Páginas de Claquete

domingo, 30 de maio de 2010

Um ensaio sobre Lost: ponto final?

No final da quinta temporada da série foi publicado aqui no blog, um ensaio que alinhava as teorias, as bifurcações, os pontos fortes e os pontos fracos da série. As expectativas para a sexta temporada também foram abordadas naquele ensaio. Hoje, uma semana depois do final da série, o saudosismo já se impõe. Mesmo com reações divididas dos fãs e muitos mistérios não resolvidos, Lost acabou com saldo positivo. Um acontecimento mundial que há muito não se via na TV americana. Apesar de a audiência ter ficado bem abaixo das expectativas ( só para comparar: o final da sexta temporada de Grey´s anatomy atraiu 15 milhões de espectadores enquanto que 13, 7 milhões viram o desfecho de Lost), a comoção mundial, o interesse midiático e a mobilização na internet denotam a importância do seriado. Lost, como já foi dito antes, redimensionou a teledramaturgia americana. Desenvolveu uma nova estrutura narrativa, multifacetada e esmerando-se numa pluralidade de personagens. Essa bem sucedida fórmula já tentou ser copiada, mas ainda não deu certo. Dará, mas por enquanto as más sucedidas tentativas só ratificam a grandeza do seriado. Lost, é bem verdade, perdeu relevância nas duas últimas temporadas – como foi dito no ensaio do ano passado – mas
seu status quo é dos mais polivalentes e a série ganhou mais uma chance com a proximidade de seu desfecho.


Jacob e seu irmão, o homem de preto: a alegoria sobre o bem e o mal tomou conta da sexta temporada, conforme o desfecho da quinta sugeria


Os personagens; foram sempre eles!
O calcanhar de Aquiles da série foram os personagens. Não. Você não leu errado. É lógico que os personagens eram o que de mais reluzia em Lost. Mas eles cresceram tanto. Foram tão proeminentes e apaixonantes que sublimaram o mistério principal: a ilha e os fenômenos que lá ocorriam. Não a toa, quando os personagens foram postos de lado pelos produtores para que acelerassem a elaboração das respostas, Lost perdeu interesse. Na sexta temporada, os personagens voltaram a ser o foco, em uma convergência da narrativa desenvolvida até aquele momento que, supunham os produtores e criadores da série, teria a conivência dos espectadores ansiosos, mais do que qualquer outra coisa, para saber o destino de seus personagens favoritos. E o foco de The end (título do derradeiro episódio da série) foi justamente o destino de seus personagens. Nada mais. A ilha e todos os mistérios foram subjacentes. Foram tratados como questões pontuais, mesmo que de principio não as fossem.
Ou seja, a julgar pelo que se viu nesta última temporada, em especial no último episódio, Lost foi uma série sobre pessoas. Sobre esse punhado de personagens que aprendeu a viver junto para não morrer sozinho. Tudo muito bonito é verdade. O final da série foi tão apoteótico quanto emocionante. Mas tudo foi fruto de uma combinação de insuficiência narrativa e senso de oportunidade.

Os produtores Damon Lindelof e Carlton Cuse criaram inegavelmente um grande show, mas é igualmente inegável que esse show diminuiu e que a culpa, por assim dizer, é deles



É fácil visualizar que a história de Lost não estava fechada como afirmam os produtores. Há vários indícios disso. Várias pontas soltas que qualquer aficionado pela série é capaz de recitar de cor e salteado foram deixadas soltas. Era extremamente difícil que essas pontas fossem todas amarradas, mais difícil ainda que fossem amarradas satisfatoriamente e ainda mais difícil que fossem amarradas depois das opções narrativas das duas últimas temporadas. Essa dificuldade poderia ser ofuscada por duas opções. A primeira, o foco nos personagens que fora desviado nas quarta e quinta temporadas. Afinal, o público respondia de forma condescendente a essas tramas. A segunda opção era o arco religioso que sempre teve fluxo na trama. Era preciso ampliá-lo e tal qual o homem fizera durante toda a história da humanidade, apelar para o sobrenatural. Não está se criticando a opção narrativa dos produtores e roteiristas da série, está apenas elucidando-a e justificando-a.
Há, também, de se ressaltar que eles sempre garantiram respostas. Todas, a principio, e as mais importantes, ultimamente. De fato, eles forneceram muitas. Se eram as mais importantes não dá para dizer. Como não foram absolutas ( mais uma opção narrativa que se deve mais as circunstâncias do que a qualquer outra coisa) a mitologia da série vive. Vive por que seria um pecado encerrá-la, mas vive, primordialmente, porque seus autores não souberam por um ponto final na história. O tempo se incumbirá de fazê-lo.

5 comentários:

  1. Eu desisti de "Lost" há muito tempo. Acho que a série se perdeu demais, os roteiristas ficaram perdidos no meio de tantas questões que eles mesmos levantaram. Pela quantidade de críticas excelentes que o episódio final levantou, imagino que eles meio que se redimiram. Eu só sei que eu fiquei feliz de ver que minhas teorias sobre a presença deles na ilha estavam corretas.

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  2. Excelente análise Reinaldo. Lost acabou por se tratar de uma série sobre pessoas e como elas nos cativaram... talvez mais preocupados com os mistérios da Ilha, nós fãs de Lost queríamos mesmo é saber como ia acabar nossos "heróis", assim diria Pedro Bial, hehehe... mas sim, fará muita saudade. Eu ainda lamento o fim da série.

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  3. É, Reinaldo, quando você comentou que sua visão do final diferia um pouco da minha lá no CinePipocaCult, perguntei qual era a sua então. Agora lendo seu texto, imagino que esteja falando de quanto falei que não tinha gostado de reduzir a ilha à proteção de uma luz. Seria isso? No que se refere aos personagens, concordo. Eles eram a força da série, era sobre pessoas, seus passados, seus futuros e a forma como aprenderam a se relacionar. Tanto que sempre me incomodou vê-los na sexta temporada da forma como eles começaram, já que acompanhamos sua evolução. Foi emocionante ver o despertar de cada um. Agora, não se pode negar que um personagem também se destacou, a ilha. Ela era um personagem importante até a quinta temporada, Ben vivia falando: a ilha não vai lhe deixar voltar, a ilha te escolheu, a ilha ainda não acabou com você. Na primeira temporada Hugo já perguntou: Cara, onde estamos? E de repente, isso sumiu. Virou uma luz poderosa, protegida por um homem, que ele sim, escolheu aqueles personagens para que um ficasse em seu lugar no final. Essa explicação me incomodou um pouco, mas não fez a série perder sua importância. Com certeza ainda vai viver muito.
    abraços

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  4. Lost é "boa, mas longe de merecer esse hype todo"... Abraço!

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  5. Kamila: Pois é Ka, uma das primeiras teorias a surgir era a correta. Mais um ponto negativo para os criadores do show que diziam que nada do que foi aventado correspondia a realidade. É o tal do conceito de Frankstein né? O final não chegou a ser excelente, mas foi digno e melhor do que se podia imaginar, considerando o rumo do bonde.

    Fernando: Boa analogia com o Bial Fer. É isso mesmo. A questão é que o início dessa história era sobre a ilha. Essa mudança de foco veio depois. Mezzo por causa da força dos personagens, mezzo pq eles não tinham outra alternativa para se esquivar do rolo que se enfiaram. Vai deixar saudade, mas perto de Friends, é uma saudade diferente...

    Amanda: Concordo plenamente com vc Amanda. É como eu disse no texto aí em cima.Os produtores se esmeraram no sobrenatural. Não tinha, nessa altura do campeonato, como prover uma resposta minimamente satisfatória para a celeuma criada em torno da ilha, seus poderes e significado. Apelar a condescêndencia do espectador ao utilizar-se do divino ( e maquiar uma das primeiras teorias sobre a série), eles foram bem sucedidos nesse intento. Desviaram o foco e, em termos gerais, colheram elogios com o final da série. Por um olhar estritamente pragmático, deu tudo certo. Mas é inegável que essa história terminou bem diferente do que eles nos fizeram crer que terminaria. E essa constatação não é elogiosa. bjs

    Augusto: Vc não poderia estar mais certo. abs

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