergência. Esse fato pouco teve a ver com o filme ser sobre o conflito no Iraque. E o grande mérito, nesse aspecto, é de Bigelow. Ela realizou um filme de forte impacto social, alguma tensão emocional e ambivalência narrativa. Agradou tanto liberais quanto conservadores. Uma equação muito bem elaborada que foi evidenciada por uma polarização da crítica em torno do arrojo técnico e temático do filme de Bigelow. Ainda que não fosse o melhor do ano, Guerra ao terror apontava para alternativas no cinema americano. Originalidade no registro, mulheres no comando e criatividade fora do circuito de estúdios. Não é pouca coisa.
Acho que os méritos desse filme estão na direção da Kathryn, ela foi muito feliz em usar a câmera como forma documental. Mas, só isso mesmo. Não era meu favorito, prefiro "Bastardos Inglórios".
ResponderExcluirBeijos! ;)
Mayara: Há muitos méritos em Guerra ao terror, mas não era nem de longe o melhor do ano. Bastardos inglórios, Amor sem escalas, Distrito 9, Direito de amar e O mensageiro são alguns superiores a ele...
ResponderExcluirbjs